quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Tráfico usou serviços públicos para sair com armas do Alemão

DEU EM O GLOBO

Os serviços públicos, como coleta de lixo e obras de saneamento, foram usados por traficantes que conseguiram fugir por galerias pluviais do Complexo do Alemão e também por bandidos que ainda se escondem na favela, de onde tentam retirar armas, munição e drogas. Policiais e militares acharam no lixo, ontem, um fuzil, carregadores e munições para fuzis 762 e 556, a1ém de duas granadas, um sinalizador e um caderno da contabilidade do tráfico. A polícia também descobriu o trecho da galeria pluvial que traficantes usaram, segundo testemunhas, para fugir do Complexo do Alemão. Por essa tubulação, teriam escapado ainda na noite de sábado os chefes do tráfico Fabiano Atanázio da Silva, o FB, e Paulo Roberto de Souza Paz, o Mica. Eles teriam deixado o esconderijo com mais 50 bandidos, todos armados de fuzis, em direção ao Morro do Adeus, que fica bem em frente. De lá, teriam partido para outras comunidades. Como o GLOBO mostrou anteontem, bandidos destruíram a tampa que cobria a rede pluvial na Rua Joaquim de Queiroz, escapando por baixo da Estrada do Itararé, onde forças de segurança se preparavam para o que se temia ser um banho de sangue. E assim, tal como a Batalha do Itararé paulista, na Revolução de 30, a do Alemão também não houve.

Os subterrâneos do crime

Polícia encontra trecho de galeria pluvial que traficantes teriam usado para fugir do Alemão

Ana Cláudia Costa


Policiais encontraram ontem o trecho da galeria de águas pluviais que traficantes podem ter usado para fugir do Complexo do Alemão. Por essa tubulação, segundo informações de moradores, escaparam, ainda na noite de sábado, os traficantes Fabiano Atanázio da Silva, o FB, e Paulo Roberto de Souza Paz, o Mica. Eles teriam deixado o morro com mais 50 bandidos, todos armados de fuzis, em direção ao Morro do Adeus, que fica bem frente. De lá, teriam partido para outras comunidades. Como O GLOBO mostrou, na última segunda-feira, bandidos destruíram a tampa que cobria a rede pluvial em outro ponto na Rua Joaquim de Queiroz, por onde também poderiam ter escapado.

Só na manhã de ontem, policiais encontraram a provável rota de fuga dos criminosos. A galeria da Joaquim de Queiroz tem ligação com a Rua Arará, no Morro do Adeus. Esse percurso passa por baixo da Estrada do Itararé, onde, na noite de sábado, havia blindados e centenas de policiais e militares do Exército. Em alguns trechos, a galeria tem dois metros de altura por dois de largura. O Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) recebeu, de moradores, informações de que, por essa rede, os bandidos chegariam até o bairro do Engenho da Rainha, a dois quilômetros de distância.

A saída em massa de bandidos na noite de sábado aconteceu, segundo testemunhas, no momento em que começou um grande confronto, com tiros vindos do alto do morro, por volta das 22h30m. Esse tiroteio ocorreu, de acordo com denúncias, para desviar a atenção da polícia e dos homens do Exército.

Polícia investiga outra rota pela mata

A provável rota de fuga começa num buraco que dá acesso à rede pluvial na Joaquim de Queiroz, na Favela da Grota. De lá, os bandidos teriam chegado à parte de trás de uma creche na Estrada do Itararé. Nesse local, a quadrilha teria arrebentado uma grade e entrado em outro buraco para chegar à rede, seguindo até a Rua Arará.

Nessa rua, os criminosos que faziam a segurança dos chefes do tráfico teriam saído por um primeiro buraco, para dar proteção aos cúmplices que usariam outra passagem, aberta mais à frente na rede pluvial. Nessa fuga, eles teriam percorrido quase um quilômetro. A polícia agora investiga se funcionários do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram obrigados a construir galerias pluviais mais largas por ordem do tráfico.

Uma outra rota de fuga, segundo a polícia, seria pela mata, no alto do Morro da Fazendinha. Desse local, os traficantes, ainda pela área verde, teriam chegado ao Morro do Juramentinho, em Inhaúma, tendo acesso à Avenida Pastor Martin Luther King Jr. Várias ligações e denúncias de moradores à polícia dão conta de que traficantes chegaram a essas favelas ainda na noite de sábado.

Ontem, o secretário municipal de Habitação, Jorge Bittar, disse que as galerias que teriam sido usadas pelos traficantes foram projetadas para atender à necessidade de escoamento das águas das chuvas no Complexo do Alemão. Ele acrescentou que engenheiros da prefeitura fiscalizam permanentemente as obras e afastou a possibilidade de que acréscimos ou modificações tenham sido feitos por ordem de bandidos:

- As galerias têm dimensões diferenciadas conforme as necessidades de cada trecho. E existem também pontos de visitação, que permitem o acesso às galerias. Eles são necessários para permitir que as redes sejam limpas, para não serem obstruídas por lixo.

Em Niterói, um foragido do Complexo do Alemão foi preso ontem. Daniel Luiz Soares, o Daniel Papai, de 29 anos, suspeito de ser o chefe do tráfico na Favela de Manguinhos, teria fugido do Morro da Fazendinha um dia antes de começar a ocupação. A Polícia Civil informou que o criminoso estava escondido no bairro Maria Paula. Baleado numa troca de tiros com policiais ao tentar fugir, ele foi levado para o Hospital Azevedo Lima e não corre risco de vida.

Para tentar impedir que os fugitivos do Alemão e da Vila Cruzeiro cheguem ao Nordeste, as polícias de estados da região começaram a se mobilizar. As principais rodovias federais que cortam Pernambuco ganharam ontem bloqueios da Polícia Militar, principalmente em pontos de municípios que fazem limite com estados vizinhos, como Bahia e Alagoas. No fim da década passada, vários traficantes do Rio foram presos em Pernambuco. Em 1998, foi capturado em Recife o traficante José Roberto da Silva Filho, o Robertinho de Lucas, que era muito ligado a Marcinho VP.

A Polícia Rodoviária Federal também realiza, desde segunda-feira, blitzes nas divisas da Bahia com os estados de Minas Gerais e Espírito Santo. O objetivo é dificultar uma possível debandada de traficantes do Rio para a Bahia. De acordo com o chefe da Seção de Policiamento e Fiscalização da PRF, inspetor Virgílio Tourinho, 98 policiais estão envolvidos na ação. Entretanto, é possível que, a partir de hoje, as vistorias sejam reforçadas com policiais militares.

Colaboraram: Luiz Ernesto Magalhães, Larissa Oliveira (da Agência A Tarde) e Letícia Lins (de Recife)

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