O Estado de S. Paulo
Por excesso de dependência, Brasil é pego
de calça curta na guerra, como na pandemia
Depois de falar com o russo Vladimir Putin,
o francês Emmanuel
Macron avisou ao mundo que “o pior está por vir na Ucrânia”. Quem
avisa amigo é, e o pior não atinge só a Ucrânia, bombardeada, invadida e
ameaçada de extinção, mas também potências e países periféricos. O Brasil não
passa ileso.
Os efeitos da guerra em si, e do cerco e das sanções à Rússia, já começam a chegar, não na forma de bombas, tanques e tiros, mas de ameaça ao fornecimento e aos preços de gás, combustível, fertilizantes e trigo. Logo, às famílias, empresas e economia, com mais inflação e juros, menos crescimento e empregos.
Na pandemia de covid-19, o Brasil foi pego
de calças curtas pelo excesso da dependência externa de insumos para vacinas e
medicamentos, respiradores e equipamentos hospitalares e até máscaras. Há uma
década, produzia 55% dos IFAs (Ingredientes Farmacêuticos Ativos) e, agora, 5%.
Ou seja, importa 95%.
Na guerra da Rússia contra a Ucrânia, o
Brasil está novamente frágil, pelo excesso de dependência de fertilizantes, apesar
de ser um dos três maiores produtores agrícolas do mundo, e também de trigo, um
dos dois principais alimentos na mesa dos brasileiros, junto com o arroz.
O País importa 85% dos fertilizantes que
consome, 1/3 disso da Rússia e de Belarus.
Segundo a ministra Tereza
Cristina, o problema será na próxima safra, entre agosto e setembro.
E propõe: ampliar os fornecedores, com foco no Canadá;
facilitar os processos de importação; a Embrapa ensinar como usar menos
fertilizantes.
E o Brasil é autossuficiente e até exporta
soja e milho, utilizados para a pecuária, mas é dependente do trigo, único grão
de consumo estritamente humano, base para pães, macarrão, bolos e biscoitos.
Importa 60% do consumo interno, 85% da Argentina, mas a Rússia é o maior
exportador no mundo e a Ucrânia está entre os dez maiores produtores. Os preços
internacionais dispararam. Bom para a Argentina,
ruim para o Brasil.
Ontem, o presidente da Associação
Brasileira da Indústria do Trigo (Abitrigo), ex-embaixador Rubens
Barbosa, pediu a Tereza Cristina atenção a dois planos há anos na
gaveta do governo. Um, de 2019, é da própria associação e o outro, de 2020, é
da Embrapa – estatal –, prevendo produzir trigo no Cerrado. Custaria R$ 3
milhões e acarretaria uma economia de R$ 450 milhões por ano.
O presidente Jair Bolsonaro, aliás, tem uma saída para os fertilizantes: explorar potássio em reservas indígenas. E ataca: “o Brasil foi em parte inviabilizado no passado com a indústria da demarcação das terras indígenas”. Guerra? Que nada! O problema são os indígenas.
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