terça-feira, 5 de julho de 2016

Saldo olímpico – Editorial / Folha de S. Paulo

À medida que se aproxima o início da Olimpíada do Rio, mais a previsão de que seu legado deixaria "no chinelo" o de Barcelona-92 soa a retórica vazia do prefeito Eduardo Paes (PMDB).

Levantamento desta Folha revelou que, a um mês da cerimônia inauguração, já não há tempo para prefeitura e governo estadual cumprirem as metas anunciadas na área ambiental, desde o trivial plantio de mudas na mata atlântica até a despoluição da lagoa Rodrigo de Freitas, um dos cartões-postais da cidade.

A maior decepção é a limpeza da baía de Guanabara, prometida como a principal herança olímpica —nem sequer se chegou à metade do objetivo de tratar 80% do esgoto despejado nas suas águas.

Ruim para os atletas de vela, obrigados a competir em local impróprio para o banho, e pior para os moradores do entorno, que continuarão a conviver com a sujeira.


Outra frustração, esta mais ruidosa, se dá com a segurança pública. A faixa "Welcome to hell" (bem-vindo ao inferno), estendida por policiais com salários atrasados no aeroporto do Galeão, dá a medida do descalabro.

Em meio ao aumento da violência, de homicídios a roubos na rua, o Estado convive com casos frequentes de barbárie, como a espantosa invasão do hospital Souza Aguiar para o resgate de um traficante, no mês passado, que deixou um paciente morto.

A severa crise financeira que o Estado atravessa não explica sozinha o malogro. Só agora, por exemplo, a secretaria do Ambiente decidiu criar uma agência com os 15 municípios do entorno da baía para discutir a despoluição, numa mostra do amadorismo com que se geriu um desafio tão complexo.

É justo reconhecer avanços, ainda que com atrasos, no transporte público. Os três corredores de ônibus BRT, especialmente desenhados para evitar congestionamentos, devem ser inaugurados antes da cerimônia da abertura. As obras necessárias do metrô estão praticamente concluídas.

O melhor desempenho nessa área provavelmente está ligado à cobrança mais firme do Comitê Olímpico Internacional, preocupado com a mobilidade durante os Jogos. A duras penas, a entidade aprende a diferença no Brasil entre promessas de campanha eleitoral e os resultados efetivos.

O dossiê para a candidatura do Rio continha 1.100 projetos de arquitetura e urbanismo distribuídos em 538 páginas. Foram anexados 130 documentos de garantias que, se empilhados, alcançariam 2,5 metros de altura. Trata-se um monumento representativo do que restará para a cidade após a Olimpíada: mais papel do que legado.

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