sexta-feira, 25 de março de 2022

Claudia Safatle: Casa Civil travou o pacote de crédito

Valor Econômico

Ala de técnicos da área jurídica da Casa Civil enxerga nas medidas a concessão de novos benefícios em ano de eleições gerais, o que seria proibido pela legislação eleitoral

O pacote de crédito para micro, pequenas e médias empresas parou na área jurídica da Casa Civil e não se sabe ao certo se e quando ele sairá de lá com o selo de aprovação. Há uma ala de técnicos da área jurídica da Casa Civil que enxerga nas medidas a concessão de novos benefícios em ano de eleições gerais, o que seria proibido pela legislação eleitoral.

O pacote de crédito foi concebido com base na extensão dos benefícios do Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para até dezembro de 2023. O programa de crédito nasceu no auge da pandemia, em 2020, para socorrer as companhias micro e de pequeno porte. O argumento da área econômica para contestar a posição dos técnicos da Casa Civil é que os efeitos da pandemia ainda persistem e, agora, estão agravados pela guerra entre Rússia e Ucrânia.

“Estamos vivendo em uma situação emergencial. Temos a guerra e os efeitos colaterais da pandemia. É uma situação excepcional”, argumentou um assessor do Ministério da Economia, em defesa das medidas de expansão da oferta de crédito.

Se aprovada pelo Executivo, a medida provisória que está sob exame da Casa Civil prorrogará os financiamentos feitos com base nos fundos FGO (Fundo Garantidor de Operações), do Banco do Brasil, e FGI (Fundo Garantidor de Investimentos), do BNDES.

A rigor, o dinheiro que retornasse dos financiamentos contratados em 2020 e 2021 deveria ir diretamente para o Tesouro Nacional, mas a proposta é que ele retorne para os fundos de garantia de crédito até 31 de dezembro do ano que vem. Esses recursos seriam suficientes para lastrear até R$ 100 bilhões em novas operações de crédito. A alavancagem é de oito vezes o valor da garantia. Só o fundo de aval do Sebrae, com R$ 1,5 bilhão, é suficiente para gerar cerca de R$ 12 bilhões em crédito.

Se, ao longo das discussões, chegou-se a pensar em concentrar a administração dos fundos no BNDES, essa ideia foi afastada. “Cada macaco no seu galho”, disse a fonte para quem o FGO continuará sob o comando do Banco do Brasil e o Fundo de Aval (Fampe) permanecerá com o Sebrae, assim como o FGI está sob a égide do BNDES.

Outra ideia que aparentemente não está madura e pode ser excluída da medida provisória refere-se à criação de um fundo garantidor de habitação popular da Caixa, com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)

Outro aspecto da medida é o seu custo para o tomador final, que ficou bem mais salgado do que se imaginou: Selic mais 6% ao ano. O problema é a taxa Selic, que deve chegar à casa dos 13% anuais neste ano.

Formuladas antes do início da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, as medidas têm sua importância reforçada diante dos impactos do conflito na atividade econômica e na inflação.

Segundo uma fonte, serão duas faces de apoio às micro e pequenas empresas. Além do crédito, será lançado o refinanciamento das dívidas do Simples, decorrente da derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro a essa medida. Veto que foi sugestão dos mesmos técnicos da Casa Civil que agora se opõem ao pacote de crédito. As dívidas estão estimadas em R$ 20 bilhões e por causa delas cerca de 437 mil empresas estariam ameaçadas de expulsão do programa simplificado de pagamento de impostos.

Na parte do crédito, o ponto principal é a retomada do Programa Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Pronampe) e do Programa Emergencial de Acesso ao Crédito (Peac), duas linhas de crédito criadas na pandemia. Para voltar a operar, elas dependem de aportes adicionais no FGO e no FGI.

A ideia, como está dito acima, é editar uma medida provisória colocando nesses dois fundos os recursos que estão retornando dos empréstimos concedidos em 2020 e 2021. É necessário, porém, autorizar que o dinheiro fique no próprio fundo, já que hoje eles têm que ir, obrigatoriamente, para o Tesouro Nacional. Dessa forma, os dois fundos terão recursos suficientes para, em caso de inadimplência, dar suporte aos empréstimos que os bancos farão com recursos próprios.

Quem vai tomar um empréstimo de R$ 5 mil ou R$ 10 mil em geral não tem como dar garantia real. São pessoas que ficam à margem do sistema financeiro por não terem como bancar uma operação de crédito.

Apesar de o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter previsto o anúncio do pacote de crédito para a semana anterior ao Carnaval, dia 1º de março, até agora não se sabe ao certo quando será divulgado.

Há controvérsias a respeito dessa medida que pretende patrocinar uma boa expansão no crédito das micro, pequenas e médias companhias (com faturamento de até R$ 300 milhões por ano). Afinal, o Banco Central está no meio de uma política de aperto monetário, com a subida da taxa básica de juros e, neste momento de alta inflação, a expansão da oferta de crédito é um sinal trocado dado pela área econômica do governo.

Há outras medidas em curso, a exemplo da que isenta do pagamento de Imposto de Renda as aplicações que os investidores estrangeiros fizerem no mercado de capitais, além de redução de impostos como o IPI.

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