CIRO PERDEU OUTRA BOA
CHANCE DE FICAR CALADO
Ciro Gomes tem se mostrado sério e progressista, um parlamentar ativo e dos mais inteligentes, um governante executivo operoso e aparentemente honesto. Mas é daquelas pessoas que merecem ser chamadas de “boca grande”, não por comerem demais ou roubarem demais, mas por falarem bobagem quase compulsivamente.
Em sua coluna de ontem, o jornalista Elio Gaspari – seguramente um dos dois ou três mais competentes e respeitados do país – demoliu a credibilidade de Ciro por conta de uma frase boba mas venenosa em relação a José Serra, em entrevista a outro jornalista de primeiro time, Raymundo Costa, do jornal VALOR:
“”O que o Serra fez quando o câmbio estava apreciado”.
Quem pode acreditar em um candidato a Presidente da República ou Governador de São Paulo, que transforma disputa política em ódio pessoal e cego, a ponto de acusar o adversário por pecados que ele não cometeu mas que o próprio acusador carrega em sua biografia?
Ciro era Ministro da Fazenda e aceitou calado – para preservar o cargo, parece óbvio – que a turma do Plano Real, encastelada no Banco Central, no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, até aplaudisse a apreciação cambial causadora de enormes prejuízos à nossa indústria e ao país. O engraçado é que José Serra, também ministro de FHC, demonstrou publicamente sua desaprovação, como Elio Gáspari implacavelmente recordou em sua coluna de ontem, publicada por vários jornais do país.
O povo brasileiro – eu inclusive –, que ainda considera Ciro um bom sujeito, fica em dúvida sobre as razões de sua candidatura (ninguém ainda sabea quê): Ele é favor do câmbio livre ou do controle cambial? Ele é neoliberal ou desenvolvimentista? Ele é a favor da entrada da Venezuela no Mercosul como Lula ou é contra, como o senador Tasso Jereissati, seu maior aliado político?
Ele quer derrotar ou ajudar Dilma Roussef? Em matéria de meio ambiente, ele está mais para Marina Silva ou Carlos Minc?
Ciro já se estrepou em outra eleição majoritária – para Presidente, em 2002 –
também por dizer bobagem e na hora errada. Eu admito, como ele também achou importante afirmar, que José Serra é feio; Mas não é por beleza que o povo vai decidir em 2010.
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””Muitas pessoas têm a sorte de poder falar sobre coisas sobre as quais tenho de ficar calada.”
Mary II, rainha da Inglaterra (1662-1694), a Sofia de Hanover, após sua coroação.
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DOS 30 QUE MUDAM LEGENDA,
SÓ UNS SEIS SE APROVEITAM
Dos 30 deputados federais que mudaram de legenda para a disputa eleitoral do próximo ano, apenas cinco ou seis parecem ter razões legítimas para isso, o resto todo apenas foi motivado por esperteza eleitoral e demonstrativa de que partido para eles é como qualquer fornecedor de mercadoria.
O fluminense Geraldo Pudim (PMDB para PR) mudou-se por conta de suas relações com o já declarado candidato ao goerno estadual Anthony Garotinho. A capixaba Rita Camata (PMDB para PSDB) foi candidata à vice-presidência com José Serra em 2002. O fluminense Marcelo Itagiba (PMDB para PSDB), por ser até possível candidato ao governo estadual. O acreano Henrique Afonso (PMDB para PV) acompanhando a decisão da senadora Marina Silva.
Com o benefício da dúvida, considero que haja mais um ou dois que tenham sido motivados por razões sérias. Mas, com toda a certeza, a grande maioria, trocou de legenda apenas como um carimbo sem qualquer significado programático ou político com “P” maiúsculo, mas sim “m” minúsculo, de “malandragem” eleitoral.
Como qualquer reforma séria do sistema poderá ser aprovada por esses parlamentares?
“A GENTE GANHA
MUITO, MAS NÃO
É VIDA FÁCIL”
O consórcio Suez venceu a licitação para construção da usina de Jirau oferecendo um preço de venda menor – 72 reais por megawatt/hora –, graças a uma bem bolada mudança no projeto, vantajosa para o governo federal e os futuros usuários.
As concorrentes só pararam de recorrer depois de acordos que até hoje não foram bem explicados. Agora os deputados estaduais de Rondônia também acham que podem conseguir alguma coisa. Estão com nhemnhemnhem ambiental, típico de quem quer apenas conseguir algum tipo de vantagem – política ou de outra natureza.
Concorrência, políticos, burocracia. Certa vez um grande empreiteiro desabafou comigo numa entrevista: “A gente ganha muito com o progresso deste país. Mas não é vida fácil.”
BAIXO CLERO SEMPRE APRECIA
ONDE HÁ INTERESSES ALTOS
Quase sem aparecer nos noticiários da TV, estão correndo importantes batalhas parlamentares, em que o chamado baixo (e esperto) clero ouve conversas muito interessantes dos lobistas mais ativos. Uma é sobre a votação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) , que manteria em seus cargos titulares e funcionários antigos de cartórios (quem assumiu essas funções até 20 de novembro de 1994 e esteja nas funções há pelo menos cinco anos ininterruptos).
A Constituição de 88 acabou com a folia de cartórios serem distribuídos pelo Poder Executivo como brindes de alto luxo para amigos e parentes, instituindo a obrigatoriedade de concursos públicos.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, já disse, com toda a clareza, que está em jogo a forma republicana de ocupar cargos de natureza pública. E recentemente fulminou, com um curioso neologismo, essa PEC esperta que tanto mobiliza lobistas e deputados: “Essa PEC é uma prova da resistência. Se for aprovada, vai ser a terceira vez em 30 anos que o Brasil permite a cartoragem.”
Essa PEC é, realmente, um modelo da resistência do Brasil velho ao Brasil novo que a Constituição de 1988 teve a intenção de começar a construir. Os governos – federal e estaduais – tinham a obrigação de simplesmente cumprir, regulamentar e executar. Mas aí começou o “peraí um pouquinho”, os anos se passando e a resistência se organizando. Aquela conhecida rotina estratégica dos interesses estabelecidos diante da inevitabilidade de mudanças: resistir por todas as formas, usar todas as manobras políticas, acrescentar subterfúgios processuais na Justiça, até que algum dos poderes da República bata o martelo e ordene “cumpra-se”.
Quando o Executivo remancha e o Legislativo idem, só o Judiciário, apesar de sua lenta engrenagem, pode impor o respeito à Lei.
O baixo clero também poderá ser decisivo na batalha sobre o Índice de Produtividade Agrícola, até porque o PT luta, mas sem receber até agora a bênção oficial do Planalto, sempre dividido entre parecer amigão tanto do MST como do agronegócio. Os grandes proprietários rurais, liderados pela senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária, querem tirar do Poder Executivo, através do INCRA, a responsabilidade de estabelecer esses índices de produtividade que orientam as iniciativas de reforma agrária.
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“O interesse do proprietário de terras sempre se opõe aos interesses de todas as outras classes da comunidade.”
David Ricardo (1772-1823), economista britânico, em “Princípios de Economia Política e Tributação”, 1817.
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CHANCE DE FICAR CALADO
Ciro Gomes tem se mostrado sério e progressista, um parlamentar ativo e dos mais inteligentes, um governante executivo operoso e aparentemente honesto. Mas é daquelas pessoas que merecem ser chamadas de “boca grande”, não por comerem demais ou roubarem demais, mas por falarem bobagem quase compulsivamente.
Em sua coluna de ontem, o jornalista Elio Gaspari – seguramente um dos dois ou três mais competentes e respeitados do país – demoliu a credibilidade de Ciro por conta de uma frase boba mas venenosa em relação a José Serra, em entrevista a outro jornalista de primeiro time, Raymundo Costa, do jornal VALOR:
“”O que o Serra fez quando o câmbio estava apreciado”.
Quem pode acreditar em um candidato a Presidente da República ou Governador de São Paulo, que transforma disputa política em ódio pessoal e cego, a ponto de acusar o adversário por pecados que ele não cometeu mas que o próprio acusador carrega em sua biografia?
Ciro era Ministro da Fazenda e aceitou calado – para preservar o cargo, parece óbvio – que a turma do Plano Real, encastelada no Banco Central, no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, até aplaudisse a apreciação cambial causadora de enormes prejuízos à nossa indústria e ao país. O engraçado é que José Serra, também ministro de FHC, demonstrou publicamente sua desaprovação, como Elio Gáspari implacavelmente recordou em sua coluna de ontem, publicada por vários jornais do país.
O povo brasileiro – eu inclusive –, que ainda considera Ciro um bom sujeito, fica em dúvida sobre as razões de sua candidatura (ninguém ainda sabea quê): Ele é favor do câmbio livre ou do controle cambial? Ele é neoliberal ou desenvolvimentista? Ele é a favor da entrada da Venezuela no Mercosul como Lula ou é contra, como o senador Tasso Jereissati, seu maior aliado político?
Ele quer derrotar ou ajudar Dilma Roussef? Em matéria de meio ambiente, ele está mais para Marina Silva ou Carlos Minc?
Ciro já se estrepou em outra eleição majoritária – para Presidente, em 2002 –
também por dizer bobagem e na hora errada. Eu admito, como ele também achou importante afirmar, que José Serra é feio; Mas não é por beleza que o povo vai decidir em 2010.
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””Muitas pessoas têm a sorte de poder falar sobre coisas sobre as quais tenho de ficar calada.”
Mary II, rainha da Inglaterra (1662-1694), a Sofia de Hanover, após sua coroação.
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DOS 30 QUE MUDAM LEGENDA,
SÓ UNS SEIS SE APROVEITAM
Dos 30 deputados federais que mudaram de legenda para a disputa eleitoral do próximo ano, apenas cinco ou seis parecem ter razões legítimas para isso, o resto todo apenas foi motivado por esperteza eleitoral e demonstrativa de que partido para eles é como qualquer fornecedor de mercadoria.
O fluminense Geraldo Pudim (PMDB para PR) mudou-se por conta de suas relações com o já declarado candidato ao goerno estadual Anthony Garotinho. A capixaba Rita Camata (PMDB para PSDB) foi candidata à vice-presidência com José Serra em 2002. O fluminense Marcelo Itagiba (PMDB para PSDB), por ser até possível candidato ao governo estadual. O acreano Henrique Afonso (PMDB para PV) acompanhando a decisão da senadora Marina Silva.
Com o benefício da dúvida, considero que haja mais um ou dois que tenham sido motivados por razões sérias. Mas, com toda a certeza, a grande maioria, trocou de legenda apenas como um carimbo sem qualquer significado programático ou político com “P” maiúsculo, mas sim “m” minúsculo, de “malandragem” eleitoral.
Como qualquer reforma séria do sistema poderá ser aprovada por esses parlamentares?
“A GENTE GANHA
MUITO, MAS NÃO
É VIDA FÁCIL”
O consórcio Suez venceu a licitação para construção da usina de Jirau oferecendo um preço de venda menor – 72 reais por megawatt/hora –, graças a uma bem bolada mudança no projeto, vantajosa para o governo federal e os futuros usuários.
As concorrentes só pararam de recorrer depois de acordos que até hoje não foram bem explicados. Agora os deputados estaduais de Rondônia também acham que podem conseguir alguma coisa. Estão com nhemnhemnhem ambiental, típico de quem quer apenas conseguir algum tipo de vantagem – política ou de outra natureza.
Concorrência, políticos, burocracia. Certa vez um grande empreiteiro desabafou comigo numa entrevista: “A gente ganha muito com o progresso deste país. Mas não é vida fácil.”
BAIXO CLERO SEMPRE APRECIA
ONDE HÁ INTERESSES ALTOS
Quase sem aparecer nos noticiários da TV, estão correndo importantes batalhas parlamentares, em que o chamado baixo (e esperto) clero ouve conversas muito interessantes dos lobistas mais ativos. Uma é sobre a votação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) , que manteria em seus cargos titulares e funcionários antigos de cartórios (quem assumiu essas funções até 20 de novembro de 1994 e esteja nas funções há pelo menos cinco anos ininterruptos).
A Constituição de 88 acabou com a folia de cartórios serem distribuídos pelo Poder Executivo como brindes de alto luxo para amigos e parentes, instituindo a obrigatoriedade de concursos públicos.
O presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, já disse, com toda a clareza, que está em jogo a forma republicana de ocupar cargos de natureza pública. E recentemente fulminou, com um curioso neologismo, essa PEC esperta que tanto mobiliza lobistas e deputados: “Essa PEC é uma prova da resistência. Se for aprovada, vai ser a terceira vez em 30 anos que o Brasil permite a cartoragem.”
Essa PEC é, realmente, um modelo da resistência do Brasil velho ao Brasil novo que a Constituição de 1988 teve a intenção de começar a construir. Os governos – federal e estaduais – tinham a obrigação de simplesmente cumprir, regulamentar e executar. Mas aí começou o “peraí um pouquinho”, os anos se passando e a resistência se organizando. Aquela conhecida rotina estratégica dos interesses estabelecidos diante da inevitabilidade de mudanças: resistir por todas as formas, usar todas as manobras políticas, acrescentar subterfúgios processuais na Justiça, até que algum dos poderes da República bata o martelo e ordene “cumpra-se”.
Quando o Executivo remancha e o Legislativo idem, só o Judiciário, apesar de sua lenta engrenagem, pode impor o respeito à Lei.
O baixo clero também poderá ser decisivo na batalha sobre o Índice de Produtividade Agrícola, até porque o PT luta, mas sem receber até agora a bênção oficial do Planalto, sempre dividido entre parecer amigão tanto do MST como do agronegócio. Os grandes proprietários rurais, liderados pela senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária, querem tirar do Poder Executivo, através do INCRA, a responsabilidade de estabelecer esses índices de produtividade que orientam as iniciativas de reforma agrária.
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“O interesse do proprietário de terras sempre se opõe aos interesses de todas as outras classes da comunidade.”
David Ricardo (1772-1823), economista britânico, em “Princípios de Economia Política e Tributação”, 1817.
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