A volta ao passado do congelamento e do tabelamento, no diesel e no frete do transporte, enfrenta percalços que confirmam a ineficácia desses instrumentos
Ao sucumbir à greve indiscutivelmente ilegal de caminhoneiros e empresas transportadoras disfarçadas de motoristas autônomos — por prejudicar atividades essenciais —, o governo prometeu o que não podia garantir. Como o desconto de R$ 0,46 no diesel e a fixação de um preço mínimo no frete.
Interveio em mercados complexos, relativamente desregulados, e foi obrigado a entrar no modo de redução de danos, diante da impossibilidade de administrar a própria intervenção. Faltaram sensatez e humildade para rememorar inúmeros fracassos colhidos por governos passados em situações idênticas, mesmo quando a economia era menor e os mercados, menos conectados ao exterior.
Alguém no Planalto deveria ter lembrado a situação tragicômica do governo Sarney, diante do fracasso do congelamento instituído no Plano Cruzado, ao determinar que a Polícia Federal laçasse boi no pasto. Faltava carne, como de resto vários outros produtos, porque o tabelamento, como sempre, tornara-se irreal.
É parte indissociável de qualquer congelamento surgir um mercado negro. A Venezuela chavista é exemplo dramático, ao vivo e em cores, do desabastecimento causado pelo intervencionismo na economia.
Prova de que o Planalto não visitou a História é que se tenta ressuscitar a também tragicômica figura do “fiscal do Sarney”, travestido de caminhoneiro, agora a serviço de Temer. O próprio general Sérgio Etchegoyen, ministrochefe do Gabinete de Segurança Institucional, evoca a perseguição de bois no mato ao ameaçar com “poder de polícia” quem não cumprir o congelamento do diesel sem os tais R$ 0,46. Não dará certo, como não deu com Sarney.
Era inevitável que a realidade se impusesse. O Planalto se comprometeu com o desconto de R$ 0,46 no litro do diesel, mas esqueceu que, sem os estados abrirem mão de pelo menos parte do ICMS sobre o combustível, o abatimento não passa de R$ 0,41. Também asfixiados em suas finanças, há governadores que sequer concordam em discutir o assunto.
Aceitar a reivindicação do frete mínimo é fácil. O papel aceita tudo, como se dizia. É claro que o Planalto não tinha qualquer ideia das dificuldades da vida prática: por exemplo, a tabela da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) só considerou caminhões de um tipo, com menos eixos. O resultado foi jogar às nuvens o frete. Apenas a Associação Nacional de Exportadores de Cereais (Anec) estima que os produtores de soja, farelo de soja e milho teriam um custo adicional no transporte de US$ 2,8 bilhões este ano. Por essas e outras, a tabela seria refeita, mas não estará imune a novos erros.
A judicialização desta volta ao passado de congelamento e tabelamento era inexorável. Há exportadores com preços já fechados com importadores e que não querem ter prejuízo, é claro, devido à intervenção do governo. No Rio Grande do Norte, na manhã de ontem, a Justiça Federal, por liminar, suspendeu a tabela a pedido de duas empresas.
Este é apenas um caso de desdobramento judicial do imbróglio. Se serve para algo esta operação desastrada, é para prevenir autoridades em geral, atuais e futuras, de que o ambiente da própria economia não comporta ações deste tipo, formalizadas por algumas poucas canetadas.
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