- O Globo
"A cidadania e as eleições" foi o tema de um debate ontem na Academia Brasileira de Letras (ABL), dentro do projeto "Brasil, Brasis". Coordenado por Domício Proença Filho, o cientista político e ecologista Sérgio Abranches, o publicitário Jorge Maranhão e eu discutimos o momento político que vivemos a 10 dias do 1º turno da eleição presidencial.
As visões foram complementares, eu me declarei otimista com a possibilidade de as pressões da sociedade, cada vez maiores, levarem a bom termo as re formas estruturais de que o país necessita, sobretudo a política. Considero que chegamos a um momento de tantas distorções no relacionamento entre os políticos e o governo, ambos se distanciando muito dos in ter esses e demandas da sociedade, que o prosseguimento dessa maneira de fazer política está com seus dias contados, mesmo que, nos seus estertores, as forças políticas que comandam esse retrocesso consigam uma sobrevida nas eleições presidenciais.
Sérgio Abranches, criador do conceito de "presidencialismo de coalizão", mostrou- se otimista com a possibilidade de, no 2º turno que se avizinha, darmos um salto de qualidade no nosso sistema de governo com um acordo programático entre o PSDB e Marina Silva. Um acordo desse tipo, nos moldes do que vigora, por exemplo, na Inglaterra, onde liberais e conservadores montaram programa de governo em que ambos os partidos tiveram que abrir mão de projetos em favor do acordo final. Para Abranches, só usando programas partidários como base para acordos congressuais sairemos da crise em que estamos instalados, com as coalizões sendo formadas em troca de favores e benesses do governo, e os partidos vendendo seu tempo de TV para propaganda em troca de nacos do poder central.
Ele comparou a eleição com o plebiscito sobre a separação da Escócia, quando a movimentação dos separatistas , embora derrotada, trouxe à tona a necessidade de mais autonomia para os países do Reino Unido. Também aqui no Brasil a força que está levando Marina ao 2º turno, sem que ela tenha estrutura partidária das maiores ou tempo no rádio e TV , seria a expressão de um sentimento latente na sociedade de recuperação da cidadania, refletido nas demonstrações de junho de 2013 e que deságua agora nas urnas . Já Jorge Maranhão, ativista da cidadania e que tem um blog, "A Voz do Cidadão", acentuou que a cidadania tem de recuperar seu sentido de ação política, sobretudo da elite mais responsável. O sentido de engajamento, de tomar conta não só dos mandatos dos eleitos, mas também da execução dos orçamentos públicos.
De valorizar e fiscalizar as instituições democráticas, as políticas, as jurídicas e as de controle e gestão do Estado. E obrigá-lo a servir mais e melhor os cidadãos do que estes àquele. Segundo Maranhão, temos a missão indelegável de fazer propostas de políticas públicas exequíveis, eficientes e voltadas ao bem comum, e não a interesses político-partidários de ocasião. O momento é o da defesa intransigente dessa cidadania, feita por verdadeiros agentes de cidadania, cada um experiente e preparado em seu segmento de atuação privada, mas com capacidade de mobilizar outros cidadãos e mesmo estratos inteiros da sociedade, numa grande onda de indignação cívica em prol das re formas do Estado. Hoje, disse Maranhão, as instituições políticas não são o "espelho da sociedade", como quer o cinismo de nossos políticos. E o processo eleitoral é apenas uma máquina de perpetuação de um triste cenário de descaso, impunidade e negligência.
Malabarismo
O instituto Vox Populi, que faz sondagens para o PT, divulgou ontem uma pesquisa na revista "Carta Capital" em que a presidente Dilma cai dois pontos em relação à pesquisa anterior do mesmo instituto, do dia 23, de 40% para 38%, enquanto Marina sobe três pontos, de 22% para 25%. A diferença entre as duas caiu, em dois dias, de 18 para 13 pontos. A mudança grande está no 2º turno, pois a pesquisa anterior do Vox Populi mostrava uma vitória de Dilma sobre Marina de 46% a 39%, uma diferença de 7 pontos a favor da presidente . Na pesquisa de ontem, Dilma caiu quatro pontos e Marina subiu dois pontos , voltando ao empate técnico . A diferença entre as duas, que foi, dois dias antes, de 7 pontos , voltou a ser de 1 ponto a favor de Dilma, de 42% para 41%. Uma diferença e tanto para quem, há dois dias, chegava a prever a possibilidade de a presidente Dilma vencer já no primeiro turno.
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