O Estado de S. Paulo.
Ou o presidente aceita seus limites de ação e sofre o desgaste inevitável ou aprova subsídios para a gasolina, o que pode lhe custar a reeleição
Bolsonaro vive o segundo grande dilema de
seu mandato. O primeiro foi a pandemia. Saiu-se mal. Sabia, desde o início, que
o vírus enfraqueceria a economia e tinha medo de sofrer um desgaste que
ameaçasse sua reeleição. Bolsonaro optou por negar a pandemia, recusar o
isolamento social e combater a vacina, a única saída racional.
Passado esse período, o enorme desgaste já
eliminou o favoritismo nas pesquisas.
O momento, agora, é da guerra na Ucrânia e
suas consequências no País. Antes do conflito, o preço do barril de petróleo
rondava os US$ 90. Com a eclosão da guerra, o preço do barril disparou.
Os analistas costumam afirmar que aumentos no preço do combustível atingem os governos. Nem é preciso de sua expertise para confirmar essa realidade. Não só Bolsonaro, como seus adversários, sabem que o aumento se expande por toda a economia e faz crescer a insatisfação popular.
De um modo geral, aumento no combustível
repercute em outro tipo de aumento também explosivo: o dos preços dos
alimentos. Quase todas as análises da Primavera Árabe, por exemplo, convergem
para apontar o preço dos alimentos como o estopim da revolta.
Rússia e Ucrânia são grandes produtoras de
trigo e milho. É um fator que se alia à repercussão do aumento dos
combustíveis, que também pode pesar, assim como a possível escassez de
fertilizantes.
Bolsonaro compreendeu o impasse e condena o
aumento de preços decretado pela Petrobras. Mas a empresa levou 57 dias para
equiparar a gasolina ao preço internacional, como determina a sua política
aprovada em 2016. Mesmo assim, a equiparação não foi completa, a defasagem
beirava os 40%.
Os rivais de Bolsonaro na disputa eleitoral
também condenam o aumento e prometem mudar a política de preços. Mas suas
alternativas só vigoram a partir de janeiro de 2023, caso vençam as eleições. O
problema está nas mãos de Bolsonaro.
Além de reclamar dos preços, Bolsonaro
zerou o PIS-Cofins do diesel e apoiou a iniciativa parlamentar para reduzir o
ICMS. Foi um passo. Mas tudo indica que não é suficiente.
Seu dilema, agora, é este: aceitar esses
limites de ação e sofrer o desgaste inevitável ou aprovar subsídios para a
gasolina, o que poderia realmente ter um efeito.
Alguns países europeus pensam em subsídio
para a gasolina. Mas a guerra é no seu continente e eles dispõem de uma
situação mais confortável.
Bolsonaro sente que o desgaste pode crescer
daqui para as eleições. Mas, ao mesmo tempo, é advertido pela equipe econômica
de que aprovar subsídios pode lhe custar a chance de reeleição.
É um grande dilema. Existem algumas medidas
complementares, como ajuda aos caminhoneiros e ampliação dos que recebem
auxílio para o gás de cozinha. Mas será que isso bastaria?
Um outro caminho aberto para Bolsonaro será
o de mudar a correlação de forças no Conselho da Petrobras e derrubar a norma
que define a equiparação com os preços internacionais.
Também isso não será fácil. Como ficariam
as importadoras comprando mais caro para vender mais barato dentro do Brasil?
Como ficariam os sócios minoritários, que costumam entrar na Justiça quando se
sentem prejudicados?
Interessante é que, apesar desta situação
complicada, Bolsonaro segue na sua política de isolamento. Está lutando para
aprovar um projeto de mineração em terras indígenas rejeitado por amplos
setores da sociedade, por empresas e até mesmo pelas grandes mineradoras, sem
falar na repulsa internacional.
O único momento em que Bolsonaro parece ter
recuado taticamente foi em sua campanha contra as vacinas. Mas recuou quando o
tema já não estava mais na agenda com a intensidade que esteve no passado.
Com tantos descaminhos e erros, as
pesquisas, no entanto, indicam que Bolsonaro resiste. Apresentou um certo
crescimento e parece não ser o adversário tão fácil a ser batido.
O que pesa contra sua chance é o grande
índice de rejeição. A experiência de Marcelo Crivella,
no Rio de Janeiro, foi interessante nesse
sentido. Muito desgastado, ele conseguiu chegar ao segundo turno. Mas chegou lá
com um índice de rejeição tão alto que foi vencido com facilidade.
Se o quadro não mudar dramaticamente, o
problema não será derrotar Bolsonaro na eleição, mas sim governar depois dele,
com um país arrasado pela sua gestão. Bolsonaro declarou que a missão principal
era destruir muita coisa. Políticas sociais, culturais, ambientais, sanitárias
e de educação foram para o ralo.
Outro fator que complica a vida
pós-Bolsonaro é governar um país arrasado sem garantia de que o novo Congresso
esteja comprometido com essa tarefa.
Nada contesta, até o momento, a previsão de
Ulisses Guimarães de que a nova legislatura sempre é pior que a anterior. Não é
um dogma. Apenas uma advertência que, levada em conta, pode tornar as coisas
menos difíceis no áspero caminho da reconstrução.
Daí a necessidade de, ao contrário de outros momentos, não focar nossa atenção apenas na disputa presidencial, mas também na renovação do Congresso. Muita coisa vai depender do êxito nessa tarefa.
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