O Globo
Projeto só tem um objetivo: livrar Jair
Bolsonaro e sua camarilha de covardes de responder pelo crime de alta traição
Parece mentira, mas tem apoio na Câmara dos
Deputados a proposta de anistiar os golpistas e os participantes do ataque e
destruição dos símbolos da República e da democracia, os Poderes Legislativo,
Executivo e Judiciário. Salta à vista o absurdo de deputados e deputadas
proporem anistia para os que depredaram o mesmo plenário onde pretendem que se
aprovem a impunidade e a cumplicidade com um golpe de Estado.
Todo o resto é agravante: os atentados de 12 e 24 de dezembro, o risco de uma tragédia no Aeroporto Internacional de Brasília e, por fim, a destruição das sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023. Podemos ver os desdobramentos do plano golpista, culminando com o Punhal Verde Amarelo e a participação dos kids pretos, integrantes das Forças Especiais do Exército sediados em Goiás, cuja missão seria eliminar o presidente da República, o vice e um ministro do STF. Simples assim.
Estão envolvidos na tentativa de golpe de
Estado o ex-presidente Jair
Bolsonaro e mais 33 membros de seu governo e das Forças Armadas. Para
ter uma ideia da gravidade do alto escalão, temos nada menos que o
ex-diretor-geral da Abin Alexandre
Ramagem, o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o ex-ministro da
Justiça Anderson
Torres, o ex-titular do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência,
general Augusto
Heleno, o ex-comandante do Exército e general Paulo Sérgio Nogueira, o
ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice-presidente, general Braga Netto, e
o ex-ajudante de ordens Mauro Cid.
Depois temos seis denunciados que dirigiram a
ação de órgãos policiais, coordenaram o monitoramento de autoridades, apoiaram
os manifestantes acampados e elaboraram minutas golpistas. Outro grupo de 13
denunciados pressionou integrantes da cúpula do Exército a apoiar o golpe e,
por fim, oito integrantes do núcleo de desinformação e ataques às urnas
eleitorais e instituições e autoridades.
Anistia e indulto são atribuições do
Legislativo e do Executivo, respectivamente, e é verdade que podem ser
concedidas antes do trânsito em julgado. Mas a anistia é vedada a crimes
inafiançáveis e imprescritíveis como os cometidos por grupos armados contra o
Estado. Logo, pode ser inconstitucional ou vetada pelo presidente da República.
O indulto é um perdão jurídico que extingue a pena de um condenado e restaura
sua liberdade, de competência exclusiva do presidente.
Mesmo a proposta de dosimetria das penas não
tem base na realidade e nos julgamentos até agora concluídos. Vejamos: dos
1.682 denunciados, 1.039 já foram condenados, 542 foram beneficiados por penas
alternativas, prestação de serviços comunitários, multas e restrições de
direitos, 240 receberam penas de um ano, 246 condenações por crimes leves e 251
por crimes graves, com penas de três a 17 anos e seis meses. Nada que
justifique a acusação de penas agravadas ou fora da lei penal se levarmos em
consideração a gravidade dos atos praticados.
Câmara e Senado têm soberania para aprovar a
anistia; o presidente para vetar; e o STF para julgar sua constitucionalidade;
mas a maioria do país é contra. E nós, que vivemos a ditadura militar, sabemos
o que aconteceria se Bolsonaro fosse vitorioso. Se assassinariam o presidente,
o vice ou um ministro do STF, podemos deduzir que viveríamos um banho de sangue
no país, com uma ditadura de longa duração. E nos custaria de novo anos de
privação do mais sagrado direito, a liberdade.
Assim, é nosso dever lutar contra a anistia
que, no fundo, só tem um objetivo: livrar Jair Bolsonaro e sua camarilha de
covardes de responder pelo crime de alta traição que praticaram, ele e os
militares que juraram defender a Constituição e a conspurcaram.
*José Dirceu, advogado, foi deputado, ministro e presidente do PT
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