• Empresário adianta informações que dará em acordo de delação, entre elas caixa 2
Cleide Carvalho, Renato Onofre, Thiago Herdy - O Globo
-SÃO PAULO E CURITIBA- Em depoimento que durou dez horas, em Curitiba, o empresário Marcelo Odebrecht disse ontem a quatro procuradores da República ter a intenção de explicar, em detalhes, como fez pagamentos ilícitos a políticos de diversos partidos nos últimos anos. É a primeira vez que o herdeiro da maior construtora do país se reúne pessoalmente com integrantes da força-tarefa da Lava Jato para tentar viabilizar um acordo de delação, que está em negociação desde maio.
O ponto central do depoimento foi sobre a motivação da Odebrecht para fazer as transferências: caixa dois de campanha ou propina ligada a obras públicas. O depoimento marca a reta final da tentativa da Odebrecht de firmar sua colaboração. Os investigadores já afirmaram que a proposta apresentada é “satisfatória”, mas ainda depende de documentação e detalhamento dos fatos. Nos últimos meses, dezenas de executivos vêm pressionando a empresa a colaborar com as investigações.
51 delações
Há a expectativa de que 51 executivos e gerentes da empreiteira, incluindo o empresário, façam parte da proposta final de acordo de delação a ser apresentada ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Pelo menos 90 temas foram apresentados à Procuradoria-Geral da República, e Marcelo Odebrecht deverá detalhar o conteúdo de cada um deles.
De uma forma mais ampla, a Odebrecht promete apresentar provas que envolvem, além de integrantes do governo federal, 35 senadores, 13 governadores e dezenas de prefeitos. O objetivo é destrinchar os pagamentos feitos pelo Setor de Operações Estruturadas, que ficou conhecido como “diretoria da propina”. O setor foi criado pela empresa para repassar valores a políticos.
— O acordo de colaboração ainda não está fechado. Ainda temos um longo caminho à frente — disse ontem um dos procuradores envolvidos na negociação com a empreiteira. Um advogado também afirmou que ainda “há muito a ser discutido”.
Um dos pontos de embate é a discussão sobre a origem dos repasses a políticos. A Odebrecht defende a tese de que a maior parte dos pagamentos foi realizada como caixa dois de campanha, sem vinculação direta com obras ou contratos com governo. Os procuradores questionam a tese e cobram da empresa informações sobre a origem da propina, para verificar a relação com verbas desviadas dos cofres públicos.
Emílio dá a palavra final
Apesar dos investigadores buscarem confirmar versões com Marcelo Odebrecht, a negociação já não passa mais diretamente por suas mãos. Depois de controlar a defesa da empresa durante o ano em que ficou na prisão (ele foi preso em junho de 2015), Marcelo deixou de dar a última palavra no acordo, agora conduzido pelo pai dele, Emílio Odebrecht.
Emílio convocou um grupo de cinco ex-executivos, que trabalharam diretamente com ele nos anos 1980 e 1990, para discutir o caminho a ser seguido. Foi assim que a ideia da delação ganhou corpo, no início do ano, e foi aceita por Emílio em março. Todos do grupo trabalharam diretamente com o empresário, mas já estavam afastados da empresa. Pelo menos uma vez por semana, se reúnem para discutir as estratégias da empresa.
Além do depoimento de Marcelo, a PGR ouve em Brasília e em Curitiba executivos que não chegaram a ser presos pela Polícia Federal. A partir dos depoimentos os procuradores saberão o que eles pretendem relatar no acordo, para decidir pela validade ou não da proposta de colaboração.
O teor dos depoimentos deverá também balizar a negociação sobre o tempo em que Marcelo Odebrecht deve permanecer preso. Por enquanto, a expectativa é que ele cumpra, no mínimo, um ano em regime fechado depois da assinatura do acordo.
A Odebrecht não quis se pronunciar sobre o assunto. O advogado Theo Dias, que coordena a negociação do acordo, afirmou que não pode “nem confirmar nem negar” o teor do depoimento realizado ontem. (Colaborou Katna Baran, especial para O GLOBO).
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