Em editorial publicado há dias, sob o título Acordo para a impunidade, chamamos a atenção para a impropriedade de a Controladoria-Geral da União (CGU), com o apoio da Advocacia-Geral da União (AGU), dois órgãos subordinados diretamente à Presidência da República, estar empenhada em convencer o Ministério Público Federal (MPF) a aceitar um acordo de leniência para limitar punições às empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobrás. O argumento central da estranha proposta é o de que seria altamente prejudicial ao País a declaração de inidoneidade de empreiteiras responsáveis pelas obras consideradas pelo governo como essenciais ao desenvolvimento econômico e social.
A CGU não existe para se preocupar com a saúde financeira de empreiteiras, mas para controlar seu relacionamento com o poder público. Muito mais grave do que isso, porém, é o fato de que é absolutamente impensável a hipótese de que não tenha sido previamente aprovada pela Presidência da República a surpreendente proposta apresentada - e sensatamente recusada - à força-tarefa de procuradores federais da Lava Jato pelo secretário executivo da CGU, Carlos Higino. O apoio da AGU à ideia só reforça a evidência. E isso parece significar que o governo petista está disposto a fazer vista grossa diante do maior escândalo de corrupção da história republicana para preservar-se, e a seus aliados, dos inevitáveis prejuízos político-eleitorais que a apuração e o julgamento rigorosos dos fatos inevitavelmente acarretarão.
A iniciativa da CGU, não por acaso, coincide com as notícias que começam a se disseminar na mídia - e são de interesse também das empreiteiras sob investigação - sobre os grandes prejuízos para o governo provocados pela paralisação ou retardamento de grandes obras públicas, como as da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco. Além das notícias, igualmente alarmantes, sobre a "demissão em massa" de trabalhadores em projetos petroquímicos porque a Petrobrás não tem feito o pagamento de aditivos de contratos com as empreiteiras. Começa a se armar, assim, o ingresso nesse cenário alarmante de movimentos sindicais e sociais - o que não falta hoje no País são líderes sindicais neopelegos e organizações sociais manipuladas pelo lulopetismo - adequadamente articulados para defender a oportuna tese de que a luta contra a corrupção não pode ser levada ao custo do sacrifício dos direitos dos trabalhadores.
Tem sólidos precedentes o interesse do governo em tudo o que possa minimizar - terminar em pizza já é impossível - as consequências judiciais de escândalos como o da Petrobrás. O lulopetismo, por exemplo, jamais aceitou a decisão da Justiça a respeito do mensalão e Luiz Inácio Lula da Silva chegou a prometer, em 2009, que tão logo deixasse a Presidência da República se dedicaria a desmontar aquela "farsa". Deu no que deu e os petistas tiveram que se contentar em promover a "guerreiros do povo brasileiro" seus líderes encarcerados.
Ao contrário de Lula, Dilma Rousseff não fez a defesa aberta de companheiros envolvidos em bandalheiras, embora a teimosia com que insiste em manter intocada a diretoria da Petrobrás, e em particular sua amiga Graça Foster, não contribua para projetar a imagem indiscutível de uma primeira magistrada acima de qualquer suspeita.
Assim, no momento em que dois importantes órgãos auxiliares da Presidência da República tomam a iniciativa de levar aos procuradores da Operação Lava Jato uma proposta que beneficia com a impunidade, mesmo que parcial, empreiteiras confessadamente comprometidas com a corrupção em seus negócios com o poder público, é hora de a inquilina do Palácio da Alvorada vir a público para dizer se é isso mesmo o que deseja ou se os funcionários da CGU e da AGU foram além do que lhes permitem os cargos de confiança que exercem.
Toda a sociedade brasileira, inclusive a quase-metade que não sufragou sua reeleição, deseja acreditar nas palavras da presidente Dilma Rousseff em seu discurso de posse no segundo mandato: "Estou propondo um grande pacto nacional contra a corrupção, que envolve todas as esferas do governo e todos os núcleos do poder, tanto no ambiente público como no ambiente privado". Mas, para isso, não basta dizer. É preciso fazer.
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