Folha de S. Paulo
Para reverter revés, base terá de se empenhar mais e texto pode ser diluído; projeto mantém aliados poderosos, como STF e grande mídia
O adiamento
da votação do PL 2630 foi uma vitória da extrema direita,
dos parlamentares
evangélicos e das plataformas de internet. Até alguns dias
atrás, o governo e muitos defensores do projeto de regulação da internet
estavam otimistas e calculavam que havia boas chances de a lei ser aprovada.
Mas, após a campanha pesada das plataformas
contra o PL —como revelou
a Folha, com direito a links contrários na homepage do
buscador do Google, e-mails a usuários e youtubers, alertas e publicidade
contrária—, aliada à forte mobilização da oposição ao governo, o cenário mudou.
A campanha teve ainda fake news espalhada
pela Câmara Brasileira da Economia Digital (camara-e.net), que representa o
Google, Meta, Twitter, TikTok e outros.
Como revelou o portal Metrópoles, a
entidade distribuiu para parlamentares evangélicos um documento que levantava a
possibilidade de o PL das Fake News censurar postagens de cunho religioso e até
versículos da Bíblia. O deputado federal Deltan
Dallagnol (Podemos-PR) disseminou a campanha de desinformação
em suas redes sociais.
Parlamentares de extrema direita ocuparam as redes sociais afirmando que o projeto era o PL da Censura, e que iria acabar com a liberdade de expressão no país. Parlamentares da oposição foram muito mais estridentes nos ataques ao projeto de lei do que políticos da base governista, muito menos enfáticos na defesa do PL.
Com a debandada do Republicanos, que
deixou de apoiar o texto, ficou claro que a maré tinha virado. Mesmo com as
mudanças pedidas pelos evangélicos –e aceitas pelo relator Orlando Silva (PC do
B-SP)— eles não arredaram pé.
Sem conseguir apoio suficiente, Orlando
Silva pediu a Arthur Lira (PP-AL)
a retirada do PL da pauta.
Para ressuscitar a regulação —voltar à mesa
de negociações para tentar reunir um número suficiente de votos— será
necessário o governo se empenhar muito mais pela aprovação do projeto, com
distribuição de cargos e verbas. A percepção é que o projeto tem sido defendido
com unhas e dentes pelo Ministério da
Justiça, mas não teve articulação adequada da Secretaria de
Relações Institucionais nem da Casa Civil.
Parte dos defensores do texto acredita que
será necessário enfraquecer ainda mais os artigos que preveem a
responsabilização das plataformas por conteúdo ilegal de terceiros. O tema foi
diluído no relatório de Orlando, com a introdução de um protocolo de segurança.
Mas alguns defensores acham que será necessário ter uma versão ainda mais light
do texto, mais parecida com o PL apresentado pelo deputado Mendonça Filho
(União Brasil-PE). Isso, mais verbas e cargos, poderia convencer o Republicanos
e outros legisladores recalcitrantes a apoiar o texto, calculam.
Setores do governo, no entanto, rejeitam
essa ideia de atenuar o regime de responsabilidade das plataformas para
conseguir aprovar alguma versão do texto.
O próprio relator indicou que será
necessário chegar a um consenso sobre a entidade reguladora. Após críticas de
parlamentares da oposição, Orlando retirou do texto a previsão de um órgão
regulatório. A oposição afirmavam que o órgão se tornaria um Ministério da
Verdade. Mas o deputado sabe que, sem esse órgão não há como aplicar as novas
regras. Agora, vai se dedicar a debater e reunir apoio para um órgão que
desempenhe essa função - a Anatel, a Agência Nacional de Proteção de Dados, ou
o Comitê Gestor da Internet junto com uma nova entidade.
Apesar de toda a mobilização da oposição e plataformas contra o projeto, que levou ao revés da noite de terça-feira (2), a lei ainda tem aliados poderosos. O Supremo Tribunal Federal, principalmente nas figuras dos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, não vai desistir facilmente de aumentar a responsabilidade das plataformas de internet. E os veículos da grande mídia, em especial a Globo, não querem deixar escapar a perspectiva de remuneração de conteúdo jornalístico e de mudanças na publicidade digital que constam no projeto.
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