• Uma das principais medidas do ajuste fiscal recebe 366 votos
Vitória do governo Temer dá início às reformas, depois de STF negar mandado contra proposta
O governo conseguiu aprovar na Câmara, em primeiro turno, a proposta de emenda constitucional que limita os gastos públicos. Foram 366 votos a favor, 111 contra e duas abstenções. Mais cedo, o STF rejeitara mandado de segurança pedido pela oposição para tentar interromper a tramitação da proposta. O teto dos gastos é a primeira grande medida de ajuste fiscal do presidente Temer. Na reforma da Previdência, o governo quer acabar com a aposentadoria especial de deputados e senadores.
Teto de gastos é aprovado
• Com 366 votos, Câmara dá aval à primeira grande medida de ajuste fiscal do governo Temer
Martha Beck, Cristiane Jungblut Catarina Alencastro - O Globo
BRASÍLIA E NOVA YORK - O governo recorreu a um verdadeiro rolo compressor para aprovar a proposta de emenda constitucional (PEC) 241, que fixa um teto para os gastos públicos, em primeiro turno, no plenário da Câmara dos Deputados. Já no fim de semana, o presidente Michel Temer se empenhou pessoalmente junto aos deputados para defender a PEC. E ontem, com manobras regimentais, a base aliada conseguiu abrir caminho para a votação do texto sem a realização das duas sessões de discussão exigidas no regimento da Casa para que uma PEC seja analisada em plenário após passar por uma comissão especial. Além disso, os ministros Bruno Araújo (Cidades), Fernando Coelho (Minas e Energia) e Marx Beltrão (Turismo, recém-nomeado), foram exonerados dos cargos para reassumirem sua condição de deputados e votarem na Câmara.
Foram 366 votos a favor, 111 contra e duas abstenções. Eram necessários, no mínimo, 308 votos. Por ser uma emenda, depois de analisados os destaques, o projeto ainda terá de ser apreciado mais uma vez no plenário da Câmara. Só depois seguirá para o Senado.
O segundo turno deve ocorrer no próximo dia 24. O líder do PSD na Câmara, deputado Rogério Rosso (DF), disse que a data foi acertada porque são necessárias cinco sessões de intervalo entre o primeiro e o segundo turnos. Ele conversou com Temer, que disparou telefonemas em comemoração ao resultado. No domingo, segundo Rosso, o presidente havia conseguido rever 15 de 22 indecisos nas listas dos governistas.
Na mesma força-tarefa, os ministros dos Transportes, Maurício Quintella, e da Saúde, Ricardo Barros, passaram o dia no Congresso defendendo a PEC. Ela prevê que, por um prazo de 20 anos, as despesas públicas só poderão crescer com base na inflação registrada no ano anterior. Ou seja, não terão aumento real. A proposta é considerada a principal medida econômica do governo Temer, que quer mostrar ao mercado um compromisso firme com o reequilíbrio das contas públicas.
Segundo assessores do relator da PEC 241, Darcísio Perondi (PMDB-RS), Temer disse ao deputado que ele “fez história” e que suas “persistência e garra serão reconhecidas pelas gerações futuras”.
PRESIDENTE FALA EM ‘VITÓRIA MAIÚSCULA’
No domingo, Temer participou de um almoço com líderes da base aliada na residência do deputado Rogério Rosso (PSD-DF). E, em gesto inédito, convidou todos os parlamentares da base para um jantar no Palácio da Alvorada. Ontem, o presidente começou o dia rezando pela aprovação da PEC. Em audiência com o arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta, ele pediu orações para que a proposta passasse em primeiro turno.
— Ele (Temer) expôs que está preocupado com a votação. Ele tem a necessidade de colocar o Brasil nos trilhos — disse o cardeal.
A PEC foi aprovada por ampla maioria na Comissão Especial da Câmara na última quinta-feira. Como não houve sessão de debates na sexta-feira, a votação da emenda só poderia ocorrer ontem se houvesse a chamada quebra de interstício, permitindo a análise do texto após uma única sessão. Para isso, o líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE), apresentou um requerimento, aprovado no fim da manhã por 255 votos.
Temer comemorou, por meio de seu porta-voz, Alexandre Parola, a aprovação da PEC, que considerou uma “vitória maiúscula”. Ele agradeceu aos 366 parlamentares que votaram a favor. Na mensagem oficial do governo, Temer garantiu que a matéria não retirará direitos da população e que as áreas de saúde e educação serão preservadas. Após a votação, o presidente telefonou para líderes aliados agradecendo o resultado.
— O presidente Michel Temer recebeu com muita satisfação o resultado da votação. É sinal claro do compromisso do Congresso com a recuperação do equilíbrio fiscal e do resgate da responsabilidade na gestão do orçamento público. O apoio dado pelo Congresso aos esforços do Executivo é e será fundamental para que o Brasil retome o crescimento, com inflação controlada e com a capacidade de implementar politicas sociais voltadas para o bem-estar de cada cidadão brasileiro — disse Parola, em nome de Temer.
Ele acrescentou que, ao votar favoravelmente à PEC, o Congresso entendeu o princípio que norteia as famílias brasileiras, de que “só se deve gastar o que se arrecada”:
— Orçamento equilibrado representa a garantia de que haverá, no futuro, recursos necessários para medidas sociais de combate à pobreza e para a saúde e educação. A emenda não retira nenhum dos direitos garantidos pela Constituição e preserva os gastos justamente nas áreas de saúde e educação.
A vitória com ampla margem de votos, disse Temer, traz confiança ao país. Para ele, os deputados que ajudaram a aprovar a PEC nessa primeira fase foram parceiros do governo.
— Ao reiterar sua satisfação pelo resultado, o presidente agradece a cada uma das parlamentares e cada um dos parlamentares, que foram parceiras e parceiros nessa vitória maiúscula, e reafirma sua firme confiança de que, a partir da construção de consensos e da negociação democrática, o Brasil vai se reencontrando com sua vocação de prosperidade e justiça social — disse Parola.
BATE-BOCA NO PLENÁRIO, GANHOS NA JUSTIÇA
A votação da PEC foi marcada por bate-boca e discussões entre parlamentares da base e da oposição. Até mesmo entre a base houve divergências. Num dos momentos mais tensos, o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), cuja bandeira é a defesa de aposentados e servidores públicos, mandou o colega Júlio Lopes (PP-RJ) calar a boca e disse que a base queria votar logo o texto para “pagar” o jantar oferecido por Temer no domingo. Lopes ajudava a segurar uma faixa afirmando “O PT quebrou o Brasil. Nós estamos consertando”.
— Iremos resistir e defender o trabalhador brasileiro da PEC, que acaba com os direitos dos servidores públicos — disse Faria de Sá.
A oposição apresentou um vários requerimentos para tentar obstruir a votação.
—É a PEC da Morte, vai acabar com capacidade de o Estado investir em Saúde e Educação — disse o líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA), adotando o slogan de um pequeno grupo de servidores que estava nas galerias.
Os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Gleisi Hoffmann (PT-PR) foram à Câmara engrossar o movimento contra a emenda. Já a líder da minoria na Câmara, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), divulgou documento de economistas que contestam os efeitos da PEC 241:
— Fico me perguntando como esses deputados dormem à noite. É o desmonte do Estado.
O deputado Sílvio Costa (PTdoB-PE), que era aliado do PT na defesa de Dilma Rousseff, anunciou que votaria a favor da PEC e foi vaiado:
— Podem vaiar, que eu gosto. Vaia é o aplauso ao contrário.
As discussões em torno do projeto da repatriação também contaminaram o debate sobre a PEC, mas não impediram o andamento da votação.
A oposição ainda sofreu uma derrota na Justiça. Ontem, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Roberto Barroso rejeitou mandado de segurança para interromper a tramitação da PEC. No pedido, Alfonso Florence, Jandira Feghali e o líder do PCdoB, Daniel Almeida (BA), alegavam que a PEC interfere na autonomia administrativa e financeira dos poderes Judiciário e Legislativo, além de violar o direito dos próximos cinco presidentes de dispor sobre gastos públicos. De acordo com a emenda, a regra do teto se aplica a todos os Poderes e prevê punições em caso de descumprimento. Uma delas é vedar a concessão ou majoração de auxílios, vantagens e quaisquer benefícios não remuneratórios a servidores públicos.
No fim da tarde, outra boa notícia chegou ao Palácio do Planalto: o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), presidido por Gilmar Mendes, criticou a nota técnica divulgada na última sexta-feira pela Procuradoria-Geral da República (PGR), segundo a qual a PEC seria inconstitucional. “Não é constitucionalmente sustentável que determinados setores do Estado, em nome do princípio da divisão de Poderes, possam se subtrair de sacrifícios que a todos se impõem”, afirmou o texto. “Se não for aprovado, este e todos os próximos governos não terão alternativa além de cobrar impostos cada vez mais altos”.
Mais cedo, ao participar de um seminário, Gilmar Mendes foi taxativo:
— Não consigo entender o alcance dessa proposta. A União tem que se endividar para pagar os ricos procuradores da República?
As críticas à PEC, no entanto, continuaram. Assim como fez a Associação dos Juízes Federais na sextafeira, a Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais se manifestou contra a proposta, que classificou de “retrocesso”.
MEIRELLES: SEM PEC, MEDIDAS ‘MUITO PIORES’
Em Nova York, onde se reuniu com investidores, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, defendeu a PEC afirmando que a falta de um teto para os gastos públicos levaria a medidas “mais sérias e muito piores” para o país. Ele disse que não vai elevar impostos em 2017, mas que nada impede que essa medida seja implementada no futuro.
— Se não aprovar o teto, aí sim, terão que ser contempladas outras possibilidades, todas muito mais sérias e muito piores para o país. O teto é uma excelente solução para o país neste momento — disse o ministro.
Meirelles admitiu que, com o teto de gastos públicos em vigor, há a possibilidade de o salário mínimo não ter aumento real caso o governo estoure o Orçamento. Isso afetaria a vida de 48 milhões de pessoas. Colaborou Barbara Marcolini, especial para O GLOBO Deputados e senadores podem perder aposentadoria especial, na página 20
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