A boataria sobre o fim do Bolsa Família foi um jabuti com jeito, cor e cheiro eleitoral, prenúncio de luta política renhida. Para conter o fogo, a PF precisa descobrir de onde ele veio
Chegamos ao fim de maio com o vento soprando na mesma direção, a de uma disputa precoce e acirrada em 2014, trazendo uma importante definição e algumas oscilações. A primeira, no campo da oposição. O PSDB logrou rara unidade em sua convenção e fincou a candidatura de Aécio Neves. Na seara governista, os últimos e imprecisos sinais emitidos pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, alimentaram especulações (e desejos) sobre um recuo em sua candidatura. Para o povo, sobrou a boataria bizarra do final de semana sobre o fim do Bolsa Família. Um jabuti que tem jeito, cor e cheiro eleitoral, prenunciando luta renhida.
Vejamos, até onde a vista alcança, cada um desses movimentos.
As três metas de Aécio
Começam a ser veiculadas hoje as inserções da propaganda partidária semestral do PSDB, que terminam com o programa de 20 minutos no dia 30. Aécio é o protagonista desta janela televisiva que o ajudará a tornar-se mais conhecido. As peças buscam atender à insistente recomendação do ex-presidente Fernando Henrique para que o PSDB busque o diálogo direto com a população.
Agora, Aécio vai se concentrar em três tarefas, diz o deputado Marcus Pestana, presidente do PMDB mineiro. A primeira, fortalecer a comunicação tucana por todos os meios e mídias, e por meio das viagens que ele fará pelo Brasil, para encontros diretos com a sociedade. Algo como as caravanas de Lula, embora evitem a palavra.
Na superestrutura política, ele vai acelerar os contatos com outros partidos com vistas à futura coligação, começando por DEM, o PPS e o PMN, que formarão a nova MB. A terceira tarefa será a elaboração do programa de governo, montando uma equipe que não se restringirá aos economistas do Plano Real, com os quais já dialoga.
De fato, a executiva montada por Aécio é mais orgânica e representa todo o mosaico tucano, inclusive o serrismo. Indo à convenção, Serra indicou que fica no partido, mas seu discurso ainda foi um tanto ambivalente. Por exemplo, ao dizer e repetir que se empenhará pela “unidade das oposições”, sem se referir claramente à candidatura de Aécio. Pestana contesta a dúvida. “O gesto de ir à convenção tem um significado indiscutível. Agora, precisamos respeitar seu momento e sua dinâmica de inserção no projeto”. Se for assim, está resolvido.
A esfinge nordestina
O ex-deputado Fernando Lyra, recentemente falecido, afora a argúcia política, era dotado de fino humor. Difundia no Congresso apelidos “populares” dos políticos pernambucanos que ele mesmo teria criado. Miguel Arraes, o avô de Eduardo Campos, era “a esfinge do sertão”. Lacônico, fumando seu charuto, era indecifrável. O neto é mais falante, mas também esfíngico. Depois de ter assustado e irritado o PT com sua saliência eleitoral, refluiu, nas últimas semanas, reduzindo a exposição e baixando o tom das críticas ao Governo Federal. A amabilidade com que ele e a presidente Dilma Rousseff se trataram ontem em Recife reforçou em alguns a percepção de que ele estaria recuando.
A inflexão, vinda de alguém tão reservado, pode traduzir apenas uma freada de arrumação, que, segundo interlocutores que torcem pela candidatura, ele teria resolvido fazer agora para preservar a imagem, o governo do estado e o partido. Lá adiante, retomaria a velocidade anterior.
A quem interessa?
Nos dia atuais, com Internet e redes sociais, a propagação de um boato é como a do fogo em nossos gramados durante a seca. Basta um palito de fósforo. Quem deu início ao boato sobre o fim do Bolsa Família tinha algum objetivo, que suscita diferentes leituras. Alguns dirão que a corrida mostrou a importância do programa, outros que revelou a extensão da dependência criada pelo Governo. Outros, ainda, que a pobreza continua grande, apesar do bumbo governista sobre sua redução. Mas brincar com a miséria alheia é mesmo criminoso e cruel, como disse a presidente. Precipitou-se a ministra dos Direitos humanos ao apontar o dedo para a oposição, desculpando-se a seguir. Para conter o fogo político em torno do assunto, a Polícia Federal precisa esclarecer o caso. Algo já se sabe. As consultas ao Google sobre Bolsa Família começaram a pipocar anormalmente no sábado, a partir dos estados do Nordeste.
Data vênia
Com todas as vênias ao ministro Joaquim Barbosa, o Congresso legisla, sim. É verdade que as MPs do Executivo conturbam a pauta, mas elas estão na Constituição. Ainda agora, diversos projetos relevantes, de iniciativa congressual, foram aprovados ou entraram em pauta. Exemplos: a emenda das domésticas (Benedita da Silva) e seu complemento, o projeto do senador e hoje ministro Marcelo Crivela, impedindo a demissão na gravidez; a lei anti drogas de Osmar Terra, a lei sobre emancipações municipais, o projeto sobre a taxa de serviços para os garçons e o da divisão dos recursos do FPE, para atender ao STF, entre outros tantos.
Fonte: Correio Braziliense
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