sexta-feira, 20 de maio de 2022

Cristian Klein: Lula e PT em busca de novos casamentos

Valor Econômico

Tensão com PSB e rejeição a Freixo apontam mudanças para campanha de ex-presidente no Rio

Depois de encaminhada a aliança com o PSD em Minas Gerais, para construir um palanque de Lula no Estado, o PT volta sua atenção para o Rio de Janeiro, onde dirigentes dizem que a situação está em aberto.

No terceiro maior colégio eleitoral do país, o candidato de Lula ao governo é Marcelo Freixo (PSB), mas movimentos internos pressionam pela criação de um segundo palanque, mais centrista.

E de novo com o PSD, com quem o PT almeja costurar uma tríplice aliança nos maiores Estados - São Paulo, Minas e Rio. E preparar, quem sabe, o sonhado casamento nacional de Lula, não com sua agora cônjuge Janja, mas com Gilberto Kassab.

O palanque no Rio passou a dar dor de cabeça ao PT por duas razões. A primeira é a persistência do PSB em querer a vaga de senador na chapa majoritária para o deputado federal Alessandro Molon. Os petistas argumentam que o acordo prevê apenas a candidatura do presidente da Assembleia Legislativa André Ceciliano (PT). Molon está à frente de Ceciliano nas intenções de voto.

A segunda razão é o desempenho aquém do esperado de Freixo. Com alta rejeição nas pesquisas, apesar da tentativa do parlamentar, neste ano, de se livrar da pecha de radical, o PT acendeu o alerta diante da possibilidade de Freixo prejudicar a eleição de Lula no Rio.

Antes na dianteira, o deputado vem sendo ultrapassado pelo governador Cláudio Castro (PL), candidato do presidente e correligionário Jair Bolsonaro, que também sobe, enquanto Lula oscila para baixo.

A percepção é que o palanque com Freixo tem estreitado muito a campanha de Lula no Estado. O problema foi discutido no Grupo de Trabalho Eleitoral (GTE) do PT nacional, na terça-feira, quando dirigentes defenderam a encomenda de novas pesquisas quantitativas e qualitativas e a ampliação da política de aliança com outros partidos.

O plano de aproximação com o grupo do prefeito da capital, Eduardo Paes (PSD), cujo candidato a governador é o ex-presidente da OAB Felipe Santa Cruz, voltou à mesa. Coordenador do GTE e vice-presidente nacional do PT, o deputado federal José Guimarães reconhece que há diálogos com Paes, que também tem interesse no apoio de Lula. O parlamentar, porém, prefere dizer que as conversas não implicam a construção do palanque duplo no Estado, embora colegas do partido já falem da possibilidade.

Há um tanto de cautela e o primeiro passo da cúpula do PT é questionar se o PSB vai mesmo cumprir o acerto inicial sobre o Senado. Em nota do GTE assinada por Guimarães, o partido disse ontem que resolve “solicitar ao PSB a validação do acordo nacional, que inclui a manutenção” das candidaturas de Freixo e de Ceciliano. O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, prefere o silêncio no momento, conforme disse à coluna.

Parte da saia-justa ocorre pela própria tensão interna entre Freixo e Molon, que têm um histórico de rivalidade por votos e posições na esquerda do Rio. No PSB, Molon é mais veterano, filiou-se em 2018, além de ser o presidente estadual. Freixo, que está há 11 meses, é apontado como um “cristão-novo”.

“Siqueira não é um entusiasta da candidatura do Freixo”, afirma o secretário nacional de comunicação do PT Jilmar Tatto, que participou da reunião do GTE. Em janeiro, um episódio causou irritação na cúpula do PSB quando Freixo defendeu a candidatura de Fernando Haddad (PT) a governador de São Paulo, em detrimento de Márcio França, quadro histórico do PSB. Dada a sua ligação com Lula, o deputado passou a ser visto como um infiltrado do PT entre os pessebistas.

Outra parte do tensionamento ocorre pela recusa do PT em aceitar que ambos, Molon e Ceciliano, sejam lançados pela coligação ao Senado, sob a alegação de que dividirão votos da esquerda. “Essa identidade de campo é muito importante. É uma eleição que vai ser polarizada nacionalmente e no Rio”, diz a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.

A identidade de campo, porém, é um conceito elástico para Ceciliano. O presidente da Assembleia Legislativa não apenas é refratário a Freixo, ao ignorá-lo em declarações e discursos - como no lançamento de sua pré-candidatura, há três semanas - ou ao deixar de comparecer ao aniversário do pessebista, no mês passado.

Também é elogioso a Castro. A Ceciliano é atribuído o controle de uma das pastas mais poderosas do governo, a de Infraestrutura e Obras.

O petista também tem relação com a centro-direita e a ultradireita bolsonarista, como o deputado federal Otoni de Paula (MDB), que, no início do mês, o levou à Assembleia de Deus de Madureira, onde ajoelhou sob as benções do bispo Abner Ferreira.

Otoni é o mesmo que, no início de abril, chamou o ex-presidente de “Luladrão” na tribuna da Câmara e afirmou que quem incomodasse parlamentares em casa - como Lula propôs a sindicalistas para terem projetos aprovados no Congresso - seriam “vagabundos” recebidos à bala.

A candidatura de Ceciliano já vem funcionando como um abre-alas para o voto Lula-Castro, o palanque informal que reúne uma geleia geral de políticos em meio, paradoxalmente, a uma eleição nacional polarizada. O que está em jogo, caso se confirme um palanque duplo para Lula no Rio, é uma despolarização da disputa estadual.

Da parte do governador a despolarização é, há muito, estratégia dominante. Em declaração a “O Globo”, nesta semana, disse ser apoiador de Bolsonaro, mas que não criticará Lula. Da parte do PT, mesmo que o PSB retire a pré-candidatura de Molon, haveria dificuldades com o palanque único de Freixo. “O problema não é só Molon, é estrutural. Queremos ter 70% dos votos no Rio, e não 20%, 30% com Freixo”, afirma Tatto, com a ressalva de estar emitindo opinião própria, não em nome do GTE.

“Temos que sentar todos em busca de um grande acordo”, defende. Para o dirigente petista, caso o PSB mantenha o nome de Molon, o PT ficaria livre para buscar novos parceiros. O PSB formaria uma chapa com Freixo e Molon, e o PT construiria o novo palanque oficial de Lula. Na nova equação, o PSD de Paes traria a reboque o PSDB-Cidadania de Rodrigo Maia e a coligação poderia contar ainda com o PDT de Rodrigo Neves, a depender da confirmação da candidatura presidencial de Ciro Gomes. Ceciliano poderia concorrer a governador ou a nada.

Outra fonte graduada da cúpula do PT vai na mesma direção: “Deve haver algum tipo de tensionamento para que a campanha do Lula possa ser mais ampla do que está no momento”.

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