quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Marina fura estratégia da disputa plebiscitária e desarruma jogo de 2010

Raymundo Costa e Cristiano Romero, de Brasília
DEU NO VALOR ECONÔMICO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu-se ontem com as cúpulas do PT e do PSB para reavaliar a estratégia governista na eleição presidencial de 2010. Quando convocou a reunião, Lula tinha um prato feito para apresentar aos partidos. A situação mudou, em menos de uma semana, depois que a senadora Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, passou a considerar seriamente a hipótese de sair do PT e eventualmente disputar a Presidência da República pelo PV.

A candidatura de Marina é um revés para Lula. É do presidente a estratégia para levar a eleição presidencial a uma espécie de plebiscito entre os oito anos de governo tucano e os oito do PT. Para isso era preciso retirar do cenário uma candidatura que se mostrava competitiva no campo governista - a do deputado Ciro Gomes (PSB-CE), até agora o segundo colocado nas pesquisas de opinião. O primeiro é o tucano José Serra, governador de São Paulo, enquanto a candidata de Lula, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, aparece ora em terceiro, ora tecnicamente empatada com Ciro.

Com a eventual saída de Ciro, a "eleição plebiscitária" imaginada por Lula se daria entre Serra e Dilma Rousseff. O prestígio do presidente é muito grande no Nordeste, mas ele enfrenta dificuldades eleitorais no Sudeste e no Sul. A candidatura de Ciro Gomes ao governo de São Paulo seria parte da solução do problema: tiraria um candidato competitivo da eleição presidencial e daria ao PT e a Dilma um nome (Ciro) capaz de criar problemas para Serra em São Paulo, onde se situa o maior colégio eleitoral do país.

A entrada em cena de Marina, no entanto, teve o efeito de um tsunami no Planalto e fez um furo na estratégia presidencial. Com três candidatos saídos da base governista (Dilma, Ciro e Marina), o PSB passou a a considerar que Ciro tem tantas chances - ou até mais, por ter "recall" de duas outras eleições presidenciais - quanto Dilma e Marina de passar e disputar o segundo turno com o apoio da ministra da Casa Civil e - talvez - também da ex-ministra do Meio Ambiente. Seria um quadro parecido com o de 2002, quando Serra, candidato do então presidente Fernando Henrique Cardoso, ficou isolado na disputa contra o próprio Ciro (naquela época, filiado ao PPS), Anthony Garotinho (então, no PSB) e Lula.

Num primeiro momento, o Palácio do Planalto subestimou a "hipótese Marina", cujo nome foi habilmente trabalhado pelo PV: primeiro o partido divulgou o convite à ex-ministra, depois vazou resultados de uma pesquisa em que ela aparece à frente de Dilma em algumas das simulações. O Planalto ridicularizou a pesquisa. Depois, passou a dizer "imagina, Marina é uma das fundadoras do PT, jamais deixará o partido". Quando a preocupação aumentou, a cúpula do governo enviou mais de um emissário para sondar as reais intenções da senadora petista. Entre eles, o ex-governador Jorge Viana, colega de PT da senadora no Acre.

Foram todas conversas educadas, civilizadas, segundo relatos de que quem acompanhou a movimentação. Marina falou que tem o PT no coração, mas em nenhuma dessas conversas descartou a hipótese de deixar o PT e muito menos a de ser candidata presidencial pelo PV. Também avaliou que o PT se transformou num partido excessivamente pragmático, que deixou de lado o "sonho e a utopia".

Os emissários do Planalto voltaram preocupados, mas com a sensação de que o teor das conversas continha algumas mágoas: com a saída do ministério, com a falta de apoio de Lula para a eleição de Tião Viana (PT-AC) ao Senado e até ao fato de Jorge Viana, ex-governador do Estado, não ter sido convidado por Lula para ser ministro do governo. De qualquer forma, assessores palacianos decidiram destacar o ex-ministro Antonio Palocci para uma conversa mais definitiva com Marina, com quem tem ótima relação.

A disputa plebiscitária idealizada pelo presidente também ajudaria nos acordos estaduais, sobretudo a coligação entre o PT e o PMDB, desejo expresso de Lula que o PT engoliu até agora por conta apenas da sua elevada popularidade. Especialmente o PT de São Paulo. Se Lula não conseguir impor seu ponto de vista, será chamado a arbitrar entre as candidaturas de Antônio Palocci e do prefeito de Osasco, Emídio de Souza, ao governo estadual.

Em reunião anteontem, integrantes da cúpula do PT avaliaram a situação: eles não sabiam exatamente o que Lula iria falar ontem a noite no jantar-reunião com a cúpula do PT e do PSB, evento que não havia começado até o fechamento desta edição. Segundo um petista, tratava-se de conversa para varar a noite.

Depois de trocar entre si informações, os petistas saíram da reunião de terça-feira mais ou menos convencidos de que Ciro vai insistir em sair candidato a presidente. São Paulo não estaria efetivamente em seus planos. O Plano B de Ciro seria a candidatura a vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff, uma vez que os petistas dizem que já não há mais jeito: o candidato do PT será a ministra da Casa Civil. As especulações em torno de Palocci não passariam disso mesmo: especulações.

Já os socialistas do PSB - além de Ciro, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, o vice-presidente do partido, Roberto Amaral, o senador Renato Casagrande e o líder da sigla na Câmara, Rodrigo Rollemberg - foram para o jantar de ontem com Lula, convictos de que têm um candidato competitivo para disputar a presidência. "Temos um candidato, um nome. Ciro tem 15% das intenções de voto, tanto quanto Dilma", ponderou um integrante do partido.

O PSB não descarta lançar Ciro ao governo de São Paulo - uma ideia inicialmente lançada pelo deputado Márcio França (PSB-SP), mas logo incorporada com entusiasmo pelo presidente Lula - ou mesmo ao governo do Rio de Janeiro. Mas, antes, quer, segundo um dirigente, "arrumar o jogo" no diálogo com o presidente e o PT. Uma das preocupações do PSB é com o pós-Lula.

Na avaliação da cúpula do partido, as "conquistas" do governo Lula não foram institucionalizadas. Além disso, o presidente teria se tornado um mito em vida, cuja presença já é suficiente, por exemplo, para resolver conflitos dentro do PT ou mesmo no PMDB. Ao que tudo indica, ele não será sucedido por outro mito, e o futuro presidente, seja quem for, terá que conviver com sua presença.

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