segunda-feira, 6 de junho de 2022

Bruno Carazza*: Haddad, o novo Genoino?

Valor Econômico

Apoio de Lula e esquerda unida adianta só no 1° turno

Luiz Inácio Lula da Silva teve seu batismo nas urnas em 15 de novembro de 1982, quando com número 3 (o 13 seria adotado logo depois) apareceu na cédula de votação para o cargo de governador de São Paulo na primeira eleição do recém-criado Partido dos Trabalhadores.

Fundado pela união de sindicalistas com acadêmicos, artistas e lideranças católicas que tinham em comum a oposição ao regime militar e ideologia de esquerda, o PT possui DNA fortemente paulista. Apesar de ter se nacionalizado em 42 anos,, ironicamente o PT nunca venceu o Estado de São Paulo.

Desde o 4º lugar na estreia de Lula em 1982, o PT escalou figuras históricas e nomes promissores do partido para disputar o Palácio dos Bandeirantes: Eduardo Suplicy (4º em 1986), Plínio de Arruda Sampaio (4º em 1990), José Dirceu (3º em 1994), Marta Suplicy (3º em 1998), José Genoino (2º em 2002), Aloizio Mercadante (2º em 2006 e 2010), Alexandre Padilha (3º em 2014) e Luiz Marinho (4º em 2018). Os petistas, porém, nunca chegaram nem perto de assumirem o comando da mais poderosa unidade federativa brasileira.

Fernando Haddad é a aposta da vez para quebrar essa escrita. Prefeito da capital paulista entre 2012 e 2016 e candidato derrotado à Presidência da República em 2018, ele largou na frente nas pesquisas eleitorais, posicionando-se com boa folga nas intenções de voto tanto no primeiro quanto no segundo turno.

Além de seus atributos pessoais - como formação profissional e experiência política - o nome de Haddad tem um forte recall junto ao eleitorado paulista, o que explica a boa pontuação nesta fase de pré-campanha. O professor da USP e ex-ministro da Educação conta ainda com o empurrão de Lula, que lidera a disputa por um terceiro mandato presidencial. Essa dobradinha Lula-Haddad dá esperanças à esquerda de encerrar um domínio do PSDB em São Paulo que já dura sete eleições seguidas (de 1994 a 2018). Mesmo assim a batalha não será fácil.

Como pode ser visto no gráfico abaixo, historicamente o PT enfrenta muita resistência no Estado. Tomando as médias de votação dos candidatos petistas ao governo desde 1994 em cada município paulista, observamos que o partido se mostra competitivo somente em dois enclaves principais: a região do seu berço sindical (Diadema, São Bernardo, Santo André e Cubatão) e o entorno de Campinas, onde seu desempenho sempre supera a média de 35% dos votos válidos.

Em outras áreas, como a capital e cidades populosas como São José dos Campos, Araraquara e Ribeiro Preto, a pontuação cai para a faixa de 20% a 25%. À medida que se avança para o interior e o litoral, a preferência pelo PT cai significativamente, gravitando entre 10% e 15%.

Essa resistência ao PT fora dos grandes centros urbanos e industriais de São Paulo é o maior obstáculo aos planos de Haddad de se tornar o primeiro governador do partido no Estado, principalmente diante da formação das chapas adversárias.

Em entrevista recente concedida a Cristiane Agostine e César Felício, do Valor, Fernando Haddad comemorou o fato de ter construído uma ampla coalizão de esquerda em torno de si (PT, PV, PCdoB, Psol e Rede), enquanto a direita e a centro-direita estariam fragmentadas entre as candidaturas do bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do atual governador Rodrigo Garcia (PSDB).

Quanto à possibilidade cada vez mais real de enfrentar também Márcio França (PSB), Haddad citou no Estadão números do Datafolha que indicam que 40% dos eleitores do ex-governador considerarem o governo Bolsonaro ótimo ou bom. Ao se posicionar como o único nome viável da esquerda, Haddad considera que o caminho até o Bandeirantes está pavimentado, pois os conservadores se dividirão entre três opções diferentes.

Não há muitas dúvidas de que, com o apoio de Lula e dos principais partidos de esquerda, Haddad praticamente sacramenta presença no segundo turno, repetindo o feito de José Genoino em 2002. O risco da sua candidatura, contudo, está justamente em repetir a história desse ex-presidente do partido.

Em 2002 a campanha de Genoino para o governo de São Paulo foi turbinada pela ascensão de Lula rumo ao Palácio do Planalto, e assim ele terminou o primeiro turno com 32,5% dos votos, relativamente próximo de Geraldo Alckmin (com 38,3%) e bem à frente do terceiro colocado, Paulo Maluf (com 21,4%).

Sem construir pontes à direita, entretanto, Genoino não teve para onde crescer, enquanto os votos de Maluf migraram quase totalmente para Alckmin. Resultado: o ex-tucano foi reeleito com 58,6% dos votos, contra apenas 41,4% do petista.

Ainda é cedo para cravar que Haddad é o novo Genoino. Mas o que ele considera trunfo (ser o ungido de Lula na esquerda) pode se configurar uma armadilha no segundo turno, caso os eleitores conservadores de Tarcísio, Garcia e França migrems para o adversário do petista, seja ele quem for.

*Bruno Carazza é mestre em economia e doutor em direito, é autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”.

Um comentário:

ADEMAR AMANCIO disse...

PT e PSDB são equivalentes,a tragédia brasileira se chama Bolsonaro.