domingo, 8 de maio de 2016

Os desafios de Temer

Eventual governo do PMDB terá que recuperar economia, fazer cortes, mas preservar programas sociais

Júnia Gama, Martha Beck e Simone Iglesias - O Globo

Contas públicas

Este é visto como o principal desafio de um eventual governo Michel Temer. Técnicos da área econômica e analistas ouvidos pelo GLOBO são unânimes em dizer que um novo governo precisa mostrar que o Brasil voltará a ser capaz de gastar menos do que arrecada e de reduzir a dívida pública. Essa sinalização, que precisa ser rápida, já seria capaz de recuperar um pouco da confiança do mercado financeiro e animar investidores que hoje estão em compasso de espera por causa das turbulências na política. Assim, naturalmente, a taxa de juros cairia e a inflação cederia. Mesmo com um nome bem visto pelo mercado, como Henrique Meirelles, apontado como possível ministro da Fazenda, o ajuste fiscal será difícil. ça na área no Congresso. De um lado, enfrentará o PT, que não deixou nem Dilma mexer nas regras da Previdência. De outro, o vice terá de confrontar parte de sua base de apoio ligada às centrais sindicais.

Impostos

Aumento de impostos e a volta da impopular CPMF podem ser remédios amargos, mas necessários, diante da forte deterioração das contas e da necessidade de preservar programas sociais como o Bolsa Família. Em 2014, o rombo do setor público foi de R$ 32,5 bilhões. Em 2015, ele subiu para R$ 111,2 bilhões por causa do pagamento das pedaladas fiscais. Este ano, o governo já pediu ao Congresso autorização para que o montante possa chegar a quase R$ 100 bilhões. “Não existe corte de despesa que possa ser feito em curto prazo que seja suficiente para reequilibrar as contas sem alguma ação do lado da receita”, afirma um técnico do Ministério da Fazenda.

Desemprego

Para trazer de volta ao mercado o batalhão de 11 milhões de desempregados, Temer e sua equipe terão o desafio de fazer a economia voltar a crescer. Para isso, um dos principais eixos serão as privatizações. A ideia é transferir para o setor privado tudo o que for possível na infraestrutura. “Teremos pouco mais de dois anos. Serão dois dias de trabalho em um”, resume o ex-ministro Moreira Franco. Mas, além de enfrentar resistências ideológicas, a nova gestão terá de reformar marcos regulatórios ultrapassados, aumentar a confiança do investidor, diminuir a burocracia e melhorar o ambiente de negócios.

Previdência

O principal ajuste nas despesas do governo precisa ser feito na Previdência Social que, junto com benefícios assistenciais, consome mais de 50% dos gastos primários da União. É por isso que Henrique Meirelles tem defendido a reforma da Previdência e a fixação de um teto para os gastos públicos. Apesar do consenso no mundo econômico sobre a necessidade de revisão das regras previdenciárias, Temer terá de suar a camisa para aprovar qualquer mudança na área no Congresso. De um lado, enfrentará o PT, que não deixou nem Dilma mexer nas regras da Previdência. Do outro, o vice terá de confrontar parte de sua base de apoio ligada às centrais sindicais.

Medidas sociais

Um dos grandes desafios de Michel Temer, caso assuma a presidência, será equalizar os programas sociais com o corte de despesas que pretende fazer na máquina pública, que seus assessores econômicos consideram fundamental para recuperar o crescimento. Naqueles que podem ser seus últimos dias de governo, a presidente Dilma Rousseff e seus principais auxiliares intensificaram o discurso de que Temer acabaria com as conquistas sociais do PT, especialmente os programas de inclusão como o Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida. No que pareceu um desafio ao seu possível sucessor, Dilma resolveu aumentar o valor do benefício. O vice terá de se equilibrar se quiser levar adiante a operação pente-fino nos programas sem provocar a ira dos beneficiados.

PT nas ruas

Um presidente sem voto e com alto índice de rejeição enfrentará como principal antagonista a esquerda mobilizada nas ruas pelo discurso de que Dilma Rousseff teria sofrido um golpe com o impeachment. Se não conseguir um rápido êxito, mesmo que parcial, na recuperação da economia, Temer poderá ficar fragilizado diante de movimentos sociais, oposicionistas no Congresso e toda a resistência que possivelmente será comandada pelo ex-presidente Lula.

Lava-Jato

Não só o governo do PT foi alvejado frontalmente com os desdobramentos da Operação Lava-Jato, que acertou desde a presidente Dilma Rousseff, alvo de pedido de inquérito, ao ex-presidente Lula, passando por ministros palacianos. O PMDB de Michel Temer é um dos partidos com maior número de envolvidos no esquema e, em seu provável ministério, um dos principais nomes, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) — cotado para o Planejamento —, é um dos investigados. O próprio vice teve o nome citado durante a investigação, embora não haja pedido de abertura de inquérito contra ele. Outros dois nomes do entorno de Temer, Henrique Eduardo Alves (cotado para o Turismo) e Geddel Vieira Lima, provável articulador político, são citados na operação.

Congresso

A convivência entre o presidente do Senado, Renan Calheiros, e Michel Temer é conturbada. Ambos os caciques disputam áreas de influência no PMDB. Em sua eventual gestão, Temer pode esperar instabilidade vinda do Senado enquanto Renan estiver no comando. Além de ter ficado até o último momento ao lado do governo, as divergências entre os dois se tornaram públicas e dificilmente serão esquecidas depois que, apenas poucos meses atrás, trocaram ofensas. Renan disse que medidas de Temer fariam “Ulysses tremer na cova” e acusou o vice de se preocupar exclusivamente com indicações para cargos quando ocupou a articulação política do governo Dilma. Em resposta, Temer disse que o PMDB não tinha dono, “nem coronel”.

Já na Câmara, se por um lado o afastamento de Cunha gerou certo alívio para Temer, que não terá mais a preocupação de deixar na cadeira presidencial um réu na Lava-Jato quando precisar se ausentar do país, por outro, os desdobramentos disto são ainda incertos e prometem causar turbulências. A sucessão de Cunha no comando da Casa deve desencadear uma corrida com potencial para tumultuar a base de apoio que vem sendo construída por Temer a custo de muitas ofertas de cargos, que inclusive o levou a descumprir uma de suas primeiras promessas, de reduzir o número de ministérios. Em segundo lugar, o vice e tantos outros viverão agora sob a sombra de uma possível delação premiada de Cunha.

TSE

Se herdar a cadeira presidencial como despojo da guerra do impeachment, Michel Temer terá ainda sobre sua cabeça a espada do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que julgará nos próximos meses o processo de cassação da chapa presidencial. O vice-presidente já pediu a separação das responsabilidades na análise das contas, para romper o laço que atrela seu destino ao de Dilma. Mas, na semana passada, o Ministério Público Eleitoral recomendou que o TSE rejeite o pedido de separação, argumentando que o suposto abuso de poder econômico cometido pela campanha de Dilma teria beneficiado também seu vice. O PSDB, autor do pedido na Corte, vai apoiar o governo Temer, mas não dá o menor sinal de que irá recuar do processo e pretende continuar apostando na tese de que cabe ao tribunal punir os supostos crimes eleitorais de 2014 e determinar novas eleições.

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