Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Parlamentares querem ajuda do governo para conter jorros de lama; também pode voltar a conversa da reforma política
POR QUE Lula defendeu uns tipos parlamentares que ele um dia chamou de picaretas? Lula permitiu-se até "quebrar o protocolo" dessas ocasiões de rapapé, que consiste em fazer o elogio clichê da "importância do Poder "x" para a democracia" e em "afastar a ideia de crise institucional", que é como alguns chamam esses recorrentes faniquitos e remelexos nos Três Poderes, cujos problemas na verdade são crônicos, não críticos. Lula foi além. Defendeu os barnabés parlamentares, quase todos, metidos em rolos vulgares como o das passagens de avião grátis, entre outros que motivam fúria ou nojo popular.
Como Lula fala demais, poderia ter se tratado apenas de um lapso. Parece que não. José Sarney, o presidente do Senado, e Michel Temer, o da Câmara, têm pedido um "sinal de apoio" a Lula, segundo parlamentares com quem ainda se pode conversar. Querem algum auxílio de Lula para conter a malhação do Congresso e a decorrente barafunda parlamentar que, descontrolada, pode espirrar no próprio governo.
De outra parte, alguns parlamentares querem voltar com a conversa da "agenda positiva", uma discussão "institucional" dos problemas do Legislativo. Sim, o leitor é perspicaz: trata-se da volta da reforma política.
Os escândalos ficaram perigosos. Altos burocratas do Senado começam a se dedurar. Mas tais figuras estão há 15 anos no poder devido a sua simbiose parasitária com sucessivos comandos do Legislativo. Eles são as engrenagens ora óbvias de esquemas de apropriação de recursos públicos e políticos, de favores regimentais e extrarregimentais, de advocacia de interesses de parlamentares enrolados e talvez coisa pior.
Ou seja, a máquina do Legislativo federal se tornou parte do aparato de poder de caciques regionais, em especial de regiões pobres. Note-se que, de 1995, início da "era da modernidade do Real", até 2011 (governos FHC e Lula), Sarney e Renan Calheiros, ora grandes aliados, terão governado o Senado em 10 de 16 anos. O falecido Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho ficaram com o resto do período. Os nomes dizem algo sobre o entrosamento da caciquia regional com a caciquia burocrática que reinou nesses anos e agora começa a ser decapitada.
A lama dos fundos burocráticos do Legislativo pode afetar figuras de frente da casa grande política. Podem surgir ligações muito diretas entre burocratas caídos e parlamentares. Pode irromper a fúria do baixo clero (quase o Congresso inteiro), que quer preservar mumunhas e capilés, em defesa dos quais reage ao estilo de mandões do mato.
A revolta da arraia miúda já deu em coisas como Severino Cavalcanti na presidência da Câmara.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Parlamentares querem ajuda do governo para conter jorros de lama; também pode voltar a conversa da reforma política
POR QUE Lula defendeu uns tipos parlamentares que ele um dia chamou de picaretas? Lula permitiu-se até "quebrar o protocolo" dessas ocasiões de rapapé, que consiste em fazer o elogio clichê da "importância do Poder "x" para a democracia" e em "afastar a ideia de crise institucional", que é como alguns chamam esses recorrentes faniquitos e remelexos nos Três Poderes, cujos problemas na verdade são crônicos, não críticos. Lula foi além. Defendeu os barnabés parlamentares, quase todos, metidos em rolos vulgares como o das passagens de avião grátis, entre outros que motivam fúria ou nojo popular.
Como Lula fala demais, poderia ter se tratado apenas de um lapso. Parece que não. José Sarney, o presidente do Senado, e Michel Temer, o da Câmara, têm pedido um "sinal de apoio" a Lula, segundo parlamentares com quem ainda se pode conversar. Querem algum auxílio de Lula para conter a malhação do Congresso e a decorrente barafunda parlamentar que, descontrolada, pode espirrar no próprio governo.
De outra parte, alguns parlamentares querem voltar com a conversa da "agenda positiva", uma discussão "institucional" dos problemas do Legislativo. Sim, o leitor é perspicaz: trata-se da volta da reforma política.
Os escândalos ficaram perigosos. Altos burocratas do Senado começam a se dedurar. Mas tais figuras estão há 15 anos no poder devido a sua simbiose parasitária com sucessivos comandos do Legislativo. Eles são as engrenagens ora óbvias de esquemas de apropriação de recursos públicos e políticos, de favores regimentais e extrarregimentais, de advocacia de interesses de parlamentares enrolados e talvez coisa pior.
Ou seja, a máquina do Legislativo federal se tornou parte do aparato de poder de caciques regionais, em especial de regiões pobres. Note-se que, de 1995, início da "era da modernidade do Real", até 2011 (governos FHC e Lula), Sarney e Renan Calheiros, ora grandes aliados, terão governado o Senado em 10 de 16 anos. O falecido Antonio Carlos Magalhães e Jader Barbalho ficaram com o resto do período. Os nomes dizem algo sobre o entrosamento da caciquia regional com a caciquia burocrática que reinou nesses anos e agora começa a ser decapitada.
A lama dos fundos burocráticos do Legislativo pode afetar figuras de frente da casa grande política. Podem surgir ligações muito diretas entre burocratas caídos e parlamentares. Pode irromper a fúria do baixo clero (quase o Congresso inteiro), que quer preservar mumunhas e capilés, em defesa dos quais reage ao estilo de mandões do mato.
A revolta da arraia miúda já deu em coisas como Severino Cavalcanti na presidência da Câmara.
Mas a fúria pode se voltar contra um Executivo indiferente à "injustiça" de que parlamentares se julgam vítimas. Ou o governo e seus líderes ajudam a colocar ordem na casa ou podem brotar CPIs e votações indesejáveis. Além desse acordão, figuras mais diplomáticas e amenas do Congresso pretendem fazer dos limões do escândalo uma limonada "construtiva": reviver a reforma política, ideia da qual o governo não desgosta (não custa nada). Sabe-se lá até onde vai essa conversa, mas o plano pode servir de manobra diversionista, a desviar a atenção da política policial.
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