- Correio Braziliense
Ao quebrar parcialmente o
sigilo das investigações sobre os atos antidemocráticos do ano passado, Moraes
pôs uma saia justa na Procuradoria-Geral da República
A quebra do sigilo do inquérito sobre os
atos antidemocráticos praticados por aliados do presidente Jair Bolsonaro é um
novo patamar na escalada das tensões entre os Poderes da República. Decidida
pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, foi uma resposta ao pedido
de arquivamento do inquérito, feito na sexta-feira, pelo vice-procurador-geral
da República Humberto Jacques de Medeiros. Segundo a PGR, as investigações da
Polícia Federal (PF) não conseguiram apontar a participação de deputados e
senadores nos supostos crimes investigados. Moraes, porém, resolveu quebrar o
sigilo do inquérito, exceto dos anexos. Agora, cabe ao ministro do Supremo
decidir sobre o arquivamento ou não.
São investigados os deputados Alê Silva
(PSL-MG), Aline Sleutjes (PSL-PR), Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP),
Caroline de Toni (PSL-SC), General Girão (PSL- RN), Guga Peixoto (PSL-SP),
Junio Amaral (PSL-MG) e o já falecido senador Arolde de Oliveira (PSD-RJ). Os
deputados Daniel Silveira (PSL-RJ) e Otoni de Paula (PSC-RJ), que já estão
denunciados ao Supremo com base nesse inquérito, não são beneficiados pelo
pedido. Segundo Medeiros, houve “inadequado direcionamento da investigação”. A
PF tomou depoimentos, verificou contas inautênticas em redes sociais, solicitou
informações a operadoras de telefonia, mas não fez a análise dessas
informações, alegou o vice-procurador-geral.
Embora o inquérito tenha sido aberto a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, nada foi investigado durante os cinco meses em que o caso esteve sob responsabilidade do MPF, apesar de um pedido da delegada federal Denisse Ribeiro, titular do inquérito. São investigados a organização e o financiamento de manifestações de extrema-direita, durante o ano passado, quando partidários de Bolsonaro foram às ruas para pedir intervenção militar, o fechamento do Supremo e do Congresso,e a volta do Ato Institucional no. 5. Principal ato de força do antigo regime militar, o AI-5, de 13 de dezembro de 1968, institucionalizou o autoritarismo no Brasil e serviu de base para prisões, sequestros, assassinatos e “desaparecimentos” de oposicionistas.
No relatório parcial entregue à PGR, em
janeiro, Denisse pede o aprofundamento das investigações. Ao quebrar parcialmente
o sigilo do inquérito, Moraes pôs uma saia justa na PGR, que tem a obrigação de
dar sequência às investigações, se houver razões para isso. Quando o inquérito
está em sigilo, esse entendimento depende de quem investiga (o delegado), de
quem avalia se cabe a denúncia (o procurador) e de quem decide se o caso deve
ser julgado (o juiz). Quando se quebra o sigilo de um inquérito, entram em cena
os meios de comunicação e a chamada opinião pública.
Prevaricação
O pedido de arquivamento do inquérito protege os organizadores e financiadores
dos eventos, que estavam sob investigação. Moraes pode não aceitar o pedido de
arquivamento e determinar novas diligências, enquanto a PGR fica numa situação
de exposição: o vice-procurador-geral Medeiros não pode prevaricar.
Prevaricação é o crime cometido por funcionário público quando, indevidamente,
retarda ou deixa de praticar ato de ofício, ou o pratica contra disposição
legal expressa, visando satisfazer interesse pessoal. O procurador Augusto Aras
é aliado de Bolsonaro e se movimenta para ser indicado para a vaga do ministro
Marco Aurélio Mello, do STF, que está se aposentando.
Também há uma batalha surda na PF em torno
do caso, porque o relatório da delegada Denisse afirma que houve tentativa de
um empresário e do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, de
comprar ou alugar uma rádio para fortalecer apoios políticos. A delegada
sugeriu, também, investigações sobre o envio de dinheiro do exterior para
financiar manifestações antidemocráticas, a obstrução dos trabalhos da CPI das
Fake News, o direcionamento de verbas do governo federal para sites e canais
bolsonaristas e a existência de “rachadinhas” em gabinetes de deputados
governistas com o redirecionamento das verbas para o financiamento dos atos
antidemocráticos
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