quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Para juiz, encontro de empreiteiras com ministro é intolerável

• Sergio Moro afirma que advogados de empresas sob suspeita buscam interferência política em investigações

• Cardozo diz que é seu dever receber advogados e nega ter recebido pedidos de favorecimento

Aguirre Talento, Gabriel Mascarenhas, Lucas Ferraz e Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO - O juiz federal Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato, criticou duramente os advogados de empreiteiras que procuraram o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) para discutir o andamento das investigações sobre o esquema de corrupção descoberto na Petrobras.

Num despacho publicado nesta quarta-feira (18), Moro classificou como "intolerável" a iniciativa e reproduziu frase do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, dizendo que advogados devem recorrer ao juiz, "nunca a políticos", caso queiram denunciar eventuais excessos da polícia.

Em seu despacho, o juiz decidiu manter presos preventivamente quatro executivos presos em Curitiba, Ricardo Pessoa, da UTC, Eduardo Hermelino Leite, Dalton Avancini e João Auler, da Camargo Corrêa, sob a alegação de que as empreiteiras estão tentando interferir nas investigações.

De acordo com Moro, ao procurar o ministro da Justiça, os advogados estariam tentando "obter interferência política" no processo judicial.

Cardozo teve encontros com advogados da UTC, da Camargo Corrêa e da Odebrecht nos últimos meses. A Polícia Federal, responsável pelas investigações da Operação Lava Jato, é subordinada formalmente ao ministro.

Moro disse que as prisões dos executivos devem ser discutidas "nos autos" e afirmou que nunca se recusou a receber ele mesmo os advogados das empresas sob suspeita.

"Intolerável, porém, que emissários dos dirigentes presos e das empreiteiras pretendam discutir o processo judicial e as decisões judiciais com autoridades políticas", escreveu. "Mais estranho ainda é que participem desse encontros, a fiar-se nas notícias, políticos e advogados sem procuração nos autos das ações."

O juiz ressaltou ainda que Cardozo não é responsável pelas investigações. "Apesar da Polícia Federal, órgão responsável pela investigação, estar vinculada ao ministério, o ministro da Justiça não é o responsável pelas ações de investigações", escreveu.

Moro classificou o episódio como uma "indevida, embora mal sucedida, tentativa dos acusados e das empreiteiras de obter uma interferência política" no processo.

O juiz, porém, evitou atacar diretamente Cardozo. Disse que não há prova de que o ministro tenha atendido às solicitações das empreiteiras. "Sequer é crível que se dispusesse a interferir indevidamente no processo judicial", escreveu o juiz da Lava Jato.

Imoralidade
Em nota, Cardozo reiterou que é seu dever receber os advogados e disse que nunca recebeu deles pedido para criar obstáculos nas investigações ou favorecer as empresas.

"Caso tivesse recebido qualquer solicitação a respeito, em face da sua imoralidade e manifesta ilegalidade, teria tomado de pronto as medidas apropriadas para punição de tais condutas indevidas", afirmou o ministro.

Um grupo com pouco mais de 60 pessoas protestou contra Cardozo na noite desta quarta, realizando um panelaço em frente ao prédio em que ele vive em São Paulo.

Integrantes do movimento Vem pra Rua, criado nas eleições passadas, levaram panelas, faixas e velas para pedir à presidente Dilma Rousseff a imediata demissão de Cardozo. O ministro não estava em São Paulo e o apartamento estava vazio.

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