segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Risco de fuga das urnas


Aumento dos votos nulos, brancos e da abstenção em algumas das maiores cidades de Minas revela descrença de parte da população na força do voto

Bertha Maakaroun

Eleitores mais distantes da disputa. Poucos adesivos em carros. Para boa parte dos cidadãos, não há emoção na briga pelo voto na qual se engalfinham candidatos. Esse movimento não é novo, e a julgar pela evolução dos votos brancos, nulos e da abstenção nas últimas eleições, a frieza poderá voltar a se traduzir nas urnas, com o encolhimento dos votos válidos. Na última campanha para prefeito de Belo Horizonte, em 2008, brancos, nulos e abstenções somaram quase um terço do eleitorado: 29%. Foi o maior percentual verificado nos últimos quatro pleitos na capital, que superou inclusive 1996, quando foram registrados 27%. Em 2000 e em 2004, brancos, nulos e abstenção caíram para 24%, voltando a subir quatro anos depois.

Não é apenas na capital que o eleitor parece acompanhar de camarote o debate. Também em cidades grandes, em que há segundo turno, registra-se crescimento do grupo que opta pelo voto nulo, branco ou não comparece às urnas. Em Contagem, depois do aumento gradual dos votos válidos entre 1996 e 2004 – respectivamente 77%, 78% e 79% – nas últimas eleições municipais esse percentual caiu para 75%. Um quarto dos eleitores abriram mão de escolher um candidato. O mesmo ocorreu em Juiz de Fora e em Betim. Na cidade da Zona da Mata, os votos válidos caíram de 81% em 1996 para 77% em 2008, a menor taxa das quatro últimas eleições. Em Betim, os votos válidos para prefeito em 2000 e em 2004 chegaram a 82% do eleitorado, mas em 2008 encolheram para 80%.

Num contexto em que o voto é obrigatório, como é o caso brasileiro, o crescimento do número daqueles que não querem ir às urnas sugere um afastamento – quase um desencanto – do eleitor. Para o cientista político e professor do Departamento de Ciência Política da UFMG Bruno Wanderley Reis, o fato de as eleições terem virado uma rotina torna previsível esperar, a longo prazo, algum aumento da abstenção. "É de se esperar um movimento nesse sentido. Em contextos específicos, entretanto, pode haver picos de participação", contrapõe.

As conjunturas políticas podem ser mais ou menos propícias a que seja reacesa a chama da participação. O cientista político Marcus Figueiredo, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), considera, no artigo "O voto obrigatório", que a participação do eleitor varia em função de sua percepção quanto à capacidade de influir na vida política do país, cidade e município. Nesse sentido, a flutuação na taxa de abstenção relaciona-se às condições em que ocorre a competição política e à crença na efetividade do voto como mecanismo de mudança.

Nas primeiras eleições após um longo jejum provocado pelo regime militar, a abstenção no primeiro turno em 1989 foi de 11,9%, proporção que, em média, dobrou nas eleições da última década. A lógica eleitoral pode ser facilmente aplicada também às democracias antigas, como é o caso da eleição de Barack Obama, nos Estados Unidos, em 2008, quando numa sociedade desgastada pelo governo de George W. Bush e sua política única de guerra ao terror, levou quase 66% dos 153,1 milhões de eleitores registrados às urnas. Nos Estados Unidos, onde o voto não é obrigatório – e o comparecimento médio gira em torno de 50% –, a participação política naquele ano foi a maior desde 1908, quando várias restrições impediam todos os americanos de votar. O comparecimento naquela eleição também superou o recorde de 1960, quando 64,9% foram às urnas na disputa entre John Kennedy e Richard Nixon.

FONTE: ESTADO DE MINAS

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