- O Estado de S. Paulo
A situação de atrito entre os Poderes Executivo e Legislativo não pode durar para sempre. Uma hora as coisas terão de se acomodar em seu estado natural, que é o de um equilíbrio minimamente razoável nessa relação.
O que se tem hoje é uma circunstância anômala em que o presidente da Câmara dos Deputados parece concentrar toda a força e a presidente da República, representar a figura de maior fragilidade política do País. Impraticável a permanência desse cenário pelos próximos quatro anos.
Tal anomalia serve de alimento à impressão de que a interrupção do mandato de Dilma Rousseff é uma possibilidade concreta e iminente. Como se o Brasil já não estivesse afundado em problemas suficientes para se envolver agora num processo de impeachment de maneira ainda artificial.
Primeiro, porque não há o fato objetivo; segundo, não há consenso social; terceiro, não há concordância entre partidos; quarto, não há solução institucional boa à vista; quinto, a presidente foi reeleita para resolver os enguiços que criou.
A começar pelo restabelecimento de uma convivência equilibrada com o Poder Legislativo, mandamento pétreo da Constituição. A imposição de uma derrota atrás da outra à presidente Dilma no Congresso expõe com todas as letras, pontos e vírgulas o despreparo dela tanto para compreender o que seja um Parlamento quanto para conduzir essa relação ou mesmo para escolher as pessoas certas para a ajudarem na tarefa da interlocução com a sociedade e a mediação política.
Portanto, a articulação política do governo do jeito como foi montada não anda. Isso não faz do deputado Eduardo Cunha a solução de todos os males. Entre outros motivos, porque a ascensão dele não é causa, mas consequência de um passivo acumulado durante os primeiros quatro anos de mandato da presidente Dilma na relação do governo e do PT com seus aliados.
O desequilíbrio entre os dois Poderes não é novidade. A submissão do Legislativo às benesses oferecidas pelo Executivo sempre foi a tônica das coalizões formadas ao arrepio de identidades programáticas. Com o PT isso se aprofundou porque o partido julgou inesgotável e eterno o seu poder de tratar aliados como escravos, mercadorias.
Enquanto a companhia do partido, a liderança de Lula e a bonança de governo rendiam votos, tudo correu bem. O vento virou, mas a onipotência turvou a visão das nuvens no horizonte e, quando a tempestade desabou, foi de uma vez.
O excesso de supremacia de um Poder sobre o outro não faz bem a ninguém, muito menos à República. A exorbitância é um mal em si. O PT é prova disso. Quis demais e está vendo o risco de por tudo a perder.
O PMDB, Eduardo Cunha e base parlamentar rebelada não poderão manter tensão permanente sem que em algum momento isso renda danos. É a teoria da madeira que bate em Chico bate em Francisco. Não demora emerge revolta entre os revoltosos.
A oposição faz o seu papel. Fiscaliza, bate e cobra. Mas aos governistas conviria que substituíssem as facas por conversas de gente grande.
Embolada. Além de outras agruras, o PT enfrenta a falta de um bom roteirista. O partido resolveu levantar suspeita sobre a Polícia Federal, o Ministério Público e a Justiça em decorrência da Operação Lava Jato.
Deixa mal a presidente Dilma, que atribui (indevidamente) o sucesso das investigações ao rigor do governo dela no combate à corrupção. Ao mesmo tempo, os petistas pedem CPI para investigar a Petrobrás no governo Fernando Henrique baseados no depoimento do ex-gerente Pedro Barusco, acusado pelo PT de ser um bandido indigno de crédito.
Breve pausa. Bom carnaval para quem é da folia, bom descanso para quem é do sossego. Até sexta, dia 20.
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