domingo, 29 de junho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais /Opiniões

Bomba fiscal exige ajuste de 3% do PIB

O Globo

Cálculo do Banco Mundial deve orientar Executivo e Legislativo em programa para conter dívida pública

Um novo relatório do Banco Mundial descreve como o Brasil criou uma bomba fiscal que, para ser desarmada, exige um ajuste nas contas públicas da ordem de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). A constatação não é nova nem surpreendente. Mas é importante ter a dimensão do desafio. Em vez de travar batalhas políticas estéreis, Executivo e Legislativo deveriam se debruçar sobre o estudo. Não porque seja à prova de crítica, mas porque expõe um problema que a classe política brasileira finge não existir ou não reconhece em sua plena extensão. “É fundamental interromper a trajetória de crescimento da dívida pública”, afirma o relatório. Do contrário, estarão em risco a estabilidade econômica e, com ela, qualquer ambição de desenvolvimento social.

O documento reforça a necessidade de controlar os gastos e sugere uma lista de medidas: reduzir privilégios no setor público, desvincular o salário mínimo dos benefícios previdenciários, rever programas ineficazes como abono salarial ou seguro-desemprego, reformar aposentadorias e pensões dos militares, além de promover ampla reforma administrativa. Outras sugestões se voltam para incrementar as receitas: ampliação da base do Imposto de Renda, aumento da alíquota em impostos rurais e fim de isenções e benefícios tributários, sobretudo sobre combustíveis e atividades com impacto negativo sobre o clima. É possível divergir sobre um ou outro item da lista, mas não sobre o diagnóstico.

O quadro é grave. A dívida brasileira é alta para os parâmetros internacionais. Medida como proporção do PIB, cresceu mais de 20 pontos percentuais desde 2013 e se aproxima de 80% — 22 pontos acima da média dos países no mesmo estágio de desenvolvimento e 18 acima da latino-americana. O resultado é uma espiral negativa. “Quando os níveis da dívida sobem, o aumento resultante nos pagamentos de juros gera um ônus adicional”, afirma o relatório. Sem ajuste fiscal, o Brasil se descolará totalmente de seus pares, ultrapassando em breve a marca dos 100%.

Passou da hora de dar um basta no descontrole. A bomba fiscal brasileira é resultado da irresponsabilidade crônica de quem ocupa o poder. Entre 2006 e 2024, as despesas públicas deram um salto. Até 2013, correspondiam a 40,2% do PIB — patamar já alto. Entre 2014 e 2024, alcançaram 44,2%. Vale lembrar: o Estado não gera riqueza, apenas redistribui o que coleta da sociedade na forma de impostos. E aumentá-los sem limite, como quer o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, equivale a asfixiar o setor produtivo.

A carga tributária brasileira, mesmo excluindo contribuições sociais, é uma aberração. Estimada pelo Banco Mundial em 23,7% do PIB, é 8,2 pontos maior que a latino-americana e 8,8 pontos superior à de países em mesmo estágio de desenvolvimento. Com um peso desses, fica difícil a economia girar.

Como destacou ao GLOBO o economista Cornelius Fleischhaker, do Banco Mundial, o salário mínimo deve proteger o trabalhador de condições abusivas. Pensões e aposentadorias nada têm a ver com isso. Devem ser calculadas para preservar idosos da pobreza. O mesmo vale para ajudas assistenciais. Não faz sentido atrelá-las ao mínimo. Esse é um dos nós que governo e Congresso devem desfazer. É o mais urgente, mas há muitos outros. Não adianta fingir que está tudo sob controle e nada de ruim acontecerá. A hora é de ação. A meta é um ajuste de 3% do PIB.

Compartilhamento de dados médicos melhorará atendimento aos pacientes

O Globo

Tomados os devidos cuidados, projeto que integra informações de saúde trará agilidade e evitará desperdício

É positivo o projeto que prevê compartilhamento de informações sobre a saúde de pacientes atendidos por hospitais e laboratórios, inclusive o SUS. A ideia se inspira no conceito, já em operação, de finanças abertas, ou open finance, a troca de cadastros entre diversas instituições financeiras, facilitando autorização e prestação de serviços. Quando o projeto estiver implementado na saúde, a primeira consulta jamais começará da estaca zero, mesmo que o paciente esteja noutro estado. Num pronto-socorro, não será mais preciso avisar se alguém tem alergia, descrever remédios de uso contínuo, dizer se segue tratamento ou passou por cirurgia. Também haverá menos exames redundantes, uma das causas do alto custo da saúde.

O acesso rápido às informações de saúde reduzirá o tempo dos atendimentos, em benefício dos próprios pacientes e do sistema como um todo. Conduzido pelo Inova HC, núcleo tecnológico do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), o projeto já inclui diversos hospitais privados da capital paulista, como Sírio-Libanês, Beneficência Portuguesa, Oswaldo Cruz, e as redes de laboratórios e hospitais Dasa, Fleury e Sabin. A previsão é que o sistema comece a funcionar em seis meses.

A rede de farmácias RD (Raia e Drogasil) e o Bradesco Saúde estão em fase final de acerto para participar do projeto. Drogarias compartilhariam dados como testes rápidos e vacinas aplicadas. Integrado ao SUS, o sistema ajudaria Ministério da Saúde e secretarias estaduais a atuar de forma preventiva contra epidemias. A central de prontuários agilizaria autorizações de procedimentos pelos planos de saúde e facilitaria pagamentos aos hospitais.

“Todo o setor ganhará muito, mas principalmente o paciente, com prontuário e histórico à disposição para acompanhar a própria saúde e tomar decisões”, afirma Ana Estela Haddad, secretária de Informação e Saúde Digital do Ministério da Saúde. De acordo com ela, o SUS já conta com uma plataforma de operação integrada. Informações de municípios, estados e instituições federais estão disponíveis na Rede Nacional de Dados em Saúde e seguem um padrão recomendado pela Organização Mundial da Saúde. Deveria haver integração das duas plataformas.

Evidentemente, como no caso do open finance, é preciso tomar cuidados para impedir violações à privacidade ou uso indevido das informações. “Ninguém pode ser impedido de contratar um plano de saúde ou obter acesso a atendimento por causa de seu histórico de saúde”, diz Ana Maria Malik, professora do FGVsaúde. “Os propósitos no uso das informações são o cuidado e a qualidade do atendimento.” Ela também defende o veto do acesso ao banco de dados por empregadores, que podem usar o histórico de saúde para negar contratações. Não pode haver “seleção de risco”, diz Marina Paullelli, coordenadora do programa de saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor. Mas não há motivo para, tomados os devidos cuidados, deixar de levar o projeto adiante.

STF incentiva tumulto e censura ao legislar sobre a internet

Folha de S. Paulo

Ao substituir dispositivo aprovado em 2014 pelo Congresso por regramento vago, corte fragiliza a liberdade de expressão

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal já havia decidido, há duas semanas, cometer o erro de derrubar um dispositivo legal sobre conteúdos na internet aprovado pelo Congresso há mais de dez anos, cujo texto explicita o "intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura".

Faltava avançar com um segundo erro: arbitrar de modo casuístico um novo regramento sobre o tema, atropelando a competência dos legisladores eleitos. Isso foi feito na quinta-feira (26).

Por 8 votos a 3, o STF declarou parcialmente inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, de 2014, segundo o qual as redes sociais só poderiam ser responsabilizadas por postagens de usuários se descumprissem ordem judicial de remoção.

Depois de confabulações durante um almoço prolongado antes da sessão, os magistrados resolveram impor, entre outras normas laterais, uma lista de conteúdos a serem removidos de imediato, antes de determinação da Justiça, pelas plataformas.

Nesse rol estão publicações que configurem, por exemplo, terrorismo, pornografia infantil, discriminação racial, tráfico de pessoas, indução ao suicídio, violência contra mulheres e condutas que atentem contra a democracia e o Estado de Direito.

Não é segredo para ninguém que foi este último item da lista que de fato moveu a decisão da corte —com as exceções dos ministros André Mendonça, Edson Fachin e Kassio Nunes Marques. E é aí que residem os maiores riscos da corrente cruzada pela regulação das redes sociais.

Se a pornografia infantil pode ser facilmente identificada, para ficar num único caso, o mesmo não se dá com o que pode ou não caracterizar um ataque à democracia. Interpretações elásticas de magistrados nessa seara terão o potencial de incentivar censura a meras críticas, contestações e embates políticos.

Ainda que não tenham prevalecido entendimentos mais radicais sobre a responsabilização das plataformas, tampouco resta claro como serão aplicados os ditames do Supremo.

A tese de repercussão geral aprovada estabelece que não haverá punição para episódios isolados, mas sim quando se detectar "falha sistêmica" —definida como "deixar de adotar adequadas medidas de prevenção ou remoção dos conteúdos ilícitos".

Não é difícil imaginar que uma norma tão vaga vá provocar questionamentos judiciais de todo tipo, fomentando insegurança.

Não parece por acaso que o texto do STF faça o que soa como reconhecimento de sua intervenção canhestra: "Apela-se ao Congresso Nacional para que seja elaborada legislação capaz de sanar as deficiências do atual regime quanto à proteção de direitos fundamentais".

Ocorre que a lei já existe, e eventuais aperfeiçoamentos dependem de entendimentos políticos. Quem fragilizou um direito fundamental, o da livre expressão, foi a corte mais alta do país.

Em vez de ajuste, gambiarra

Folha de S. Paulo

Governo faz economia enganosa ao permitir aumento da fila por benefícios do INSS, o que só adia pagamentos inevitáveis

O aumento da fila de espera do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) expõe a preocupante combinação de incapacidade administrativa na gestão de benefícios, prioridades equivocadas e gambiarras para adiar despesas inevitáveis por parte do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Os pedidos de benefícios previdenciários em análise atingiram 2,7 milhões em abril, num salto ante o 1,4 milhão de junho do ano passado. Segundo o INSS, o estoque teria caído para 2,4 milhões em junho deste ano.

Como revelou a Folha, o acúmulo de demandas reflete decisões do governo, sob orientação da Casa Civil e do Ministério da Fazenda, no sentido de priorizar revisões de benefícios e apurações de irregularidades em detrimento da análise de pedidos.

O represamento gera economia imediata, reduzindo o impacto do descontrole fiscal, mas cria uma conta futura com correção monetária e juros, que a União inevitavelmente terá de pagar.

Simulações feitas por este jornal apontam para gasto extra de ao menos R$ 13,7 bilhões neste ano, na hipótese de que a regularização ocorra em três meses, sem pagamentos retroativos.

Já se vive um contexto de esgotamento orçamentário. Os ministérios econômicos determinaram congelamento de R$ 31 bilhões de gastos programados para este ano —dos quais R$ 10,6 bilhões bloqueados para compensar a alta de despesas obrigatórias, que dispararam a partir das más escolhas da administração petista.

Combater fraudes e irregularidades deveria ser prática cotidiana, mas não à custa da tempestividade da concessão de benefícios para quem tem direito.

Além da irresponsabilidade de postergar pagamentos para o futuro, fica evidente a deficiência de gestão e competência tecnológica. As fraudes em programas de transferência de renda, por exemplo, são visíveis em inúmeros casos no noticiário.

Esforços pontuais não resolverão o problema, que decorre da falta de uma base de dados robusta e de ferramentas adequada para o uso dessa informação. A modernização do INSS, com sistemas digitais integrados e inteligência artificial para agilizar análises, é imprescindível.

Um cadastro unificado e atualizado poderia reduzir erros, acelerar processos e identificar irregularidades sem comprometer a análise de novos pedidos.

Contudo o governo Lula, além de ter promovido aumento contínuo e insustentável de gastos que não se dispõe a rever, tampouco parece capaz de ir além do improviso costumeiro na gestão.

Supremo bagunça as redes sociais

O Estado de S. Paulo

Ao desfigurar o Marco Civil e fazer das redes sociais um campo minado de regulações confusas, STF criou um sistema autoritário e nebuloso, alimentando a insegurança jurídica

Com o julgamento encerrado, já se pode dizer sem exagero: o Supremo Tribunal Federal (STF) instaurou o regime mais confuso de responsabilização de plataformas digitais entre todas as democracias liberais. A decisão marca o fim de um modelo internacionalmente reputado – o do Marco Civil da Internet, aprovado após amplo debate democrático – e, em nome de uma cruzada moral contra as big techs, inaugura uma era de opacidade normativa, censura preventiva e centralização sem precedentes.

Até agora, vigorava um critério simples, claro e garantista: plataformas só poderiam ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros se descumprissem ordem judicial de remoção. Com isso, evitavam-se tanto o arbítrio estatal quanto o pânico corporativo, incentivando a mediação judicial e desestimulando abusos. Em lugar de um modelo previsível, foram criados quatro regimes aplicáveis conforme o tipo de conteúdo, o contexto, a percepção da plataforma ou, como sugeriu o especialista Ronaldo Lemos em postagem no X, a “sabedoria” do céu. No Brasil, a segurança jurídica virou um pedido de oração.

A tese do STF prevê obrigação de remoção sem ordem judicial para uma lista ampla e vaga de ilicitudes, como “conteúdos que propagam ódio”, “condutas e atos antidemocráticos” ou “discriminação”. A responsabilidade subjetiva, pilar do sistema, foi substituída por uma “presunção de responsabilidade”, sem definição clara. Nem os ministros parecem concordar sobre o que isso significa – e a tese foi fixada a portas fechadas, num almoço casual, como se a Corte constitucional fosse uma corte absolutista.

O contraste com o Direito europeu, tantas vezes invocado, não poderia ser mais flagrante. Na União Europeia, as obrigações mais rigorosas do Digital Services Act aplicam-se só a plataformas com mais de 45 milhões de usuários. Aqui, aplicam-se a tudo: do Google a fóruns de nicho, do Instagram ao Reclame Aqui. Lá, as regras foram deliberadas democraticamente. Aqui, foram improvisadas pelo Judiciário.

O cenário é sombrio: sob risco de punição, as plataformas removerão conteúdos preventivamente. Como distinguir, sem ordem judicial, o que é “manifestamente ilícito”? Críticas à presença de mulheres trans em esportes femininos serão “conteúdos que propagam ódio”? Um empresário virou réu por sugerir a revisão de benefícios fiscais a pessoas com deficiência. O presidente da República, que se recusa a classificar o Hamas como grupo terrorista, já chamou articulações de adversários de “terrorismo”. Mesmo o que pareceria óbvio é subjetivo e dependente de contexto. Mas a nova regra presume que empresas privadas saibam mais que juízes.

E elas não têm escolha: submetidas a regras vagas, custos elevados de conformidade e riscos jurídicos imprevisíveis, as pequenas e médias plataformas enfrentarão um fardo que poucas suportarão. Diferentemente das grandes corporações, que contam com departamentos jurídicos robustos e recursos para automatizar a moderação de conteúdo, os menores serão forçados a remover conteúdos em massa por precaução – ou abandonar o mercado. O novo regime, ao invés de disciplinar os gigantes, os blinda da concorrência, inibe a inovação e empobrece o ecossistema digital, onde a pluralidade de plataformas é tão essencial quanto a pluralidade de opiniões.

Tão preocupante quanto o conteúdo da decisão é sua forma. A Corte fabricou exceções onde a Constituição exige lei, e o fez com o entusiasmo de quem se vê investido de uma missão redentora: salvar a democracia, reeducar a sociedade, recivilizar o País. Para os togados, parece pouco guardar a Constituição – é preciso moldar a cultura.

Mas toda cultura moldada sob coerção tem algo de totalitário. E toda democracia que entrega o debate público ao arbítrio de magistrados ou empresas privadas coagidas a censurar perde algo de sua alma.

A decisão do STF cria um precedente perigoso, desfigura uma lei mundialmente respeitada e inscreve o Brasil no mapa das democracias formais com práticas crescentemente autoritárias. O decano Gilmar Mendes, em tom espirituoso, disse que todos na Corte são “admiradores do regime chinês”. A frase, lida à luz do julgamento, tem menos de graça do que de profecia.

Exemplo de como enfrentar uma crise

O Estado de S. Paulo

Com a adoção de protocolos rígidos e a união de esforços entre autoridades do governo, Congresso e produtores rurais, Brasil consegue debelar gripe aviária e retomar exportações de frango

Um mês após a confirmação de um foco de gripe aviária em uma granja comercial no município de Montenegro, na região metropolitana de Porto Alegre, o País retomou as exportações de frango para 16 países. Trata-se de um feito digno de comemoração e que evidencia o profissionalismo do governo e do agronegócio na gestão dessa crise.

O registro do caso, em 15 de maio, mobilizou as autoridades e a cadeia produtiva. Na granja em que a gripe aviária foi detectada, o Ministério da Agricultura e Pecuária determinou o abate das aves que não haviam morrido da doença, a destruição de todos os ovos e a instalação de sete barreiras sanitárias para evitar que o vírus se espalhasse para unidades vizinhas em um raio de dez quilômetros.

A rigidez do protocolo era justificada. O Brasil é um dos maiores produtores mundiais e líder global na exportação de frango. Mais de 30 países impuseram algum tipo de restrição às importações, e embargos internacionais que durassem além do estritamente necessário imporiam perdas relevantes ao setor e à balança comercial.

As vendas externas recuaram 12,9% em maio na comparação com o mesmo mês de 2024, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). De acordo com cálculos do Estadão/Broadcast, feitos com base em dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), cerca de 123 mil toneladas deixaram de ser embarcadas entre a confirmação do caso e os 14 primeiros dias de junho na comparação com igual período do ano anterior.

Novas suspeitas surgiram em todo o País, mas, enquanto as investigações ocorriam, a diplomacia negociava a redução do alcance dos embargos mundo afora. No México, por exemplo, o governo conseguiu que as restrições ao frango brasileiro se limitassem à produção oriunda do Rio Grande do Sul. Protocolos acordados previamente com o Japão permitiram que a suspensão das compras fosse imposta apenas aos municípios atingidos.

Felizmente, os poucos registros confirmados nas últimas semanas – nove, ao todo – se limitaram a aves silvestres e domésticas. Assim, o País pôde declarar-se livre de gripe aviária em 18 de junho em plantéis comerciais, status sanitário que foi oficialmente reconhecido pela Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) no dia 26.

As exportações foram retomadas para Egito, Iraque e Marrocos, entre outros destinos, mas o embargo continua em vigor em mercados relevantes como União Europeia e China, além de Chile, Filipinas, Peru, Canadá, Malásia, Índia e Paquistão. A retomada dos embarques, a partir de agora, depende das autoridades sanitárias de cada país.

Embora o vírus circule pelo mundo desde 2003, o único caso em granja comercial no País ocorreu no mês passado, o que demonstra a robustez do controle sanitário brasileiro. A título de comparação, nos Estados Unidos, um surto iniciado em 2022, e que é um dos fatores por trás da disparada dos preços dos ovos, já dizimou cerca de 170 milhões de aves em quase 800 plantéis comerciais no país.

Até a disputa política entre o governo Lula da Silva e a bancada do agronegócio no Congresso teve trégua nesse período. Em vez de uma indesejável e inoportuna troca de acusações entre as partes, o que se viu foi a união de esforços para conter os focos, preservar mercados e assegurar a ampla adesão dos produtores às medidas de controle e prevenção.

Como a gripe aviária é altamente contagiosa, não há garantia de risco zero, mas protocolos sempre podem ser aprimorados e as equipes de fiscais devem ser reforçadas. O País deve investir na regionalização dos acordos comerciais para garantir que, em caso de reincidência, os embargos comerciais tenham abrangência reduzida.

No Congresso, propostas para criar um fundo nacional sanitário para indenizar produtores cujos plantéis forem atingidos pela doença estão em discussão e contam com o apoio do ministro Carlos Fávaro. Há boas lições a serem tiradas dessa experiência, que, a despeito dos prejuízos, pode inspirar autoridades públicas e o setor privado a se unirem na busca de soluções conjuntas para outros problemas crônicos que atingem o País.

Populismo com a dor alheia

O Estado de S. Paulo

Ao mudar a lei casuisticamente, Lula da Silva fez de palanque a morte de Juliana Marins

A trágica morte de Juliana Marins, na Indonésia, comoveu o Brasil. Nas redes sociais, entre as incontáveis mensagens de pesar e apoio à família da publicitária fluminense, logo surgiram cobranças para que o governo federal, por meio do Ministério das Relações Exteriores, providenciasse o traslado do corpo da jovem até o Brasil.

Em sôfrega busca por reverter a queda de sua popularidade com vistas à eleição de 2026, o presidente Lula da Silva resolveu explorar a comoção nacional e fazer populismo rasteiro com a dor alheia. A comoção é legítima. O sentimento de luto é mais que compreensível. O que não se justifica é o uso político-eleitoral de uma tragédia pessoal por parte do presidente da República.

Foi exatamente o que Lula da Silva fez ao editar o Decreto 12.535/2025, que alterou o Decreto 9.199/2017 e passou a autorizar, entre outras hipóteses, o custeio com recursos públicos do traslado de corpos de brasileiros mortos no exterior se “o falecimento ocorrer em circunstâncias que causem comoção”. Ora, comoção não é nem nunca foi fator considerável na formulação de uma política pública. Afinal, como se afere seu grau? Quem determinará que casos causaram ou não comoção?

A norma anterior era claríssima: a assistência consular “não inclui o pagamento de despesas com sepultamento e translado de corpos de brasileiros falecidos no exterior, nem despesas com hospitalização, exceto em casos médicos específicos e atendimento emergencial de caráter humanitário”. A razão por trás dessa limitação não é insensibilidade, mas prudência. O Orçamento da União é finito e, portanto, precisa ser previsível e regido por critérios objetivos. Se tragédias podem ser cobertas por seguros de viagem – amplamente disponíveis e de baixo custo para os viajantes –, não há razão em transferir ao contribuinte brasileiro o ônus de arcar com eventos de natureza essencialmente privada.

Do ponto de vista prático, o caso já estava resolvido. A prefeitura de Niterói (RJ), cidade natal de Juliana Marins, e o ex-jogador de futebol Alexandre Pato já tinham se prontificado a custear o traslado do corpo da jovem. A intervenção de Lula da Silva, como fica evidente, foi claramente oportunista.

Ao flexibilizar a regra com base em algo tão imponderável quanto “comoção”, Lula da Silva deixou o terreno da política pública para, bem a seu feitio, praticar populismo sentimental. O presidente da República deveria ter se limitado a prestar condolências à família de Juliana Marins, garantir a prestação de atendimento consular aos brasileiros que estão na Indonésia para reaver o corpo da jovem e transmitir uma mensagem de conforto para todos os brasileiros. A lei teria sido respeitada e o petista teria cumprido à risca seu papel de chefe de Estado e de governo.

A exploração política de uma tragédia íntima para fins eleitorais foi um desrespeito não apenas à jovem que perdeu a vida, aos seus familiares e amigos. Foi uma afronta aos princípios republicanos. Definitivamente, não é assim que se governa um país.

Responsabilidade das redes sociais

Correio Braziliense

Os critérios estabelecidos pelo STF representam um avanço, na medida em que reforçam os princípios constitucionais da dignidade humana

O Supremo Tribunal Federal deu uma importante contribuição para a sociedade brasileira ao definir parâmetros de responsabilização civil para as redes sociais. Em julgamento na semana passada, os ministros listaram um conjunto de medidas a serem seguidas pelas plataformas digitais, todas no sentido de tornar o ambiente digital mais seguro, civilizado e obediente à lei. O ponto mais importante é o entendimento de que as empresas passam a ser responsáveis por conteúdos ilegais ou ofensivos mesmo que não recebam notificação judicial pelo que divulgam.

Merece registro, ainda, a orientação do STF para que as plataformas digitais adotem o "dever de cuidado", ou seja, tenham uma ação preventiva mais eficaz na remoção de conteúdos nocivos, como incitação à violência, terrorismo, pedofilia e conspiração antidemocrática. Devem ainda as empresas manter canais permanentes e específicos de atendimento, preferencialmente eletrônicos, acessíveis e amplamente divulgados.

Ao deliberar sobre o tema, a maioria dos ministros identificou uma inconstitucionalidade parcial do artigo 19 do Marco Civil da Internet, em vigor desde 2014. Entenderam os integrantes da Corte que o dispositivo era insuficiente para garantir os direitos fundamentais dos cidadãos e a democracia, cabendo, portanto, as correções definidas em plenário.

Atento à sensibilidade do tema, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, salientou que a decisão não implica uma interferência no Poder Legislativo, que tem a prerrogativa de estabelecer normas para a vida digital no Brasil. "O tribunal não está legislando", asseverou. Com efeito, o julgamento precisa ser visto como um balizamento necessário ante a lacuna normativa que se perpetua desde o arquivamento, pelo Congresso Nacional, do projeto de lei que regulamentava as redes sociais.

Os critérios estabelecidos pelo STF representam um avanço, na medida em que reforçam os princípios constitucionais da dignidade humana. É preciso assegurar os direitos fundamentais à vida e à segurança dos cidadãos, que diariamente são atingidos no meio virtual. Esse perigo é substancialmente maior em se tratando de crianças e adolescentes, vulneráveis à exposição massiva ao universo digital.

Note-se que o julgamento do STF não se concentrou no uso político das redes sociais, outro debate rumoroso no mundo inteiro. Essa questão, ainda não resolvida, coloca-se de forma relevante na medida em que os donos das big techs, adeptos do ultraliberalismo econômico, demonstram pouco apreço por princípios democráticos e flertam com líderes políticos de tendência autocrática. No caso específico do Brasil, espera-se que o país encontre a medida justa para as redes sociais funcionarem como a ágora do nosso tempo, preservando a democracia de movimentos golpistas.

A força cultural e econômica das festas juninas

O Povo (CE

Consideradas celebrações ricas e diversas, as festas juninas mantêm sua tradição na região Nordeste, estendendo-se a outros estados. Marcados pelo cenário festivo musical do forró, das animadas quadrilhas e das comidas típicas, os festejos encontram um pretexto na comemoração religiosa de Santo Antônio (no dia 13 de junho), de São João (no dia 24 de junho) e de São Pedro (no dia 29 de junho, neste domingo).

E é inegável que a Igreja Católica celebre a memória destes três santos populares, os quais, cada um a seu modo, representam um sinal de bondade, de fé e de vida de oração. Santo Antônio, frei franciscano do período medieval, cultivou fortemente a virtude do bem, ajudando principalmente a alimentar as pessoas pobres.

Pela fé católica, São João Batista foi o responsável por anunciar a chegada de Jesus e por batizá-lo nas águas do rio Jordão. Era conhecido por praticar a penitência e pregar chamando todos à conversão. É tido como um grande testemunho do Evangelho. Também lembra-se, em junho, o dia de São Pedro, o primeiro papa da Igreja, que completa a tríade dos santos populares do mês. Teve o papado mais longo da história, durante 37 anos, e foi chamado por Jesus como "o pescador de homens". Não à toa, ocorre em Fortaleza, a cada 29 de junho, a tradicional Festa de São Pedro dos Pescadores, considerada patrimônio imaterial da cidade, que inclui procissão marítima na Praia do Mucuripe.

Além dos festejos religiosos, a celebração cultural é caracterizada pela maciça participação popular, representando um evento de significado também econômico para os locais em que é realizado. Basta lembrar os grandes eventos que reúnem, neste período, milhares de pessoas no Ceará e em outros estados do Nordeste. Congregam muitos que vão aproveitar a festa, prestigiando a animação e fazendo movimentar a economia local.

Os turistas que chegam ao Nordeste reforçam a força da festa que precisa se especializar para receber o público de forma organizada e atraente. Assim, a geração de renda a partir daí passa por hotéis, restaurantes e outros serviços locais, promovendo inclusive empregos temporários.

É certo que, hoje em dia, os arraiais já se disseminam em todas as regiões do País, misturando ritmos, gostos e cores. A tradição se espalha por outros estados fora do Nordeste, popularizando uma cultura ao mesmo tempo em que a diversifica.

Desse modo, além de prestigiar a cultura junina, festejar esse período significa reforçar os valores de uma nordestinidade fundamentada nos ritos populares de cada local e nos hábitos tradicionais, que vão da culinária à dança, dos personagens à vestimenta. Preservar essa expressão fortalece a identidade cultural de um povo ao tempo em que intensifica o turismo e valoriza as tradições. 

 

 

 

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