Líderes populistas iliberais desenvolveram um sofisticado método para transformar defeitos em qualidades, Fake News em liberdade de opinião e “verdades alternativas”. E com isso, mobilizar as respectivas “bolhas” sem compromisso com a verdade, a ciência e a realidade. O livro reconstrói a história desde a ascensão súbita e surpreendente do comediante Beppe Grillo e seu Movimento 5 Estrelas na Itália, em 2014, com o apoio de empresa especializada em redes digitais, até o escândalo da Cambridge Analytica e a manipulação dos algoritmos nas experiências vitoriosas de Boris Johson no Brexit do Reino Unido e de Donald Trump em 2016, se disseminando pelo mundo, a parti daí. Atores como Steve Bannon, ex-estrategista-chefe da Casa Branca e conselheiro sênior do Presidente Trump, já estavam presentes na Itália em 2014.
Os graves eventos de 8 de janeiro no Brasil,
que afrontaram as instituições republicanas e democráticas, a recente onda de
massacres em escolas, a automutilação induzida de jovens, a disseminação do
neonazismo e abusos de poder e o papel destacado em todos esses eventos das
plataformas digitais, colocaram na ordem do dia a sua regulação pública.
Diante disto, o Congresso Nacional resolveu
tomar as rédeas do assunto através da discussão do PL 2630/2020 de autoria do
senador Alessandro Vieira (PSDB/SE), relatado na Câmara dos Deputados pelo
deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), que tem promovido amplo debate com todas as
bancadas e, bem assessorado, evitado “reinventar a roda”, inspirando-se no que
há de melhor e mais avançado no mundo com base nas experiências da Europa,
Austrália e EUA. Nunca gostei do expediente da urgência, onde o Projeto de Lei
vai direto ao Plenário. O melhor caminho, dada a urgência do tema e para evitar
manobras protelatórias, seria formar uma Comissão Especial. O impasse levou ao
adiamento da votação esta semana.
O apelido ganho já induz ao equívoco pois
não se trata de um “PL das Fake News”, mas sim, de regulação das plataformas
digitais. O substitutivo proposto se baseia no tripé liberdade,
responsabilidade e transparência. Cuida da responsabilização das plataformas
por danos, das notificações pela moderação de conteúdo, da identificação da
publicidade, estabelece regras de transparência, caracteriza o que são temas
previamente proibidos por agredirem a ordem constitucional, prevê remuneração
de conteúdo jornalístico, defende o direito autoral, estabelece o consentimento
do usuário para sua inclusão em grupos e listas de transmissão, entre outros
importantes avanços.
Remanescem aspectos polêmicos como qual
órgão público irá regular (Ministério Público, Poder Executivo, ANATEL) e a
figura da “imunidade parlamentar”, possibilitando os detentores de mandato
produzirem “Fake News”.
Mas as divergências sobreviventes não devem
impedir a aprovação da Lei, devem ser resolvidas. A democracia está em jogo e a
regulação das plataformas digitais se tornou uma necessidade urgente e
inevitável.
*Marcus Pestana, economista, ex-deputado
federal (PSDB-MG)
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