O Estado de S. Paulo
O cenário para a inflação piorou e isso
justifica o tom mais duro da autoridade monetária
O Banco Central fez o certo ontem e endureceu
o discurso diante de um quadro para a inflação que piora por vários lados.
Ainda assim, uma alta da Selic em setembro não é o mais provável, e a
estratégia foi ganhar tempo, para ver se o cenário externo se torna mais
favorável e se o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, consegue impor dentro do
governo uma agenda efetiva de cortes de gastos.
Antes da próxima reunião do Copom, a equipe econômica terá de enviar o Orçamento de 2025, e esse será um novo marco na relação de confiança entre o mercado e a política fiscal.
O fato é que o cenário para a inflação piorou
nas últimas semanas, e isso justifica o tom mais duro adotado pela autoridade
monetária. O dólar está mais alto, as expectativas deram um salto, e os preços
correntes, que vinham melhores do que o esperado, surpreenderam negativamente.
Lá fora, houve a boa notícia do Fed, que deu um sinal forte de que está próximo
de cortar os juros. Mas, para azar do Brasil, o BC do Japão subiu a taxa e
passou a atrair recursos que viriam para países emergentes. O resultado é que o
real mal se mexeu e se manteve na casa de R$ 5,65.
Um dos dados mais importantes do dia foi
comunicado pelo IBGE. A Pnad mostrou um panorama altamente favorável para o
mercado de trabalho, que é para onde todos os indicadores relevantes da
economia convergem. A despeito dos ataques de Lula ao BC e dos juros reais
elevados, a taxa de desemprego caiu para 6,9% no trimestre encerrado em junho,
o menor número em dez anos; a população ocupada bateu recorde, a massa de
rendimentos, também; e os salários reais voltaram a crescer. Ainda que isso
signifique pressão inflacionária para o BC, o PT não tem do que reclamar.
É verdade que o Bolsa Família diminuiu a taxa
de participação no mercado de trabalho, que ficou em 62,1% em junho, contra
63,7% em junho de 2019, antes da pandemia. Isso significa que cerca de 1,6
milhão de brasileiros estão optando por não trabalhar ou procurar emprego. Mas,
como mostrou o economista Pedro Nery, em seu livro Extremos - Um mapa para
entender as desigualdades no Brasil, é alta a probabilidade de que essas
pessoas estejam fugindo dos subempregos ou simplesmente tendo a oportunidade de
ficar em casa para cuidar dos seus filhos. No melhor cenário, eles voltarão
mais qualificados ao mercado.
Mesmo com todos os ruídos, o Banco Central tem feito um trabalho técnico de controlar a inflação. Se for obrigado a subir os juros à frente, o País não vai acabar. Ao governo federal, cabe acelerar a agenda de corte de gastos e evitar esse pior cenário.
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