quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Luiz Carlos Azedo- Cada macaco no seu galho

• Num momento de crise econômica, política e ética que fragiliza a presidente Dilma Rousseff, tudo o que o país não precisa é mexer com os brios dos militares. Eles estão quietos no seu canto

- Correio Braziliense

O golpismo no Brasil é uma praga que dominou a política na República Velha e na Segunda República, sob forte influência do positivismo como ideologia e a presença constante dos militares. Resultou em duas ditaduras, a de Vargas (1930-1945) e o regime militar (1964-1985). Mesmo a Proclamação da República, em 1889, não foi obra dos liberais da época, que eram escravocratas em sua maioria, mas da jovem oficialidade rebelde que tirou o marechal Deodoro da Fonseca da cama, sob inspiração de Benjamin Constant, professor da Escola Militar e grande líder positivista do Brasil. O povo assistiu bestificado.

Do episódio dos 18 do Forte de 1922, que deu origem ao tenentismo, à bomba do Riocentro, em 1981, a insubordinação nas Forças Armadas foi constante. Destacaram-se a Coluna Prestes (1925-1927) e o levante comunista de 1935, à esquerda; a crise que levou Vargas ao suicídio (1954) e as tentativas de impedir a posse de Juscelino Kubitschek (1956) e, mais tarde, de João Goulart (1961), à direita — que fracassaram. Os golpes que depuseram Washington Luiz (1930); Getúlio Vargas (1945); e João Goulart (1964), que contaram com amplo apoio político e popular.

Em 1969, houve um golpe dentro do golpe: o presidente Costa e Silva teve uma isquemia cerebral, mas seu sucessor legal, o vice Pedro Aleixo, foi impedido de assumir o cargo por uma Junta Militar. Assumiu o poder o general Emílio Médici.

Coube ao presidente Ernesto Geisel acabar com a indisciplina. Para isso, precisou demitir o general Ednardo D’Ávila Mello, comandante do II Exército, após o assassinato do operário Manoel Fiel Filho (que se seguiu ao do jornalista Vladimir Herzog, no mesmo quartel sob sua jurisdição). E mandar pra casa o ministro do Exército, general Sílvio Frota, que o desafiara. O restabelecimento da hierarquia não se deve apenas às duas degolas. A disciplina voltou graças aos rígidos critérios para promoção da oficialidade, rodízios de comandos e prazos de permanência dos oficiais-generais na tropa, sem os quais seria impossível a retirada em ordem dos militares da política.

Mal-entendido
Na quinta-feira, os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica souberam pelo Diário Oficial que a presidente Dilma Rousseff havia assinado o Decreto nº 8.515, delegando ao ministro da Defesa a competência para assinar atos relativos ao pessoal militar, tais como a transferência para a reserva remunerada de oficiais superiores, intermediários e subalternos, reforma de oficiais da ativa e da reserva, promoção aos postos de oficiais superiores e até nomeação de capelães militares. Essa atribuição era dos comandantes militares, livre de ingerências partidárias.

O ministro da Defesa, Jaques Wagner, também foi surpreendido pela publicação, subscrita pelo comandante da Marinha, almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que ocupava o cargo de ministro interino da Defesa e nega ter assinado o documento. O ministro Aloizio Mercadante — filho de general — responsabiliza a secretaria-executiva do Ministério da Defesa, Eva Maria Chiavon, hoje mais poderosa do que muitos dos antigos marechais, pela publicação, que dormia há meses na gaveta da Casa Civil.

O ministro da Defesa, Jaques Wagner, estava na China quando o decreto foi publicado, mas desculpou-se com os comandantes militares, que estavam amuados e fora do palanque principal, somente no desfile de Sete de Setembro. Disse-lhes que publicará uma nova norma, subdelegando aquelas atribuições aos comandantes das forças. Segundo ele, o decreto apenas normatizou as prerrogativas do ministro da Defesa.

A trapalhada gerou inquietação entre os militares da ativa e da reserva. E pôs uma pulga atrás das orelhas dos comandantes militares. O Ministério da Defesa já foi “aparelhado” pelo PT, que ocupou os cargos estratégicos da pasta. O orçamento das Forças Armadas está sob controle de Eva Chiavon, que hoje é quem determina as licitações para compras e investimentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, além do fluxo de caixa, cada vez menor.

A criação de um “dispositivo militar” petista tem tanta chance de dar certo quanto o do general Assis Brasil, em 1964. O Brasil não é como a Venezuela, cujas Forças Armadas foram cooptadas pelo “bolivarianismo”. Num momento de crise econômica, política e ética que fragiliza a presidente Dilma Rousseff, tudo o que o país não precisa é mexer com os brios dos militares. Eles estão quietos no seu canto e não querem meter as mãos na cumbuca da crise do governo Dilma.

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