Uso de expressão em homenagem a FHC causa mal-estar; para evitar mais uma crise, presidente escala novo líder para amenizar fala de ministro
Tânia Monteiro
A presidente Dilma Rousseff não gostou do discurso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, na solenidade de 80 anos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, quinta-feira no Senado, mas decidiu não transformar o assunto em uma crise institucional. Segundo assessores, optou por fazer "ouvidos de mercador".
Anteontem, Jobim, começou dizendo que ia fazer um "monólogo" em homenagem ao ex-presidente. Ao elogiar o espírito tolerante de Fernando Henrique - de quem foi ministro da Justiça -, Jobim citou o escritor Nelson Rodrigues e disse: "Ele dizia que, no seu tempo, os idiotas chegavam devagar e ficavam quietos. O que se percebe hoje, Fernando, é que os idiotas perderam a modéstia. E nós temos de ter tolerância e compreensão também com os idiotas, que são exatamente aqueles que escrevem para o esquecimento."
Apesar dos desmentidos de que tenha chamado pessoas do atual governo de "idiotas", Jobim causou mal-estar no Palácio do Planalto. A declaração foi considerada "desastrosa" por auxiliares diretos de Dilma. "Ele criou um ambiente que não existia, sem a menor necessidade", disse um assessor. A própria presidente teria considerado "desnecessária" a observação de Jobim, que causou "perplexidade" no governo.
Ainda de acordo com interlocutores de Dilma, Jobim "levantou a bola" para todos os seus adversários, particularmente os do PT, o atacarem. Além disso, disseram, ele tem dois assuntos bombásticos na mão - Comissão da Verdade e sigilo dos documentos oficiais.
Ontem, o ministro minimizou as declarações. Ao Estado contou que ao chegar ao Palácio da Alvorada, onde tinha um despacho às 11 horas com a presidente, ela o recebeu brincando. "Ô Nelson, estão querendo nos intrigar", disse a presidente, de acordo com relato do próprio ministro, que negou que suas afirmações tenham qualquer tipo de relação com o governo. "Não sabem ler", desabafou Jobim, explicando que se referia a "alguns jornalistas que escrevem para o esquecimento". "Eu me referia a um texto do escritor argentino Jorge Luis Borges", argumentou, completando que quem escreve para a memória e para a história são os escritores.
Percepção. De acordo com Jobim, Dilma afirmou a ele que "percebeu logo" que era uma citação que ele já havia feito anteriormente. O ministro informou a presidente ainda que ia procurar jornalistas para esclarecer o episódio e encerrá-lo. "Estão procurando chifre em cabeça de burro", argumentou o ministro, que embarcou à tarde para Londres, onde participará de reuniões com o ministro da Defesa inglês.
O deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS), que assumiu ontem a liderança do governo no Congresso, também minimizou o episódio e a fala de Jobim com a palavra "idiota".
"Não foi recado para o governo. O ministro Jobim é muito inteligente", afirmou o novo líder, ao comentar o discurso do ministro da Defesa.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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