Incomodada com a repercussão do socorro que recebeu do antecessor, presidente decide comandar reuniões a partir desta semana, reunir Conselho Político e lançar plano de erradicação da miséria
Vera Rosa
BRASÍLIA - Sem conseguir resolver o apagão na articulação política do Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff comandará uma série de reuniões, a partir desta semana, na tentativa de provar que o governo não está paralisado pela crise envolvendo o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. Dilma não gostou da repercussão do "socorro" do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e quer mostrar que não é teleguiada.
Apesar de acatar os conselhos de Lula, que assumiu as rédeas políticas do governo após o desastrado telefonema no qual Palocci ameaçou o vice-presidente Michel Temer com a demissão dos ministros do PMDB, Dilma avalia que a entrada de seu padrinho em cena foi usada pela oposição para desqualificá-la. Ficou contrariada com comentários sobre a anemia de sua equipe e está disposta a sair da defensiva.
Na terça-feira, depois de voltar de uma viagem ao Uruguai, onde vai tratar de obras de infraestrutura, Dilma comandará uma reunião com governadores e prefeitos de capitais que serão sede da Copa de 2014. Na quarta, terá almoço com senadores do PMDB, em mais uma tentativa de evitar nova rebelião de sua base no Congresso. No mesmo dia está previsto um encontro com o Conselho Político, que abriga presidentes de partidos aliados e só se reuniu uma única vez até agora. O lançamento do programa Brasil sem Miséria, vendido como vitrine social, deve ocorrer na quinta-feira.
Para conter as dissidências no PMDB, Dilma receberá muito mais senadores do partido, nos próximos dias, do que aqueles que recebeu em cinco meses de governo. Antes, porém, Temer promoverá reunião de emergência com peemedebistas amanhã, no Palácio do Jaburu, para tratar das fraturas na coalizão.
O auge da crise com o PMDB ocorreu quando Palocci - alvejado por denúncias de enriquecimento vertiginoso quando era deputado federal - passou a mão no telefone e ligou para Temer, a mando de Dilma, na madrugada de segunda-feira.
‘Amadorismo’. O clima era tenso. Acuado, Palocci foi direto ao assunto. Sem cerimônia, avisou que os ministros do PMDB seriam demitidos se o partido aprovasse emenda ao Código Florestal concedendo anistia a desmatadores até 2008. Não foi só: no bate-boca, o chefe da Casa Civil disse que a degola começaria pelo ministro da Agricultura, Wagner Rossi, indicado por Temer. "Se é assim, é melhor o PMDB entregar todos os cargos", reagiu, irritado, o vice-presidente.
O PMDB contrariou Dilma na votação da Câmara e, a partir daí, a relação com o partido azedou e se instalou um clima de guerra. "Lula ajudou a acalmar os ânimos", admitiu o líder do governo no Congresso, Romero Jucá (PMDB-RR). "Casamento é assim mesmo: às vezes enfrenta crises, mas já houve uma operação panos quentes", amenizou o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.
Lula já administrou uma crise com Palocci em 2006, quando o então ministro da Fazenda acabou abatido, no rastro do escândalo da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Costa, revelado pelo Estado. Disse estar "escaldado" com turbulências, mas saiu de Brasília preocupado.
O telefonema a Temer foi visto até por dirigentes do PT como mais um sinal de amadorismo do Planalto. Com Palocci nas cordas e o ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, cada vez mais enfraquecido, Carvalho ocupou o vazio político.
Orientado por Lula, de quem foi chefe de gabinete, ele reforçou a ofensiva para barrar a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar a evolução do patrimônio de Palocci. Conversou com a bancada evangélica e percebeu que havia clima propício para a instalação da CPI no Senado, caso o governo não suspendesse a distribuição do kit contra a homofobia em escolas públicas.
Foi Carvalho, também, o porta-voz da decisão palaciana de apontar o dedo para o PSDB. Em estratégia acertada com Dilma e Lula, ele acusou a Secretaria de Finanças de São Paulo - dirigida por Mauro Ricardo Costa, aliado do ex-governador José Serra (PSDB) - de quebrar o sigilo fiscal da empresa de consultoria Projeto, pertencente a Palocci.
‘Não vou, não vou’. Deputados e senadores da base aliada, porém, avaliam que nenhum contra-ataque reverterá o encrencado jogo do governo se Dilma não escolher um interlocutor com autonomia para negociar com o Congresso. E, pior, se ela prosseguir com a tática do confronto com o PMDB.
"Eu não vou misturar votação de Código Florestal, que ainda passará pelo Senado, com distribuição de cargos. Não vou, não vou e não vou", esbravejou Dilma, em almoço com a bancada do PT no Senado, na quinta-feira, quando questionada sobre a montagem do segundo escalão.
Além de Dilma não ter dado brecha para os petistas reclamarem sobre a falta de diálogo, todos ficaram perplexos com o que ouviram. Quando o líder do PT, Humberto Costa (PE), disse que o PMDB apoiava relatório de Aécio Neves (PSDB) para mudar a tramitação das Medidas Provisórias, Dilma não se conteve.
"Querem mudar isso justamente agora?", protestou ela, desautorizando acordo firmado por Jucá, líder do governo, com a oposição. "Não vou aceitar. Não se governa o Brasil sem Medida Provisória." Em seguida, virou-se para Palocci e perguntou, na lata: "Você sabia disso?"
A resposta do ministro foi sintomática. "Esse assunto eu desconheço. A Casa Civil trata de questões plurais", respondeu Palocci. Dilma dirigiu a mesma interrogação a Luiz Sérgio, chamado nos bastidores de "garçom" do Planalto por carregar a bandeja de pedidos de deputados e senadores, sem nunca decidir nada. Consta que ele não disse nem sim nem não.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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