Correio Braziliense
Bolsonaro foi aconselhado a recuar para não
ser preso. Esses conselhos também vieram de ministros do Supremo, de generais
legalistas e do governo dos Estados Unidos
Alguém já disse que a história se repete como
farsa ou como tragédia. No caso da tentativa de destituição do presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, em 8 de janeiro de 2023, uma semana após a posse, poderia
ter sido uma tragédia, com a implantação de uma ditadura militar que
enfrentaria grande resistência e, para se impor, teria que fazer como os
militares argentinos, em 1976, quando o general Jorge Rafael Videla, o
almirante Emílio Eduardo Massera e o brigadeiro Orlando Ramón Agosti tomaram o
poder e dissolveram o Congresso. Bolsonaro teria que promover uma repressão
ainda mais brutal e intensa do que a que ocorreu no Estado Novo e durante o
regime militar implantado após o golpe de 1964, que completará 60 anos no
próximo dia 31.
Ainda bem, o golpe de 8 de janeiro está mais para uma farsa, um Plano Cohen frustrado. Segundo os depoimentos dos comandantes das Forças Armadas à Polícia Federal — cujo teor integral foi liberado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes —, após as eleições de 2022, Bolsonaro chamou a cúpula militar para reuniões que articulariam um golpe de Estado. O ex-comandante do Exército Freire Gomes disse que o próprio ex-presidente apresentou uma minuta golpista e discutiu seu teor em duas reuniões. O da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, confirmou. Ambos não embarcaram na aventura. O ex-comandante da Marinha Almir Garnier, que ficou calado em seu depoimento, assim como o ex-presidente Jair Bolsonaro, supostamente, só não moveu suas tropas porque seu comandante supremo não deu a ordem.
A tese de que as eleições de 2022 foram
fraudadas, que ainda é acalentada por corações e mentes bolsonaristas, e os
malabarismos jurídicos do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, ao estilo de
Francisco Campos, principal autor da Polaca, a Constituição fascista do Estado
Novo, nunca ganharam o apoio do mundo político, escaldado pelo que ocorreu após
o golpe de 1964, nem do alto comando das Forças Armadas. Bolsonaro foi
aconselhado a recuar para não ser preso. Esses conselhos também vieram do
Supremo Tribunal Federal, dos generais legalistas e do governo de Joe Biden. A
ala política do próprio governo trabalhou contra o golpe.
Plano Cohen
E o Plano Cohen? O Governo Constitucional
(1934-1937) de Getúlio Vargas já tinha viés autoritário e enfrentava grande
oposição. As pressões partiam da Ação Integralista Brasileira, de inspiração
fascista, e da Aliança Nacional Libertadora, frente antifascista que cada vez
mais era controlada por comunistas. Antigos aliados de Vargas denunciavam seus
planos continuístas, como o governador do Rio Grande do Sul, Flores da Cunha
Em novembro de 1935, a Aliança Nacional
Libertadora, liderada por ex-capitão Luís Carlos Prestes, que havia aderido ao
comunismo, tentou tomar o poder, episódio conhecido como Intentona Comunista.
Vargas obteve a justificativa para reformar a Lei de Segurança Nacional, que
havia sido criada em 4 de abril de 1935, e modificar a Constituição de 1934.
Impôs o Estado de Sítio e o Tribunal de Segurança Nacional (TSN). Milhares de
oposicionistas foram presos, entre eles, muitos militares que integraram o movimento
tenentista.
Na mesma época, as campanhas para as eleições
de 1938 já estavam nas ruas, com o ex-governador de São Paulo Armando Sales
concorrendo como candidato da oposição, contra José Américo de Almeida, um
candidato laranja do governo. Parecia o retorno à normalidade, mas era tudo
fake. Em 1937, quando o Estado de Guerra foi suspenso, José Macedo Soares,
ministro da Justiça há apenas quatro dias, repentinamente, ordenou a imediata
libertação de 300 presos políticos, que se encontravam detidos sem processo
formado, muitos militares.
A libertação dos presos políticos ficou
conhecida como a “Macedada” e se prolongou até setembro, apesar dos protestos
de Filinto Müller e dos integralistas. Era tudo encenação para justificar o
golpe, que seria mais difícil de se justificar com os militares presos. A
maioria, inclusive, foi lutar na Guerra Civil Espanhola, nas Brigadas
Internacionais. Entretanto, os confrontos entre grupos de esquerda e de direita
voltaram a acontecer, alguns com mortes. Pedro Ernesto, ex-prefeito do Distrito
Federal, preso em abril de 1936, fora libertado no dia 14 de setembro. Livre,
faria violento discurso contra o governo federal, ao declarar apoio à
candidatura do governador paulista Armando de Sales Oliveira à Presidência da
República. Um mês depois seria novamente preso — dessa vez, na companhia do
filho.
Em 30 de setembro de 1937, o governo anunciou a descoberta do Plano Cohen, um suposto projeto comunista para promover novas insurreições e tomar o poder no Brasil. O texto era completamente falso, mas serviu de justificativa para o retorno do Estado de Guerra, em 1º de outubro, e novas perseguições e prisões políticas. O golpe continuísta de Vargas, em 10 de novembro de 1937, criaria o Estado Novo, nome copiado da ditadura de António de Oliveira Salazar (1933-1974) em Portugal. Estava anunciado em artigos na imprensa desde meados de 1936, como os de Bolsonaro, nas redes sociais, desde setembro de 2021.
Um comentário:
Pois é,antes de 1937 o governo Vargas já prendiam a torto e direito,Graciliano Ramos e Mário Lago que o digam,os dois foram presos em 1936.
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