Comissão é enterrada sem votar relatório após meses de debate
• Relator é destituído por pressão de Cunha, e análise vai a plenário
Júnia Gama e Patricia Cagni – O Globo
BRASÍLIA - A comissão especial que discute a reforma política foi enterrada ontem sem a votação do relatório final produzido após 4 meses de discussões. Com a pressão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e de seus aliados, a reunião marcada para o início da tarde de ontem foi adiada, e, mais tarde, os parlamentares foram avisados de que fora cancelada. O relator Marcelo Castro (PMDB-PI) foi destituído, e o presidente da comissão, Rodrigo Maia (DEM-RJ), indicado por Cunha para relatar a reforma direto no plenário.
Cunha e Maia têm posição comum a favor do distritão, segundo o qual os candidatos mais votados são eleitos sem que se levem em conta os votos nos partidos. E ressurgiu outra possibilidade que havia sido sepultada há anos, o chamado distritão misto, no qual metade das vagas é escolhida pelo distritão, e a outra, por voto em lista partidária fechada. A apresentação do relatório está prevista para as 11h de hoje.
À noite, Cunha comandou reunião de líderes para definir a votação da reforma no plenário da Casa a partir de hoje, ignorando o relatório da comissão. Definiu-se que a votação será em grupos, nesta ordem: sistema eleitoral, financiamento de campanha, manutenção ou não da reeleição, tempo dos mandatos, coincidência das eleições, cota para mulheres, fim das coligações proporcionais, cláusula de barreira, voto obrigatório e dia da posse do presidente da República.
A decisão de cancelar a reunião da comissão mista gerou protestos. A justificativa oficial para o cancelamento foi "acordo entre os líderes". Mas ela foi contestada pelo PT e pelo PSOL.
- Não fui consultado. Não concordo com o cancelamento da reunião, tudo que eu sonhava era ter o relatório. Não foi com minha anuência, eu não participei dessa decisão - disse o líder do PT, Sibá Machado (AC).
- Explicam que a extinção da comissão foi decisão dos líderes. O do PSOL seguramente não foi consultado e não compactuaria com este golpe - disse o líder do PSOL, Chico Alencar (RJ).
Alguns deputados foram protestar na sala onde o encontro deveria ocorrer. Marcelo Castro atacou a decisão e disse que o cancelamento foi infundado:
- Não fizemos relatório para agradar ou desagradar a ninguém. Todo o acúmulo de conhecimento de 3 meses de trabalho será substituído por um documento construído em cinco minutos no plenário.
Cunha chegou a desautorizar Castro e defender sua saída da relatoria, quando o piauiense alegou que votaria contra seu próprio relatório, feito sob pressão da cúpula do PMDB. Outro ponto de discordância entre Cunha e o relatório da comissão é sobre financiamento. Cunha defende financiamento privado com doações das empresas a partidos e candidatos. No relatório, Castro define que as empresas só poderão doar a partidos.
Deputados que integraram a comissão reclamaram. Henrique Fontana (PT-RS) acusou Cunha de agir de forma "ditatorial".
Cunha disse que o relatório da comissão estava em "dissonância" com o que a maioria desejava Não descartou, porém, que a Casa acabe sem aprovar qualquer mudança, já que é preciso ao menos 308 votos para isso:
- A reforma pode sair ou pode não sair. Se não for aprovado nada, significa que a maioria dos deputados está satisfeita como está. Vai acabar com a hipocrisia de pregar reforma política.
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