Avisem a Bolsonaro que ele está atrasado
O
presidente Jair Bolsonaro usou os acontecimentos espantosos dos Estados Unidos
que chocaram o mundo para voltar a desacreditar o sistema eleitoral brasileiro.
E sem apresentar provas do que disse, assim como fez Donald Trump.
Vociferou:
“Aqui no Brasil, se tivermos o voto eletrônico em 2022, vai ser a mesma coisa.
A fraude existe. Aí a imprensa vai falar: ‘sem provas, diz que a fraude
existe’. Eu não vou responder esses canalhas da imprensa mais, tá certo?”
Não
parou por aí. E não poderia ser mais explicitamente ameaçador do que foi: “Se
nós não tivermos o voto impresso em 2022, uma maneira de auditar o voto, nós
vamos ter um problema pior que os Estados Unidos”.
Antes
de saber que, pressionado, Trump criticara os manifestantes que incitados por
ele invadiram o prédio do Congresso americano, Bolsonaro havia justificado
assim o que por lá aconteceu:
–
O pessoal tem que analisar o que aconteceu nas eleições americanas agora.
Basicamente, qual foi o problema, a causa dessa crise toda? Falta de confiança
no voto. Lá o pessoal votou e potencializaram o voto pelos correios por causa
da tal da pandemia e houve gente que votou três, quatros vezes. Mortos votaram.
Foi uma festa lá. Ninguém pode negar isso daí.
Em troca, engoliu calado às censuras veladas de três ministros do Supremo Tribunal Federal. Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, declarou que o processo eletrônico nunca apresentou qualquer evidência ou indícios de fraudes registradas no tempo do voto em cédula.
O
ministro Edson Luís Fachin, que comandará o tribunal durante as eleições de
2022, foi direto ao ponto ao afirmar que “a violência cometida contra o
Congresso norte-americano deve colocar em alerta a democracia brasileira”.
E advertiu sem rodeios:
–
Quem desestabiliza a renovação do poder ou que falsamente confronte a
integridade das eleições deve ser responsabilizado em um processo público e
transparente. A democracia não tem lugar para os que dela abusam.
Escreveu
o ministro Gilmar Mendes no Twitter:
–
A invasão do Capitólio norte-americano revela as graves consequências do
sectarismo político odioso. O episódio reforça a importância de uma Justiça
Eleitoral altiva. Notícias falsas e milícias digitais não apenas corroem a
democracia: elas colocam em risco a vida humana.
Portanto,
não será por falta de avisos que Bolsonaro poderá se dar mal se tentar replicar
aqui o que deu errado nos Estados Unidos.
O dia em que Jair Bolsonaro e Donald Trump se renderam
Quem
planta colhe
Cada
um e suas circunstâncias, Jair Bolsonaro e Donald Trump viveram ontem o seu dia
de rendição.
O
presidente brasileiro rendeu-se à compra da vacina chinesa patrocinada pelo
governador João Doria (PSDB), de São Paulo.
O
presidente americano, às pressões para que condenasse a invasão estimulada por
ele do prédio do Congresso.
Bolsonaro
elegeu Doria como seu principal adversário na eleição do ano que vem. Faltam
apenas 89 semanas.
E
desde então não perde uma chance de atacá-lo. Se Doria diz uma coisa, ele diz o
oposto. Se faz uma coisa, ele faz o inverso.
Foi
assim ao longo da pandemia nos seus piores momentos. É assim na hora de tentar
sair dela.
Doria
largou na frente em busca de uma vacina. Encontrou a chinesa e o Instituto
Butantã começou a produzi-la.
Quando
viu que perdera a corrida da vacina, Bolsonaro autorizou o ministro da Saúde a
anunciar que também a compraria.
Feito
o anúncio, arrependeu-se e obrigou o ministro a dar o dito pelo não dito. O
ministro foi humilhado e deixou-se humilhar.
Finalmente
ontem, uma vez que tão cedo poderá contar com outras vacinas, Bolsonaro bateu
às portas do Butantã.
O
governo paulista está com quase tudo pronto para começar a vacinar em massa a
partir do final deste mês.
O
governo federal espera começar a vacinação, se possível, alguns dias antes.
Briga pela primeira foto de um brasileiro vacinado.
Desde
novembro, quando foi derrotado pelo candidato democrata Joe Biden, Trump travou
a batalha perdida para anular a eleição.
Se
há 4 anos jamais passara pela cabeça dele que poderia vencer, desta vez nem em
sonho admitiu que perderia.
Fracassaram
na justiça todas as tentativas de anular a eleição. Foram meses de mentiras
diárias e de ausência de provas.
O
que lhe restava fazer, ele fez anteontem: reuniu 30 mil adeptos em Washington e
incentivou-os a marchar sobre o Congresso.
A
invasão a um dos símbolos da democracia americana resultou em 4 mortos, dezenas
de feridos e alguns presos.
Diante
do cataclismo que isso provocou dentro e fora dos Estados Unidos e do risco de
ser processado, Trump falou fino.
Mandou
a sua porta-voz condenar duramente os vândalos, chamados por Biden de
“terroristas domésticos”.
E
gravou um vídeo onde se disse ultrajado pelas cenas de violência que deixou o
mundo de boca aberta. Teve o cinismo de afirmar:
–
Os manifestantes que invadiram o Capitólio violaram o seio da democracia
americana. Não representam nosso país. Irão pagar.
Podem
não representar o país, mas parte dele representa, sim, justamente a parte que
votou em Trump e ainda o apoia.
Curioso
é que o recuo de Trump deixou Bolsonaro na mão. Bolsonaro foi o único chefe de
Estado a dar razão a Trump.
No dia da rendição dos dois, o Brasil ultrapassou a marca dos 200 mil mortos pelo vírus. E, em 24 horas, nos Estados Unidos, o vírus matou mais 4 mil pessoas.
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