sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Jornalista não estava a serviço de jornal na época

DEU EM O GLOBO

PF vai investigar origem do dinheiro usado para quebrar sigilo fiscal

Roberto Maltchik e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. O jornalista Amaury Ribeiro Jr., responsável pela violação dos dados fiscais de lideranças tucanas e de familiares do candidato à Presidência José Serra, estava de férias e a ponto de pedir demissão do jornal "Estado de Minas" quando foi a São Paulo receber as informações extraídas ilegalmente do sistema da Receita Federal. Amaury, segundo documentos obtidos pela Polícia Federal, entrou em férias no dia 25 de setembro de 2009. Os dados fiscais da filha de Serra, Verônica Serra, e do genro do presidenciável, Alexandre Bourgeois, foram violados no dia 30 de setembro na Delegacia da Receita Federal, em Santo André (SP).

Já as declarações de Imposto de Renda do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira, do ex-ministro das Comunicações, Luis Carlos Mendonça de Barros, e do ex-diretor do Banco do Brasil, Ricardo Sérgio, foram violadas em 8 de outubro de 2009.

Este ano, Amaury pagou R$5 mil para Dirceu Garcia

Amaury foi contratado pelo "Estado de Minas" em setembro de 2006 e pediu demissão no dia 15 de outubro de 2009, alegando que tinha que cuidar de negócios da família, porque o pai estava muito doente. No período de férias, Amaury fez as duas viagens a São Paulo com o objetivo de buscar o material que havia encomendado junto ao despachante Dirceu Garcia, que recebeu R$12 mil pelo serviço ilegal.

Nessas viagens que fez a São Paulo, Amaury fez o mesmo caminho: em 29 de setembro e 8 de outubro de 2009, o repórter saiu de Belo Horizonte, parou em Brasília e só depois seguiu rumo à capital paulista. O pagamento a Dirceu foi feito em dinheiro vivo.

A PF já descobriu que, em setembro deste ano, Amaury ligou para o despachante com a missão de dar a ele um "cala boca", segundo relato do próprio Dirceu em depoimento. O valor foi de R$5 mil, pago em duas parcelas iguais de R$2,5 mil. Segundo o depoimento do despachante, Amaury ligou a ele perguntando se o parceiro precisava de ajuda e relatou que estaria na Barra Funda, bairro da Zona Oeste da capital paulista. Entretanto, os pagamentos foram feitos em depósitos bancários, emitidos de uma agência do Bradesco, em Brasília. Os pagamentos ocorreram nos dias 09 e 17 de setembro.

Amaury afirmou em depoimento à PF que, mesmo estando de férias, tinha viajado às custas do jornal para o qual trabalhava. Aos investigadores, Amaury afirmou que "as despesas das viagens foram custeados pelo órgão de imprensa no qual trabalhou, ou seja, o "Estado de Minas"".

PF quer quebrar sigilo bancário do jornalista

A direção do "Estado de Minas" divulgou nota, porém, negando que tivesse pagado a viagem do ex-funcionário. "Amaury Ribeiro Júnior trabalhou como repórter do "Estado de Minas" de 25 de setembro de 2006 a 15 de outubro de 2009. No dia 25 de setembro de 2009, o jornalista entrou em férias e as gozou até o dia 14 de outubro do mesmo ano. No dia 15 de outubro, o repórter pediu demissão. Nenhuma viagem do jornalista no período em questão foi custeada pelo jornal", afirma a nota assinada pela direção do jornal.

A Polícia Federal vai aprofundar as investigações sobre a origem dos R$12 mil que o jornalista Amaury usou para pagar pela quebra do sigilo de Eduardo Jorge e outras pessoas ligadas a José Serra, candidato tucano à Presidência. O jornalista disse, num dos quatro depoimentos à polícia, que as despesas das viagens que fez de Belo Horizonte a São Paulo para buscar os documentos foram pagas pelo jornal "Estado de Minas". A PF já obteve papéis confirmando que o jornal bancou as passagens de avião. Resta agora saber se os R$12 mil saíram também da conta do jornal.

A polícia encaminhou ao Ministério Público Federal uma representação sugerindo a quebra do sigilo bancário de Amaury Ribeiro Júnior, do despachante Dirceu Rodrigues Garcia e outras pessoas para checar a informação. Pelas investigações da polícia, Amaury fez três pagamentos a Garcia, o chefe do grupo encarregado de obter os dados fiscais de Eduardo Jorge e dos outros tucanos nas agências da Receita Federal em Santo André e Mauá, em São Paulo. Ele teria desembolsado R$8 mil em setembro e outubro do ano passado, logo após o acesso declarações fiscais dos tucanos.

O terceiro pagamento, o de duas parcelas de R$2,5 mil em setembro deste ano, foi feito quando Dirceu já estava sob investigação. O despachante confessou à polícia que recebeu R$5 mil de Amaury em setembro e apresentou extratos dos depósitos que fez numa conta bancária. Agora, o delegado Hugo Uruguai, que está à frente da investigação, tentará identificar se o jornalista fez os pagamentos com recursos próprios ou se recebeu ajuda de terceiros.

Numa entrevista na quarta-feira, o delegado Alessandro Moretti, que também está participando das investigações, disse que todas as despesas de Amaury com as viagens e obtenção dos documentos fiscais foram pagas pelo "Estado de Minas". Para o diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, as investigações adicionais não terão impacto substancial no resultado da apuração. Para ele, o caso sobre a quebra de sigilo está esclarecido. Se surgirem fatos novos, com novos personagens, a PF entende que, neste caso, teria que abrir novo inquérito.

PF reafirma que não vai investigar campanha de Dilma

A Polícia Federal reafirma que não cabe estender a investigação sobre a quebra de sigilo fiscal dos tucanos e o uso político das informações à campanha da ex-ministra Dilma Rousseff (PT). Pelo entendimento da polícia, o crime de quebra de sigilo foi cometido em setembro e outubro do ano passado, muito antes do início da pré-campanha eleitoral. Amaury foi chamado para trabalhar na equipe de inteligência da campanha da ex-ministra depois da quebra do sigilo.

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