- Correio Braziliense
A CPI da
Covid quebrou os sigilos telefônico e telemático de autoridades da Saúde e
aprovou as transferências de sigilo bancário e fiscal de empresas de
publicidade
A palavra inglesa merchandise significa
mercadoria (substantivo) ou também pode ser um verbo que indica o ato de fazer
negócio, ou seja, comprar e vender alguma coisa. Como conceito econômico,
merchandising é o conjunto de atividades e técnicas mercadológicas que dizem
respeito à colocação de um produto no mercado em condições competitivas,
adequadas e atraentes para o consumidor. Traduzido para o marketing, é a
citação ou aparição de determinada marca, produto ou serviço, sem as
características explícitas de anúncio publicitário, em programa de televisão ou
de rádio, espetáculo teatral ou cinematográfico etc.
Um “case” de merchandising bem-sucedido é a
cena de Pelé amarrando as chuteiras na Copa de 1970. Em 14 de junho, com a
famosa camisa 10 do Brasil, o craque do futebol agachou-se no círculo central
do gramado do Estádio Jalisco, em Guadalajara, no México, e amarrou
pacientemente sua chuteira. A cena foi registrada pelas câmeras de tevê e
retransmitida mundo afora. A Copa de 1970 foi a primeira a ser transmitida ao
vivo. Em pleno regime militar, no auge do milagre econômico e da repressão à
oposição, o Brasil parou para ver na telinha a nossa Seleção ser tricampeã de
futebol.
Ao amarrar sua chuteira Puma King, Pelé ajudou a colocar a Puma em evidência, abrindo caminho para que a empresa se tornasse ainda mais conhecida e viesse a assinar contratos com jogadores como Johan Cruyff, Diego Maradona, entre outros, uma revolução no futebol profissional. A principal concorrente da Puma era a Adidas, criada pelos irmãos Adolf (Adi) e Rudolf Dassler, em Herzogenaurach, na Alemanha. Entretanto, por causa da guerra, houve um rompimento entre eles, e Adolf criou a Puma.
Na Copa de 1970, Adolf e Rudolf não estavam
mais à frente das empresas, que eram administradas pelos filhos de ambos, Horst
e Armin, respectivamente. Visionário, Horst colocou a Adidas no meio das
federações esportivas, conseguiu fechar um contrato de exclusividade com a
Fifa, com direito a ser parceiro oficial da entidade e ao lançamento da Tango,
bola oficial da Copa. Mas o jornalista espanhol de ascendência alemã Hans Henningsen
contratou Pelé para que ele calçasse as chuteiras Puma no Mundial e pelos
próximos quatro anos, por U$S 125 mil (equivalentes a aproximadamente R$ 4,5
milhões nos dias atuais, corrigidos pela inflação).
As cenas do presidente Jair Bolsonaro
oferecendo hidroxicloroquina para uma ema nos jardins do Palácio da Alvorada,
tomando café da manhã ao lado de uma caixa do mesmo produto ou os vídeos nas
lives nas quais recomendou o tratamento precoce exibindo o produto foram
compartilhadas por centenas de milhares de seguidores nas redes sociais e
exibidas pelos meios de comunicação de massa. Gol de placa do merchandising
para os laboratórios Apsen Farmacêutica e EMS, que fabricam esses produtos.
Quebras de
sigilo
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid aprovou, ontem, uma série de
requerimentos que pediam a transferência do sigilo telefônico e telemático de
autoridades, empresários e outros alvos de suas investigações. Também foram
aprovadas as transferências de sigilo bancário e fiscal de empresas de
publicidade. A transferência do sigilo telefônico inclui o registro e a duração
de todas as ligações feitas e recebidas conforme período delimitado pelos
senadores. Já a transferência do sigilo telemático solicita o envio de uma
série de informações, entre elas, cópias do conteúdo armazenado, lista de
contatos, cópia de e-mails e localizações de acesso à conta.
Estão entre os investigados cujas
atividades serão devassadas o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o
ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo, o empresário bilionário
Carlos Wizard, a coordenadora do Programa Nacional de Imunização (PNI),
Francieli Fontana Fantinato, e o auditor do Tribunal de Contas da União (TCU)
Alexandre Figueiredo Marques, apontado como autor de uma nota técnica falsa
sobre a quantidade de óbitos por covid-19.
A captura de políticas públicas por grandes
interesses privados não é novidade, mas o poderoso lobby organizado a partir do
Palácio do Planalto e do Ministério da Saúde em favor da cesta de medicamentos
do chamado “tratamento precoce” da covid- 19, com a complacência do Conselho
Federal de Medicina (CFM), salta aos olhos. Contraria as recomendações de
epidemiologistas, virologistas, sanitaristas e cientistas, que consideram os
medicamentos ineficazes e respeitáveis instituições de saúde pública. Por isso,
o lobby é alvo das investigações da CPI da Covid no Senado. Todo crime tem uma
motivação e deixa um rastro. No caso da covid-19, o rastro financeiro da
cloroquina tem potencial de virar o maior escândalo de saúde pública da nossa
história, responsável por dezenas de milhares de mortes que poderiam ser
evitadas na pandemia.
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