Se
não for enfrentado, um poder enlouquecido será cada vez mais autoritário
“Tirar Donald Trump com um impeachment veloz é
o único meio de talvez evitar o que seria seu maior feito: aproximar ainda mais
os Estados Unidos de uma convulsão. Até a prevista posse de Joe Biden em 20 de
janeiro, serão mais de dois meses concedidos a um presidente ensandecido, que
acusa de roubo e corrupção o sistema eleitoral e avisa o país de que resistirá
‘até o fim’.”
Quatro anos antes, Trump vencera Hillary Clinton no Colégio Eleitoral, mas perdera na preferência (inútil) do eleitorado, iniciando aí as acusações de fraude que prometia provar, e nem estranhezas superficiais apontou. O desespero alucinado da contestação à vitória de Biden, explodindo já na apuração inicial, atualizava e exacerbava quatro anos de mentiras, acusações e ameaças sobre a eleição presidencial. Não precisaria de mais para justificar uma reação altiva das instituições feridas em sua moralidade e do ameaçado teor democrático do regime.
A invasão
do Congresso decorreu de longo processo de incitação generalizada por
Trump contra a democracia de cara americana, até a culminância com o discurso à
turba convocada —uma hora e dez de enfurecimento concluído com a ordem de rumo
ao Congresso. Mas esse processo não avançou por si só. Nem foi o único a
esfolar a democracia à americana e levar à invasão do Congresso.
Trump
chegou à Casa Branca como portador de um currículo de trapaças e relações
violentas, muitas já condensadas em processos, inclusive falência fraudulenta e
volumosa sonegação de impostos —o crime dos crimes, por lá. O programa que
propôs foi um amontoado de monstruosidades, incabíveis na índole apregoada da
democracia americana: expulsão em massa de latino-americanos; um
muro na fronteira sul, com a mesma finalidade do muro de Berlim, que os
mexicanos seriam obrigados a pagar; retirada de várias entidades da cooperação
internacional; acirramento da crise no Oriente Médio, guerra comercial com a
China, e incontáveis outras agressões à incipiente civilização.
O
partido e a mídia (sic) republicanos aceitaram muito bem a presença dessa
figura delinquente, com seu sonho demente, em eventual presidência do país,
dito “a maior democracia do mundo”. E todas as instituições, entidades civis e
oficiais com o dever de defesa da democracia e da moralidade política,
acompanhadas pelo Partido Democrata, fugiram de suas responsabilidades.
Trump
cumpriu grande parte do que programara. O que não fez, substituiu por atitudes
e decisões equivalentes em imoralidade e desumanidade. Como a separação
de milhares de crianças e seus pais, recolhendo-as ao que nos próprios
Estados Unidos foi comparado a campos de concentração. Prática típica do
nazismo. Essa e as demais, no entanto, insuficientes para motivar a Justiça
americana, o Congresso, a mídia, os setores influentes da riqueza, nem alguns
deles, a levantar-se a todo risco para impedir a demência no poder, antes que
se tornasse a demência do poder.
Donald
Trump teve caminho livre para ser Donald Trump, mesmo quando despontou uma
tentativa de reação democrata, sob a forma de impeachment derrotado.
Está
claro: um poder enlouquecido de autoritarismo, ambição e desumanidade, se não
for enfrentado e vencido cedo, será cada vez mais autoritário, ambicioso e
desumano.
Está
claro: por perturbadoras que sejam, medidas como interdição e impeachment serão
sempre menos danosas à população, ao presente e ao futuro do país, do que a
omissão fugitiva dos guardiães das conquistas democráticas, se agredidas ou
postas em perigo —institucional ou social.
ESTÁ
CLARO
Maluco por maluco, o nosso é muito mais.
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