quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Maria Cristina Fernandes - Sucessão das mesas será mais longa e arriscada

Valor Econômico

Quanto mais durar a disputa pelo comando do Congresso, mais desgaste os achados de Dino, CGU e TCU provocarão sobre seu colégio eleitoral

A reviravolta na disputa pela presidência da Câmara, com a desistência do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), segundo nome no comando da Mesa, é só um aperitivo. O que está em jogo é o comando daquela que se tornou a maior unidade orçamentária da República. A instabilidade é filha desse gigantismo.

A sucessão das mesas diretoras costuma ter início quando a eleição municipal termina. Os partidos contam os exércitos conquistados para a batalha das eleições legislativas dali a dois anos, olham para o tamanho em que ficou o chefe do Executivo do outro lado da praça, e fazem os acertos que resultam nas mesas diretoras.

A antecipação da sucessão foi antes uma demonstração de fragilidade do que de força do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ao fazê-lo, esperava se valer do poder, que se esvai a cada dia, sobre a pauta de votações. A abdicação de Pereira em favor do correligionário Hugo Motta (PB) está longe de ser hostil a Lira, mas desarranja o jogo.

A exposição ao sol por cinco meses não mina apenas nomes como o do deputado Elmar Nascimento (União-PB), o preferido de Lira. Qualquer nome lançado ao estrelato tem um encontro marcado com o desgaste. Não seria diferente com Hugo Motta.

Aos 34 anos, o deputado está no quarto mandato. Cursava medicina na Universidade Católica de Brasília quando estreou na Câmara. Terceira geração de sua família na política, tem currículo e prontuário para o cargo, além de trato mais cordato do que os dois presidentes da Casa de quem esteve mais próximo, Lira e Eduardo Cunha.

Pereira abdicou da candidatura a seu favor porque não foi capaz de demover Gilberto Kassab, presidente do PSD, de lançar o deputado Antonio Brito (BA), seu correligionário. Como esta era uma condição para o apoio de Lira, declinou da candidatura e lançou Motta, nome mais palatável para o presidente da Câmara porque tem mais trânsito na Casa do que Nascimento e, ao contrário deste, não tem veto do governo.

Não é porque o presidente da mesa diretora e o vice agora têm o mesmo candidato que a coisa está resolvida. A Pereira foi exigido que demovesse Kassab. A Hugo Motta a porta foi escancarada. O rol de cicatrizes avança para o entorno do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Marcos Pereira, presidente do seu partido, e Kassab, secretário todo-poderoso de seu governo, viraram este round em pé de guerra.

Motta já esteve com o presidente da República e com o ex. A ambos fez juras de independência, inclusive de seu legado como presidente da CPI da Petrobras, voto pela cassação de Dilma Rousseff e abstenção na de Cunha.

Kassab resistiu a pedidos tanto do presidente quanto do governador paulista para que retirasse a candidatura de Brito. Seja porque tem a esperança de conseguir o apoio do União a seu candidato, seja porque ainda espera atrair o Palácio do Planalto. A presença do líder do PL, Altineu Côrtes (RJ), na reunião em que Elmar foi comunicado por Lira da opção por Motta, não deixou dúvidas da adesão do PL ao novo candidato.

A candidatura Brito sempre foi uma peça de Kassab no equilíbrio de forças entre Câmara e Senado. O fim do mandato de Rodrigo Pacheco (MG) na mesa vai tirar o PSD, maior bancada do Senado, da presidência da Casa. Por outro lado, o ocaso de Elmar Nascimento retira das costas do presidente da CCJ do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), o incômodo de justificar a postulação de seu partido ao comando de ambas as Casas. Resta a Kassab continuar a jogar com o União para preservar os espaços de ambos os partidos.

É improvável que o Senado se mantenha blindado à reviravolta da Câmara. Numa única tarde, Pacheco marcou a sabatina de Gabriel Galípolo, indicado à presidência do Banco Central, e Alcolumbre resistiu à inclusão da PEC da autonomia administrativa do BC, a que o governo se opõe, na pauta da CCJ.

Os longos cinco meses até a sucessão das mesas aumentarão o poder de pressão dos parlamentares que compõem seu colégio eleitoral sobre os atuais presidentes das mesas. Para um presidente da República que encararia um Congresso com a faca nos dentes depois de uma eleição municipal em que não há grandes expectativas em relação ao desempenho do PT, a reviravolta pode não ser uma má notícia. A eleição de Hugo Motta, no mínimo, é um cenário menos ruim para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva do que a escolha de Elmar Nascimento.

Nenhum movimento, porém, impactará tanto os interesses do Executivo nesse jogo quanto aqueles do ministro do Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino. Na lista encomendada por Dino à Controladoria-Geral da União com os municípios mais beneficiados, por habitante, com emendas parlamentares, aqueles do Amapá pontificam.

Do Tribunal de Contas da União, o ministro recebeu a lista de processos que lá tramitam e os repassou à Procuradoria-Geral da República. Lá pontifica não apenas o desvio do kit-robótica em Alagoas, que foi arquivado mas pode ser reaberto, quando processos de aliados do presidente da Câmara.

O acordo dos Três Poderes em torno das emendas será avalizado por Pacheco e Lira e restará aos sucessores administrá-lo. Quanto mais alongada a campanha sucessória nas mesas diretoras do Congresso, porém, mais desgaste os achados de Dino, CGU e TCU arriscam provocar sobre seu colégio eleitoral.

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom! Será que vão incomodar de novo o Anão Lira com o seu brinquedinho de kit-robótica superfaturado? Tomara...

ADEMAR AMANCIO disse...

Lendo e tentando entender essa barafunda,rs.