Um dos países mais pobres da América Latina acaba de aprovar uma reforma constitucional, na qual o presidente Daniel Ortega (79 anos) , líder da Frente Sandinista de Libertação (FSLN), há mais de 30 anos na chefia do Estado , não apenas passa a ter o controle absoluto sobre os demais poderes , como torna "copresidente" sua mulher, Rosário Murillo, atual vice, e assegura a sucessão para o seu filho, Laureano . Serviço completo .
Seria esse o modelo de democracia que o Foro de São Paulo , criação de Fidel Castro e Lula, em 1990, projetaram para a integração da América Latina?. Esse esforço todo de estabelecer o caos jurídico e político no Brasil , uma guerrilha contra as instituições, estaria voltado para um novo sistema de governança? O Foro de São Paulo , aparentemente na geladeira, é uma organização política que se autodenomina de esquerda , e que reúne uma centena de partidos legais e organizações transgressoras da ordem jurídica. Portanto, se não é de assustar, surpreende, se comparado ao que vem acontecendo por aqui. Parece algo programado e projetado para ser concluído a médio prazo. No início daquelas coisas na Nicarágua, por volta de 1980, eu estava por lá - pela a América Central, Nicarágua inclusive - e acompanhei a violência nas ruas de Manágua, até o assassinato , a queima roupa: um tiro na cabeça, na frente de todo mundo , de um jovem fotógrafo norte-americano.
Os revolucionários não tinham nenhum constrangimento para abordar e agredir aos opositores. Era quase uma "justiça sumária", promovida até pelo "guarda da esquina" , modelo inspirado na revolução cubana . O presidente derrubado Anastácio Somoza, fugido e exilado no Paraguai, foi morto em Assunção, também na rua, a queima roupa por uma bala de morteiro, que fez explodir a ele e o carro que dirigia.
No Brasil, de um momento para o outro, começou a surgir acusações, quase vazias, de conspiração , ameaças de morte, envenenamentos, sabotagens , atentados , uma roupagem diferente com a participação do Judiciário - questão de estilo - com objetivos aparentemente semelhantes. Uma sucessão de eventos pontuais e intimidadores são reproduzidos nas páginas dos jornais e abrigadas nos textos de um punhado de articulistas legitimadores de inconstitucionalidades jurisprudenciais. Decisões monocráticas na Alta Corte passam por cima de atribuições de juízes de primeira instância e das polícias . Os militares ficam á margem até terem eles também terem sua autoridade questionada.
Essa sucessão de eventos odientos, acontecendo em cadeia, torna o cenário macabro e eleva a desconfiança pública nas autoridades e instituições . Tudo parece estar mesmo direcionado para a construção de um novo tipo de democracia, autocrática, relativa, amparada num partido único e protegida por milicianos . Já acompanhei , como jornalista, prisões de políticos, de militantes ideológicos, de líderes estudantis e trabalhadores, mas jamais vi uma conspiração tão forte contra a legitimidade do Estado Constitucional como agora, envolvendo personagens, inclusive estrangeiros sem quaisquer conexão e aderência com história e a vida do brasileiro.
A gestão das políticas públicas dão ideia de abandono. No País, no Congresso, na Justiça as pessoas se ocupam dos supostos atos conspiratórios, até os mais esdrúxulos como "envenenamentos" , prática que antecede a Era Cristã; ou condenações prévias de questões não cabíveis sequer na Código do Processo Penal. Manobras e ordens surgem de um grupo autoproclamado "Cidadãos acima de qualquer suspeita" (Petri, 1970).
Nada por aqui na política é menos atemorizante que na Nicarágua. A autoconfiança é tamanha que se despreza, inclusive, a tal " maioria silenciosa" que guarda para si a indignação com ambiente de intimidação e revanchismo. Parece até tratar-se de vinganças pessoais: a Nação assiste estarrecida a montagem e o desmonte súbitos de narrativas, inclusive oficiais. A imprensa se deixa cooptar pela expectativa da novidade.
O curioso é que essas atividades não parecem seguir exatamente o pensamento de Lênin, Marx, Engels, Mao Tsé Tung, Ho Chi Ming, nem mesmo de Gramsci. Aproximam-se mais de Mussolini, Aghata Cristie, Conan Doyle, J. K. Rowling, Dashiell Hammett, Raymond Chandler, Dan Brown. Transcende fácil de processos judiciais para páginas literárias ou policiais, estendendo-se o intricado jogo de enigmas, crimes e investigações que cativam leitores e eleitores desavisados . Os processos de averiguação são ardilosos, atraindo os leitores para os mistérios.
Nesse cenário, detetives, espiões, denuncistas desempenham o papel central na busca pela verdade, mergulhando nas sombras da imaginação para trazer à luz aquilo que escondem nas entrelinhas, e afloram nas interpretações . Para facilitar a criatividade hermenêutica recomendaria os envolvidos a leitura de escritores policiais, brasileiros mesmos :
Andrea Nunes, "A Corte infiltrada"; Paula Febbe livros sobre perversão e psicose, dilemas humanos; Cláudia Lemes : "Quando os Mortos Falam" ; Thais Messora: "Um Ótimo Dia Para Morrer" ; Patrícia Melo, "O Inferno"; Ilana Casoy , criminóloga e escritora, escreveu livros baseados em pesquisas sobre o perfil psicológico de criminosos; Vivianne Geber, a história o "Espião Rodolfo Rupel" e “O Enterro dos Ossos”. Alguns estão em Ebooks. E, como disse : "Investigação sobre um cidadão acima de qualquer suspeita".
Em que pese o cenário político macabro, desconheçe-se o que lêm - até para se divertir - os presidentes da Nicarágua e do Brasil. O brasileiro disse que nunca leu um livro. Não sabe o que está perdendo. Assusta , porque um ministro aventou a possibilidade de queimar livros, tipo "Fahrenheit 451" (Bradbury, 1956)... Não se entusiasmem, pois . Na Revolução Francesa - modelo arquetípico - guilhotinaram-se tantos opositores que, sem mais cabeça para cortar, começaram a cortar a dos próprios companheiros. E veio o Napoleão...
*Jornalista e professor
Nenhum comentário:
Postar um comentário