Valor Econômico
Petista toma a ofensiva no debate sobre corrupção ao inquirir presidente sobre uso de dinheiro vivo na compra de imóveis
Mais que um ponto de inflexão em sua
estratégia de campanha, o vídeo divulgado no feriado da Independência em que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chama Jair Bolsonaro (PL) a
explicar a compra de 51 imóveis por parte de familiares com dinheiro vivo pode
ser considerado um marco da história do petista com o tema corrupção.
Oito anos depois da deflagração da
Lava-Jato, seis anos após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e
quatro anos depois de sua própria prisão - revogada com as peças de acusação
derrotadas -, Lula retoma a ofensiva no tema que encurralou o PT e quase o
levou a nocaute.
Até então, por razões táticas, petistas em
geral evitavam o tema e nem sequer cogitavam “apontar o dedo” para levantar
suspeitas contra rivais. Desde a noite do 7 de setembro, o comportamento tem
sido radicalmente diferente.
Na manhã seguinte à data do Bicentenário da
Independência, numa demonstração de que o tema havia sido alçado a um novo
status, Lula voltou a citar a questão dos imóveis da família Bolsonaro numa
carta ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
Embora o motivo da missiva fosse outro - justificar sua ausência em solenidade do Congresso sobre a Independência - ele achou relevante deixar registrado que Bolsonaro “poderia ter aproveitado o espaço generosamente cedido pela mídia para explicar como sua família conseguiu comprar 107 imóveis desde que ele entrou na política, sendo que 51 deles foram pagos em dinheiro vivo”.
Ao mesmo tempo, sua assessoria distribuía
release a milhares de pequenos, médios e grandes veículos de mídia com o título
“Lula: Bolsonaro deve explicar como juntou R$ 26 milhões em dinheiro e comprou
51 imóveis”.
E a propaganda do PT no rádio e na TV
adotou a mesma toada: “Mansão de 20 mil metros quadrados no interior de São
Paulo; mansão no Rio de Janeiro; mansão de 6 milhões em Brasília. Esses são
apenas três dos 107 imóveis comprados pela família Bolsonaro desde sua entrada
na política. A investigação da imprensa revelou outro escândalo: 51 desses
imóveis foram pagos em dinheiro vivo, no valor atualizado de 25 milhões. De
onde vem tanto dinheiro vivo da família Bolsonaro? É um escândalo tamanho
família”.
Advogados de Bolsonaro recorreram ao
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para tentar tirar a peça do ar, mas o pedido
foi negado.
A história das compras suspeitas de imóveis
pela família Bolsonaro surgiu uma semana antes do 7 de setembro. Reportagem do
portal UOL mostrou que o presidente, seus irmãos, filhos e ex-esposas
negociaram 107 imóveis desde os anos 1990, 51 deles adquiridos total ou
parcialmente com uso de dinheiro vivo.
A conta foi feita a partir de declaração
dos próprios integrantes do clã em cartórios, de dados em investigações do
Ministério Público e declarações de outras pessoas envolvidas nas transações.
Num primeiro momento, ainda fiel à
orientação de não dar tamanha importância ao tema corrupção, Lula apenas tateou
o assunto ao dizer que parecia haver “algo de podre no ar”. Não demorou para a
campanha petista perceber, porém, que Bolsonaro vinha demonstrando dificuldade
para dar uma resposta politicamente convincente sobre o caso.
Uma fonte da coordenação da campanha de
Lula observou que de todos os escândalos de corrupção já levantados envolvendo
Bolsonaro, sua família ou seu governo, a única coisa que pareceu realmente
incomodá-lo foi o caso envolvendo seu patrimônio.
Para estranhamento da equipe de marketing
do PT, Bolsonaro passou a ampliar ataques contra Lula no tema corrupção no
mesmo instante em que a suspeita sobre os imóveis ganhava corpo.
A propaganda de Bolsonaro veiculou um
comercial que tenta associar Lula à defesa de ladrões, peça vista como jogo
baixo por parte de petistas. Também passou a resgatar acusações da Lava-Jato,
mesmo que derrotadas na Justiça.
Enquanto isso ocorria, pesquisas
qualitativas da campanha de Lula detectavam que, diferentemente do que
costumava ocorrer com outras suspeitas em torno de Bolsonaro, a história dos
imóveis parecia intrigar mais o eleitorado e “pegar” mais no presidente.
Um coordenador da campanha do PT diz que
não se trata de acusação genérica de desvios, mas da suspeita de enriquecimento
pessoal ilícito. “O eleitor se pergunta para que tanto imóvel.”
Outros dois fatores pesaram positivamente
para o PT mudar de orientação e decidir assumir a ofensiva no tema corrupção.
O primeiro foi a avaliação quase unânime de
que Lula havia sido tímido demais no debate da Band, no fim de agosto, quando
Bolsonaro, em tom agressivo, o inquiriu sobre a corrupção na Petrobras nos
governos petistas. O ex-presidente não mencionou suspeitas que recaem contra o
rival. Preferiu dizer que, em seu governo, foram aprimorados mecanismos de
combate a malfeitos.
O segundo foi a decisão da campanha de
“elevar o tom” contra Bolsonaro, conforme expressão usada pelo deputado José
Guimarães (PT-CE), num esforço concentrado para tentar liquidar a disputa no
primeiro turno.
Essa foi, segundo ele, uma das mais
importantes deliberações da reunião de Lula com presidentes de partidos aliados
e auxiliares realizada no dia 6 de agosto, num hotel em São Paulo.
Marca do que poderia ser chamado de
reestreia de Lula no papel de interpelador em matéria de corrupção, o vídeo do
7 de setembro nasceu e foi sendo amadurecido ao longo do próprio feriado.
Uma fala grave de Lula já era esperada
desde a manhã daquele dia em razão do uso eleitoral dos atos feito por
Bolsonaro.
A mensagem curta e direta de Lula chamando
Bolsonaro a explicar a compra dos imóveis foi veiculada quando as multidões em
Brasília, Rio e São Paulo já haviam dispersado e o bolsonarismo já não poderia
mais produzir surpresas. Mas a tempo de ser aproveitada nos telejornais da
noite e no rescaldo da cobertura das paradas militares e eleitorais.
Um representante da campanha petista diz
que a decisão de retomar a ofensiva no tema corrupção não significa sobrepor a
prioridade da questão econômica. Ele garante que Lula não vai desviar o foco da
crise econômica, algo que, segundo sua avaliação, tem muito mais relação com a
realidade da população.
A campanha continuará cobrando de Bolsonaro
respostas para problemas como o aumento da fome, o desemprego estrutural e a
inflação dos alimentos, diz.
Aberta a porteira para falar de corrupção,
Lula, dois dias depois do 7 de setembro, resolveu diversificar o repertório. Em
seus discursos, também passou a cobrar Bolsonaro pelo caso das “rachadinhas” e
pela relação do presidente com seu ex-assessor Fabrício Queiroz, suspeito no
episódio. (Colaborou
Andrea Jubé, de Brasília)
2 comentários:
Como Bolsonaro vai explicar o inexplicável? O genocida não deu qualquer explicação sobre as dezenas de imóveis (algumas mansões, inclusive) compradas com DINHEIRO VIVO! O Queiroz poderia explicar facilmente, se deixassem o operador financeiro falar o que fez e o que sabe...
Rachadinhas e rachadões,rachaduras e rachamoles.
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