Déficit do INSS sobe 23%, a R$ 27 bi no 1º semestre, e analistas alertam para risco sistêmico
BRASÍLIA - Ao se esquivar de realizar uma ampla reforma da Previdência Social, optando por adotar apenas medidas pontuais para enfrentar o aumento do déficit no regime de aposentadorias no Brasil, o governo corre o risco de jogar pela janela os avanços realizados nessa área nos últimos anos. A avaliação é de especialistas e integrantes do Executivo ouvidos pelo GLOBO. Dados exclusivos mostram que, no primeiro semestre deste ano, o rombo do INSS subiu 23% e atingiu R$ 27,348 bilhões, contra R$ 22,229 bilhões no mesmo período de 2012, já descontada a inflação. Enquanto a arrecadação subiu 3,8% no período, a despesa com o pagamento de benefícios cresceu num ritmo mais forte, de 6,5%.
Os especialistas argumentam que, mesmo com essa deterioração, o governo não se preocupou nem em poupar a Previdência do recente corte de R$ 10 bilhões feito no Orçamento para dar mais credibilidade à política fiscal. No número, a equipe econômica incluiu R$ 4,4 bilhões que seriam repassados ao INSS para cobrir o programa de desoneração da folha de pagamentos das empresas.
Pensões e auxílios pesam mais
Segundo a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, o valor do repasse à Previdência foi reavaliado, pois o impacto das desonerações está menor em 2013 do que se esperava. No entanto, há quem diga que, na verdade, o que ocorreu foi apenas uma manobra para adiar o montante que o Tesouro deveria repassar ao INSS, e deixar mais dinheiro no caixa para o cumprimento do superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) este ano.
Entre as despesas que mais pressionam o regime de aposentadoria estão os gastos com pensões, aposentadorias por invalidez e auxílios-doença continuados. Só para se ter uma ideia, as despesas com pensões (o Brasil é um dos poucos países do mundo que pagam o benefício vitalício e integral, independentemente da idade da viúva e do número de filhos), saíram de R$ 41,139 bilhões em 2003 para R$ 74,592 bilhões no ano passado. Entre janeiro e junho, já somam R$ 41,369 bilhões, só no regime geral (INSS).
Técnicos do governo chegaram a elaborar uma proposta para mexer nas regras da pensão, mas o projeto acabou engavetado. As normas da Previdência determinam que o governo avalie periodicamente, a cada dois anos, os benefícios por invalidez e os auxílios-doença continuados e desenvolva políticas de reabilitação para inserir no mercado quem tem condições de trabalhar. Porém, um técnico do governo admite:
- Se o governo quiser, há gordura para queimar - afirmou o técnico.
Os gastos com auxílio-doença passaram de R$ 11,531 bilhões para R$ 18,639 bilhões nos últimos nove anos, e encerraram o semestre em R$ 10,763 bilhões. Já as aposentadorias concedidas por invalidez (doença ou acidente de trabalho) cresceram de R$ 18,325 bilhões para R$ 36,492 bilhões entre 2003 e 2012, atingindo R$ 20,196 bilhões no primeiro semestre deste ano.
Oportunidade perdida
Para os especialistas em Previdência, o governo do PT perdeu a chance de fazer uma reforma quando a economia estava crescendo e agora se defronta com os efeitos da estagnação. Eles alegam que a principal iniciativa foi a reforma de 2003, mas que foi restrita ao regime de aposentadoria dos servidores públicos. A criação do fundo de pensão para os funcionários também foi importante, mas o INSS tende a ser a fonte de problemas de agora em diante, avaliam.
O economista Raul Velloso, especialista em contas públicas, destaca que, como o Tesouro Nacional tem que cobrir o rombo da Previdência, fica cada vez menor o espaço para investir em áreas prioritárias como saúde, transporte e infraestrutura:
- O dinheiro acabou. Do Orçamento total do governo federal, 75% são uma grande folha de pagamento, somando aposentadorias e salários. Se nada for feito, o gasto em proporção ao PIB (Produto Interno Bruto) vai dobrar em 2040, diante do envelhecimento rápido da população.
- A situação já é insustentável e parece que a sociedade já deu um basta - reforça o economista Marcelo Caetano, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), referindo-se aos recentes protestos por melhores serviços públicos.
Para o especialista, o governo não tem condições políticas de mexer num assunto tão espinhoso no momento. Ele lembrou que o que o Executivo tem feito é defender no Congresso a manutenção do fator previdenciário, criado na reforma de 1998 e que ajuda nas contas do INSS. Mas, destacou que é preciso atacar o problema logo, pois os efeitos são a longo prazo, além de dar uma sinalização positiva para o mercado do ponto de vista das contas públicas.
Além de mexer nas regras de pensão, Cateano sugere a fixação de idade mínima no INSS e aumento da idade mínima do serviço público porque a expectativa de vida aumentou. Mesmo com as mudanças no regime de aposentadoria dos servidores, o sistema registrou déficit de R$ 57,561 bilhões no ano passado e, entre janeiro e maio, o resultado negativo já atingiu R$ 23,611 bilhões, em valores nominais.
Fonte: O Globo
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