O Estado de S. Paulo.
Democracia é democracia, liberdade de expressão é liberdade de expressão, covid é covid, vacina é vacina
Antes sorrateiramente, agora
ostensivamente, o presidente Jair Bolsonaro usa uma estratégia sofisticada e
audaciosa para inverter o jogo e dizer que ele é o verdadeiro democrata e quem
ataca a democracia são os outros, os adversários e as próprias instituições.
Uma estratégia demoníaca.
Na denúncia-crime de Bolsonaro contra o
ministro Alexandre de Moraes, o “Messias”, “mito” e “democrata” o acusa de
abuso de autoridade e de ataques à liberdade de expressão, à Constituição e à
democracia. Não é pra rir! É para ficar cada vez mais alerta, porque é esse tipo
de inversão da realidade que Bolsonaro usa e seus robôs, virtuais ou de carne e
osso, replicam na internet – inclusive como comentários de leitores. Ele cria a
realidade paralela, sua tropa replica sem pensar.
Na realidade real, é Bolsonaro quem ataca
urnas eletrônicas (sem mínimas evidências de fraude em décadas), o TSE e o
Supremo e já entrou com pedido de impeachment de Moraes no Senado, tentou
denúncia-crime contra ele no Supremo e insiste na PGR.
Foi também Bolsonaro quem fez homenagem no Planalto a condenado pelo STF e, no 7 de Setembro, anunciou a intenção de descumprir decisão judicial. De tão grave, a ameaça mobilizou até o ex-presidente Michel Temer para apagar o incêndio. Logo, é ele, Bolsonaro, quem ameaça instituições, eleições e a democracia.
Na realidade paralela, a jogada de
marketing é transformar em vítimas Bolsonaro, Daniel Silveira, Roberto
Jefferson, Allan dos Santos e a milícia bolsonarista e, em réus, os que
defendem a democracia, asfixiam atos golpistas, condenam quem posa com armas para
ameaçar autoridades ou jogam fogos de artifício no STF.
Na versão bolsonarista, “liberdade de
expressão” é licença para qualquer coisa, pregar a volta da ditadura, o AI-5, o
fechamento do Supremo, ameaçar bater nos ministros, não respeitar decisão judicial,
sabotar as eleições, tudo que seu mestre mandar. Isso não é liberdade, muito
menos democracia.
A jogada é para dar discurso aos eleitores
de Bolsonaro na campanha eleitoral, neutralizando as ameaças golpistas dele e
transformando a eleição numa guerra entre quem é mais e quem é menos democrata.
Absurdo? Sim, mas estamos na era dos absurdos.
É como na pandemia. Se a “culpa (pela
tragédia no Brasil) foi do STF e dos governadores”, agora, os problemas
respiratórios, cardíacos e psíquicos não são sequelas da covid, como a medicina
e a Ciência mostram, mas das vacinas, que Bolsonaro combateu e não tomou.
Gente, democracia é democracia, liberdade de expressão é liberdade de expressão, covid é covid, vacina é vacina. Ah! E a Terra é redonda
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