Irritada com a menção
de seu nome para reforçar a existência do mensalão e compra de voto no
Congresso, a presidente Dilma Rousseff divulgou nota para responder ao relator
da ação no STF. Joaquim Barbosa se valeu de trecho do depoimento da então
ministra-chefe no processo, em 2009, para reafirmar tese da Procuradoria-Geral
da República. Dilma, à época, disse que ficou "surpresa" com a
rapidez da votação do marco regulatório do setor elétrico. Em seu voto, Barbosa
indicou que essa rapidez poderia ter como razão a compra de apoio no Congresso
durante o governo do ex-presidente Lula. Na nota, Dilma afirma que realmente se
surpreendeu com a rapidez na aprovação do marco regulatório, mas ressaltou que
a pressa se justificava pela importância do tema. E citou o risco de apagão no
setor elétrico durante o governo Fernando Henrique Cardoso
Dilma rebate
relator depois de ser citada durante julgamento
Reação. Presidente divulga nota oficial na qual sugere que ministro tirou do
contexto depoimento que ela havia dado à Justiça em 2009; Barbosa usou
declaração de petista para tentar mostrar que houve compra de parlamentares do
Congresso no governo Lula
Tânia Monteiro, Felipe Recondo
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff divulgou ontem uma nota oficial para
responder ao relator do mensalão no Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa,
que na sessão de anteontem a citou num contexto em que condenava réus do
escândalo.
O relator se valeu de um trecho do depoimento de Dilma Rousseff dado no
processo em 2009 para tentar reforçar a tese da Procuradoria-Geral da República
segundo a qual o pagamento de parlamentares por meio do valerioduto serviu para
comprar o apoio político no Congresso para o governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Naquele depoimento à Justiça, a então ministra-chefe da Casa Civil do
governo Lula afirmou ter ficado "surpresa" com a rapidez da votação
de uma medida provisória que definia um novo marco regulatório do setor
elétrico.
Na conclusão de seu voto anteontem, Barbosa indicou que essa rapidez poderia
ter como razão a compra de apoio no Congresso Nacional durante o governo de
Lula. Barbosa afirmou que, além das reformas previdenciária e tributária, o
mensalão serviu para uma "fidelização" de partidos para outras
votações. E, nesse momento, destacou depoimento da presidente Dilma.
Barbosa disse que o deputado José Janene, acusado de se beneficiar do
mensalão, ocupou a presidência da Comissão de Minas e Energia da Câmara no
período em que o novo modelo do setor elétrico foi votado - Janene morreu em
setembro de 2010.
"Creio ser necessário alguns esclarecimentos que eliminem qualquer
sombra de dúvidas acerca das minhas declarações, dentro dos princípios do
absoluto respeito que marcam as relações entre os Poderes Executivo e
Judiciário", afirmou Dilma na nota, de 25 linhas. A presidente diz que
realmente se surpreendeu com a rapidez na aprovação do marco regulatório, mas
ressaltou que a pressa se justificava pela importância do tema. Chegou a dizer,
na época, que "ou se reformava ou o setor quebrava".
Assim, sua resposta ao ministro do Supremo foi direta: "Na sessão do
STF, o sr. ministro Joaquim Barbosa destacou a "surpresa" que
manifestei no meu depoimento judicial com a agilidade do processo legislativo
sobre as MPs. Surpresa, conforme afirmei no depoimento de 2009 e repito hoje,
por termos conseguido uma rápida aprovação por parte de todas as forças
políticas que compreenderam a gravidade do tema", afirmou. "Como
disse no meu depoimento, em função do funcionamento equivocado do setor até
então, "ou se reformava ou o setor quebrava". E quando se está em
situações limites como esta, as coisas ficam muito urgentes e claras",
acrescentou Dilma na nota.
Bastidores. Para definir como responderia à menção de seu nome no STF, Dilma
se reuniu até tarde, na noite de quinta-feira, com o ministro da Justiça, José
Eduardo Martins Cardozo, e com o advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams. A
ideia era deixar clara sua insatisfação e esclarecer que a citação de seu nome
era descabida - mas sem criar nenhum tipo de ruído entre o Executivo e o
Judiciário.
Foi a segunda vez, em menos de duas semanas, que Dilma se valeu do recurso
de emitir notas públicas para contestar comentários que considerou inadequados.
O primeiro foi em reação ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que, em
artigo publicado no Estado, sob o título "Herança Pesada", criticou o
governo do ex-presidente Lula, referindo-se aos problemas que ele teria deixado
para Dilma. A presidente defendeu o antecessor e mencionou o apagão de energia
durante o governo FHC.
A interlocutores Dilma não escondeu seu aborrecimento por ver seu nome
envolvido, mesmo que de modo periférico, num julgamento de alto teor político e
que tem desgastado o PT e alguns de seus principais integrantes. Desde o início
do julgamento, em agosto, a presidente tem procurado manter o Planalto afastado
do processo.
Apagão. Dilma aproveitou a nota divulgada ontem para fazer críticas à
política de energia desenvolvida pelo governo FHC, ao citar que o apagão
poderia ocorrer "em função do funcionamento equivocado do setor até
então".
Ao detalhar a questão, ela mencionou que, entre junho de 2001 e fevereiro de
2002, o Brasil atravessou uma "histórica crise na geração e transmissão de
energia elétrica, conhecida como "apagão"" - e que em 2003, o
presidente Lula enviou ao Congresso as MPs criando um marco regulatório para o
setor".
Procurado, o ministro Joaquim Barbosa afirmou que não comentaria a nota
oficial de Dilma Rousseff. O presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto,
disse que também não se pronunciaria a respeito do assunto.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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