sábado, 6 de dezembro de 2025

Ex-presidente tenta manter controle da direita diante de racha públicos na família, por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Anúncio vem na esteira de movimento de independência de Michelle Bolsonaro

Candidatura do senador não agrada ao centrão e dificultaria vitória sobre Lula, mas poderia engajar militância bolsonarista

Três hipóteses podem explicar o anúncio do senador Flávio Bolsonaro (PL) como o indicado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para a corrida presidencial de 2026.

A primeira delas, mais certeira, diz respeito à tentativa de Bolsonaro de manter sua influência e controle sobre a direita mesmo da prisão.

O anúncio desta sexta-feira (5) vem em um momento em que se escancaram os rachas no grupo —desde os ataques do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) até a união dos filhos do ex-presidente contra a madrasta, Michelle Bolsonaro (PL).

Nesse sentido, a indicação de Flávio é um recado para mostrar quem manda e um direcionamento para unir a direita sob a tutela de Bolsonaro.

Chama a atenção que o movimento do ex-presidente ocorra na semana em que Michelle tenha projetado sua independência como liderança política.

Ao reprovar publicamente a costura de uma aliança com o ex-ministro Ciro Gomes no Ceará, a ex-primeira dama agiu em desacordo com orientação do partido, que tinha o aval do próprio Bolsonaro.

Michelle não voltou atrás e, no fim, foi Flávio quem anunciou suas desculpas. O PL também suspendeu o acordo, colocando panos quentes no episódio. Integrantes da legenda avaliaram que a militância ficou ao lado da ex-primeira-dama.

Bolsonaro tem pouco a ganhar repreendendo Michelle publicamente ou rompendo com ela, considerando sua grande popularidade com o eleitorado de direita.

Assim, a escolha de Flávio pode ser uma tentativa velada de colocar uma pedra sobre as ambições da mulher, que chegou a ser cotada para a chapa presidencial.

Ainda que não tenha fritado Michelle —pois isso poderia significar fritar a si próprio—, Bolsonaro empodera Flávio num momento crítico e unge o filho, extensão de si mesmo, como seu sucessor.

As outras duas hipóteses para o anúncio desta sexta não excluem a primeira. Em uma delas, o ex-presidente está de fato disposto a bancar a candidatura de Flávio até o final.

Em um cenário de segundo turno contra o presidente Lula (PT), o senador vai pior do que Tarcísio, Michelle e o governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), segundo pesquisa Datafolha publicada em agosto. O petista marcava 48%, contra 37% de Flávio.

Levantamento da Quaest de setembro mostrou que apenas 1% dos entrevistados citava o senador como a figura que deveria substituir Bolsonaro.

Seguindo esta hipótese, os números indicam que o ex-presidente estaria disposto a rifar a eleição presidencial em troca da manutenção do capital político com o clã.

Alguns parlamentares do PL também avaliam que a candidatura de Flávio poderia engajar mais a militância do que outra mais ao centro.

Com mais apelo na chapa, segundo esta leitura, o partido poderia eleger uma bancada maior para o Senado, hoje o grande objetivo da família Bolsonaro e da legenda. Esses senadores levariam adiante a defesa do impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal e a anistia para o ex-presidente e condenados no 8 de janeiro.

A candidatura de Flávio, porém, não agrada ao centrão. Segundo um líder partidário, o senador não une o centro e deve ficar isolado. Não se descarta que outras candidaturas de direita sejam lançadas neste caso. A Presidência para o filho de Bolsonaro ficaria ainda mais distante.

A última hipótese é de que o anúncio do ex-presidente seja somente um recado ou um blefe. Parlamentares não têm certeza de que Bolsonaro vá mesmo bancar a indicação de Flávio.

Primeiro, porque o ex-presidente é instável. Segundo, porque aliados avaliam que o senador está na mira do Supremo. Ao decretar a prisão preventiva de Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes citou Flávio expressamente.

O magistrado afirmou que a vigília convocada por ele foi um indicativo de "repetição do modus operandi da organização criminosa liderada pelo referido réu [Jair Bolsonaro]", e que o vídeo publicado pelo senador para convocar o ato "incita o desrespeito ao texto constitucional, à decisão judicial e às próprias instituições, demonstrando que não há limites da organização criminosa na tentativa de causar caos social e conflitos no país".

A avaliação no mundo político é de que Flávio tem teto de vidro e que, se for mesmo candidato, um passo em falso pode custar caro.

Crente de perseguição judicial contra sua família, não é certo que Bolsonaro esteja disposto a arriscar o futuro do filho, que já se livrou de ser julgado no caso do suposto esquema de "rachadinha" em seu gabinete quando deputado estadual.

 

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