O Globo
Uma quebra institucional terá consequências
econômicas nefastas para o país, algo subestimado por boa parte da elite
A democracia brasileira viverá nos próximos
meses sua maior prova de fogo desde a redemocratização, em 1985. Temos um presidente
da República que desrespeita diariamente as instituições e ameaça as próximas
eleições caso não seja aprovada uma reforma que introduza o voto impresso e
auditável.
Para piorar a situação, ele conta com o
respaldo das Forças Armadas, que ocupam um papel central em seu governo e ecoam
suas ameaças.
A resposta institucional dos outros poderes é tímida e insuficiente. Alguns membros do Congresso, capturados por rios de dinheiro provenientes de emendas obscuras, já embarcaram na coalizão BolsoCentrão faz tempo. Outros buscam reformas políticas bizarras e casuísticas que visam equacionar a preservação do poder político com a continuidade democrática.
Um terceiro grupo faz lives e notas de
repúdio que, na prática, parecem tão inefetivas quanto as notas de membros do
STF que garantem que as eleições acontecerão de qualquer forma.
Apesar da instabilidade política e de
alguns protestos recentes contra Bolsonaro, fora dos jornais e de algumas
bolhas nas mídias sociais parece que nada de grave está acontecendo. O mercado
acionário brasileiro subiu sem parar até junho e, apesar de uma desaquecida
recente, não parece ter tomado nenhum grande susto com as declarações do
ministro da Defesa, Walter Braga Netto.
Também não consegui achar lideranças
empresariais importantes dando declarações sobre a importância das eleições em
2022 e da preservação da democracia. Grande parte do PIB empresarial brasileiro
parece estar mais preocupado com uma possível reforma tributária do que com a
preservação da democracia.
Está na hora de acordar e de tratar a
ameaça democrática de Bolsonaro e seu governo como algo sério. E aqui não penso
somente nos perigos de uma erosão institucional e da violência que virá com
isso, essas já estão inclusive em curso.
Refiro-me às nefastas consequências
econômicas que uma quebra institucional pode trazer para o Brasil, algo que é
ainda pouco compreendido e tremendamente subestimado por boa parte da elite
empresarial e financeira.
Regimes não democráticos reduzem as
possibilidades de crescimento dos países através de alguns canais claros.
Primeiro, qualquer quebra institucional aumenta a instabilidade, e poucas
coisas são tão prejudiciais para um país como a instabilidade de regras e de
contratos.
Agentes econômicos buscam regras claras e
estáveis para seus investimentos, principalmente aqueles que visam retornos de
longo prazo.
Segundo, regimes autoritários geram
barreiras à entrada onde somente quem é “amigo do general” ganha acesso a
contratos do governo, licenças de exploração e outros mimos.
Isso gera concentração de atividade
econômica na mão de firmas e setores politicamente conectados, aumentando a má
alocação de fatores e diminuindo a produtividade da economia.
Terceiro, no mundo de hoje empresas
multinacionais pressionadas por seus consumidores globais estão sendo cada vez
mais responsabilizadas por suas decisões de localização e de cadeias
produtivas. Se já há punição hoje para insumos provenientes da Amazônia em
chamas, imaginem quando protestos e sangue das cidades brasileiras se
espalharem diariamente pelos jornais do mundo.
Qual multinacional vai querer investir em
um Brasil autoritário?
Finalmente, qualquer erosão democrática
será acompanhada pela participação ativa e cada vez maior das Forças Armadas.
Apesar do discurso anticomunista anos 60, o que a elite fardada quer é a
apropriação do Orçamento público via aposentadorias, salários e gastos em
armamentos.
Esses são recursos que poderiam estar indo
para a educação, algo que certamente geraria maior crescimento para o país.
As consequências de uma ruptura democrática em 2022 seriam enormes para o Brasil. E, por isso mesmos a turma das “instituições estão funcionando” não acredita que possa acontecer. Mas lembremos que em 2018 pouca gente acreditava que Bolsonaro, com seu Ustra na cabeceira, pudesse virar presidente. Deu no que deu.
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