Revista Veja
O governador vem perdendo terreno dentro do partido e chega a um mês do encontro marcado para 21 de novembro próximo à condição de quase azarão
Favorito absoluto quando o PSDB marcou a
realização de consulta prévia para escolher o candidato à Presidência da
República, o governador de São Paulo, João Doria, vem perdendo terreno dentro
do partido e chega a um mês do encontro marcado para 21 de novembro próximo à
condição de quase azarão.
Trocou de posição com o governador do Rio
Grande do Sul, Eduardo Leite, um novato cuja projeção até outro dia era
restrita ao âmbito regional e que entrou na disputa sob o signo do descrédito.
No momento, Leite desponta como predileto. Menos por seus méritos, ainda
desconhecidos, e mais pela antipatia que Doria atrai para si. Justa ou
injustamente, não é essa a questão.
O governador de São Paulo tem “entregas” inequívocas e reconhecidas. Dispõe de bom mostruário do ponto de vista da administração do estado e por isso sua gestão é bem avaliada. Foi muito diligente na contratação e produção da vacina CoronaVac, tendo, assim, dado início à imunização no país e obrigado o governo federal a sair do imobilismo negacionista.
Além disso, João Doria tem o atributo
essencial da vontade que vem demonstrando ao se colocar como postulante ao
Planalto sem titubeios ou dissimulações. Um ativo considerável, que pela lógica
deveria repercutir nos índices de intenção de votos para presidente em 2022
atraindo apoios num universo político ora ansioso pela busca de alternativas à
dicotomia Jair Bolsonaro/Luiz Inácio da Silva, e carente de opções factíveis.
Mas não é o que acontece, ao contrário. O
índice “nanico” nas pesquisas (de 4% a 5%) não é determinante a essa altura dos
acontecimentos. Há muita água a rolar daqui até o início efetivo da campanha, a
eleição ainda é assunto de políticos e jornalistas, o brasileiro não está
mobilizado para a disputa. A pandemia, a inflação, o desemprego, a volta da
carestia são as questões centrais.
“Dono de forte ‘capital’, o governador
perde terreno para o novato Leite dentro e fora do PSDB”
São argumentos usados por Doria para
explicar a razão de não ter deslanchado. Verdadeiras, tais alegações poderiam
até relegar as pesquisas a uma condição de irrelevância temporária, não fosse
um fator decisivo na construção de uma candidatura presidencial: João Doria não
agrega ou, por outra, desagrega quando seu nome é posto na mesa das
articulações político-partidárias. Isso dentro e fora do PSDB.
Em tese, a escolha interna do candidato e
as negociações com outras legendas seriam duas etapas distintas, mas no caso
elas se misturam e influenciam uma à outra. No ambiente intramuros do tucanato,
os dirigentes das bancadas parlamentares federais e a velha guarda, os
“pais-fundadores” do partido, atuam na prévia marcada para novembro de olho no
momento seguinte: o da viabilização de uma candidatura ou da formação de
alianças com a possibilidade de ceder a cabeça da chapa.
Aqui residem pontos cruciais desfavoráveis
a João Doria. De saída, sabe-se que ele não desistiria, se necessário, em prol
de outro nome mais bem posicionado na cena, enquanto Eduardo Leite já sinalizou
positivamente nessa direção.
Devido à inflexibilidade e ao que é visto
como gosto pelo atrito por parte do paulista (“não precisamos de um galo de
briga”), partidos como o PSD, o União Brasil (produto da fusão DEM/PSL), MDB e
Solidariedade, considerando os já sondados, informaram à cúpula do PSDB que com
Doria no páreo não haverá jogo.
Internamente, a situação é bem complicada
para ele. São Paulo tem o maior poder no colégio da prévia, 26% dos votos.
Ocorre que o diretório regional não está fechado com o governador, contra quem
atua gente como José Serra e Geraldo Alckmin, ambos ex-governadores e com
influência junto a prefeitos, vereadores e deputados. No restante do país,
Eduardo Leite obteve compromisso do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina,
Minas Gerais, Bahia, Pernambuco e Ceará, de onde uma figura de peso como o
senador Tasso Jereissati se empenha pela vitória do gaúcho.
Significa que a parada está perdida para
Doria? De jeito nenhum. O governador de São Paulo tem recursos para, digamos,
estancar a sangria. Trabalha nisso, ciente de estar diante de um desafio
inimaginável para quem, dizendo-se “filho das prévias”, imaginava-se imbatível.
A realidade mostrou-se adversa a João
Doria, que disso, aliás, deu notícia quando “piscou” ao tentar fugir do
primeiro debate e ao questionar a lisura do processo digital de votação.
Publicado em VEJA de 27 de outubro de
2021, edição nº 2761
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