Folha de S. Paulo
Livro mostra como ideias do filósofo e
jurista alemão Carl Schmitt podem ser apropriadas pelo trumpismo
O Trump 2.0 vem em versão bem mais
autoritária do que a de sua primeira passagem pela Casa Branca. Um nome que me
ocorreu ao notar a diferença de voltagem foi o do filósofo e jurista alemão
Carl Schmitt, mas não havia topado com nenhum artigo ligando os dois
personagens nos órgãos de imprensa estrangeiros que acompanho.
Resolvi dar um Google para sanar eventual cochilo e encontrei um livro inteiro dedicado ao assunto. Trata-se de "Trumpism, Carl Schmitt, and the Threat of Anti-Liberalism in the United States", de Roberta Adams.
Como observa a autora logo nas primeiras
páginas, quando analisamos as ações de Trump pelas lentes schmittianas, o que
parecia ser um amontoado de contradições e gestos exuberantes ganha súbita
coerência. Nos capítulos que seguem, Adams vai destrinchando vários nacos do
pensamento de Schmitt e mostrando como o trumpismo se adequa a ele.
Antes de continuar, um alerta. Schmitt é a
versão jurídica de Martin Heidegger. Os dois pensadores se envolveram
profundamente com o nazismo, do
qual jamais se retrataram. Mas suas ideias, embora controversas, são vistas
como mais do que mero epifenômeno do nazismo e por isso continuam a ser
estudadas pela academia.
Adams inicia o livro mostrando como a
distinção schmittiana entre amigo e inimigo, que, para o alemão, deve ser o
fundamento do Estado e serve para conferir autoridade total ao soberano,
inclusive para eliminar os indesejáveis, funciona à perfeição para descrever a
forma como Trump vê seu poder.
Por essa lógica, quem vota contra Trump é o
inimigo e, portanto, carece de legitimidade. Apenas contar os votos dessas
pessoas já configura uma espécie de violação ao princípio da autoridade. Daí a
desqualificar qualquer voto contra Trump como fraudulento é só um pulinho.
Para Adams, o liberalismo e o trumpismo
operam sob paradigmas incompatíveis. Podemos, portanto, esperar mais violência
se as instituições democráticas liberais tentarem mais uma vez conter Donald Trump.
Não é animador, mas é realista.
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