Folha de S. Paulo
Memória do Holocausto vai se tornando menos
vívida e massacre de palestinos é terrivelmente presente
Israelenses estão com um problema de relações
públicas.
Você, leitor, já ouviu falar nas Vésperas
Efésias? Em 88 a.C., o imperador Mitrídates 6º, do Ponto, ordenou o assassinato
de cidadãos romanos e aliados que viviam em cidades da Ásia Menor. Nem mulheres
e crianças teriam sido poupadas. Estima-se que entre 80 mil e 150 mil morreram.
Imagino que esse massacre, um dos muitos da história, não o comova muito. Ele ocorreu há mais de 2.000 anos e, por alguma razão, descontamos o passado. Somos quase imunes às carnificinas muito antigas, nos importamos moderadamente com hemoclismos recentes e reagimos com vívida emoção aos massacres presentes. Está na programação de nossas mentes, ainda que a diferença temporal seja difícil de explicar filosoficamente. Por que a morte de uma pessoa há 2.000 anos valeria menos que a de uma morta há 80 anos?
O problema de Israel é
que o tempo está passando. Foi sob o impacto do Holocausto nazista que a ONU
aprovou, em 1947, o plano de partilha da Palestina que viabilizou o Estado
judeu. Mas a memória viva do Holocausto, que ainda chegou à minha geração através das
histórias de meus avós e tios-avós, vai aos poucos se apagando. Os registros
históricos sempre podem ser consultados, mas o aspecto afetivo
desaparece. Reportagem recente do New York Times mostra que é
crescente o número de jovens judeus americanos que se identificam com a causa
palestina.
Faz sentido. As histórias de injustiças
cometidas contra palestinos estão ocorrendo ao vivo e numa era de hiperconexão.
E quanto mais mortos as operações militares israelenses deixarem em Gaza, mais
esse efeito se materializará. Ainda que não haja paralelo entre o que fizeram
os nazistas e o que fazem os israelenses, civis palestinos estão morrendo aos
borbotões.
Que a carnificina em Gaza sirva ao menos para viabilizar o Estado palestino. Sem ele, Israel jamais encontrará uma paz sustentável.
2 comentários:
PERFEITO!!
Verdade.
Postar um comentário