O Globo
O ministro Augusto Nardes terminou a sua fala ontem dizendo que o Tribunal de Contas da União tem que ser o guardião da Lei de Responsabilidade Fiscal. E de fato foi esse o papel que o TCU assumiu. O governo Dilma afrontou a LRF em artigos e princípios, ao omitir passivos, ao se endividar junto a bancos públicos através de atrasos inexplicáveis nos repasses e deixou de seguir o ritual das metas fiscais.
O ministro Weder de Oliveira disse que a história recente mostra que é preciso “vigilância permanente” porque a “cultura da responsabilidade fiscal” pode ser perdida. Disse ainda que não pode haver tolerância com o descumprimento da lei porque isso se propaga em outros níveis administrativos.
O Tribunal de Contas da União fez história porque exerceu os poderes constitucionais que tem e fortaleceu a lei que sustenta a estabilidade monetária. Daqui para diante, qualquer chefe de executivo pensará duas vezes antes de cometer as irregularidades que a presidente Dilma cometeu. O dia de ontem estabeleceu um parâmetro que guiará outros administradores públicos.
Quantas vezes o ex- secretário do Tesouro Arno Augustin e o ex- ministro Guido Mantega foram questionados sobre as práticas irregulares na contabilidade pública? Quantas vezes os especialistas em finanças do governo alertaram para o risco de se desmoralizar a lei que foi construída com tanto esforço pelo país? Eles ignoraram, fizeram ironias e continuaram inventando um truque por mês para tirar a transparência das contas públicas. Ontem, o TCU concluiu que as irregularidades somadas chegavam a um volume de R$ 106 bilhões.
A mais conhecida delas foi mandar os bancos e fundos pagarem compromissos orçamentários, demorar muito para quitar, e chegar a montantes exorbitantes de passivo junto a essas instituições. O argumento usado em determinado momento foi que isso era prática em outros governos. Um gráfico mostrado por Augusto Nardes matou esse argumento. Todas as administrações ficaram ligeiramente negativas por algum tempo com os bancos públicos, mas só a presidente Dilma em 2013 e, mais ainda, em 2014 abriu um fosso de bilhões nessas instituições.
O artigo 36 da LRF diz que é proibido uma operação de crédito junto à instituição que o governo controla. O artigo 38 avisa que em hipótese alguma pode haver operação de crédito ou antecipação de receita junto a bancos públicos no último ano de mandato. Dilma usou os bancos para cumprir obrigações orçamentárias, tornando o que era uma relação contratual em uma operação de crédito, como o fez de forma mais abusiva no último ano do primeiro mandato. A lei estabeleceu isso porque a relação promiscua entre governadores, presidentes com os bancos públicos quebrou inúmeras instituições financeiras.
Houve outros pontos que Nardes citou. O artigo nove estabelece que haja um ritual no acompanhamento dos objetivos fiscais. A cada dois meses é feita uma avaliação de receita, despesa e parâmetros econômicos para que a administração possa ir ajustando as despesas para que não se descumpra a meta. O governo não fez os contingenciamentos necessários quando apareceram os sinais de alerta, liberou dinheiro quando deveria ter reduzido despesas, aprovou receitas suplementares sem passar pelo Congresso e, ao fim, descumpriu a meta. Depois pediu autorização para alterar o número.
Manter o controle e a transparência das contas é uma das bases da democracia. Quem paga impostos tem o direito de saber quanto se arrecada, quanto se gasta, como e com o que se gasta. Manipulações para omitir dívidas, esconder despesas, postergar pagamentos, falsear estatísticas tiram a transparência e sonegam informação ao pagador de impostos.
Em nota, o Palácio do Planalto criticou a suposta tentativa de “penalizar ações administrativas que visavam a manutenção de programas fundamentais para o povo brasileiro, tais como Bolsa Família e Minha Casa, Minha Vida”. Até quando o governo usará esses programas como chantagem para encobrir o desrespeito a lei? Foram 15 indícios de irregularidades identificadas pelo corpo técnico do TCU. O cumprimento da lei não é obstáculo aos programas sociais. Pelo contrário, é ela a base da estabilidade econômica.
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