terça-feira, 28 de agosto de 2012

Perfis revelados - Tereza Cruvinel

"O magnetismo exercido pela Suprema Corte nessa hora obscurece a eleição municipal, mas é certo que, depois dela, estará montado um novo tabuleiro político"

Graças a uma homenagem de quatro ministros do STF à concisão, proferindo resumos orais de seus votos escritos, o julgamento em curso avançou bastante ontem, produzindo a primeira condenação aritmética, embora ainda não formal. A sessão teve ainda o dom de revelar o perfil, o estilo e o viés doutrinário de quatro ministros relativamente novos na Corte, que se expõem pela primeira vez em um julgamento tão público: Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Rosa Weber, indicada pela presidente Dilma Rousseff, confirmou a fama de ser teoricamente aplicada. Foi um pouco confusa na argumentação oral, mas firme nas convicções. Ela é uma falconesa. Fux foi o mais prolixo, citando autores e doutrinas em profusão. Sua ênfase na materialidade do crime foi vista por advogados como a preparação de um voto contra José Dirceu. A materialidade, no caso, seria o fato de Marcos Valério ter ajudado a ex-mulher de Dirceu na realização da compra de um apartamento, a partir da venda de outro, vínculo que alguns acham frágil. Fux também deve ser contado entre os duros. Toffoli, de quem o procurador-geral cogitou arguir o impedimento, por ter integrado o governo Lula, absolveu o deputado João Paulo e corréus no caso do contrato da agência de Valério com a Câmara, e condenou Pizzolato e os mesmos corréus no caso do contrato com o Banco do Brasil. Não foi indulgente como se propalou que seria, fundamentou seu voto, alinhado com o do revisor, Lewandowski. Esse deve ser o seu padrão. Por fim, a ministra Cármen Lúcia revelou-se muito severa, condenando a todos. Outra do time dos falcões. A tarde produtiva resultou na condenação aritmética de Henrique Pizzolato, Marcos Valério e seus ex-sócios por corrupção ativa e passiva e peculato. João Paulo, para ser inocentado, precisa de mais quatro votos.

O debate entre os ministros aclara algumas questões e expõe falhas da acusação. O chamado "segundo peculato" atribuído a João Paulo diz respeito ao contrato com a empresa individual do jornalista Luís Costa Pinto, que, segundo o Ministério Público, não prestou à Câmara os serviços contratados indiretamente pela agência SMP&B . Funcionários, deputados, jornalistas e frequentadores da Câmara nos idos de 2003 e 2004 testemunharam sua atuação junto à presidência e à Mesa da Casa. Diversos testemunhos nesse sentido já convenceram três ministros, inclusive a dura Rosa Weber. Mas foram ignorados pela acusação.

Depois das eleições (I)

O magnetismo exercido pela Suprema Corte nessa hora obscurece a eleição municipal, mas é certo que, depois dela, estará montado um novo tabuleiro político. Ele trará consequências de médio prazo, relacionadas com a eleição de 2014, para presidente e para governador, e consequências imediatas para os partidos e para o governo federal.

Entre essas últimas, inclua-se o provável ingresso do PSD de Gilberto Kassab na coalizão que apoia o governo Dilma no Congresso. E não havendo almoço grátis na política, o partido deverá ocupar um ministério. A senadora Kátia Abreu (PSD-TO), por sua liderança no agronegócio e uma certa, digamos, empatia estabelecida entre ela e a presidente da República, seria candidata natural. Mas essa hipótese depende de duas respostas. 1) Kátia teria o apoio de Kassab ou ele optaria por um nome do bolso de seu próprio colete? Ela o fustigou muito por ter determinado o apoio do PSD ao candidato do PT a prefeito de Belo Horizonte, Patrus Ananias. 2) Como foi Dilma que buscou, junto a Kassab, o apoio de seu partido a Patrus, resta saber também se, por ter se oposto, Kátia não se queimou com a presidente.

Depois das eleições (II)

O candidato do PT à prefeitura de Belo Horizonte, Patrus Ananias, voltou a dizer ontem, em sabatina promovida pela Folha de S.Paulo, que seu concorrente do PSB, o prefeito Marcio Lacerda, "optou pelo PSDB". Patrus vem batendo nessa tecla e, ao fazê-lo, sugere que não só o PSB mineiro optou pela ruptura com o PT, mas todo o partido. Cita os casos de Recife, Fortaleza e "outras cidades médias". Esse bordão, segundo fontes petistas, estaria prenunciando consequência eleitoral de médio prazo, relacionada com 2014, qual seja, a ruptura formal entre o PT e o PSB. O recado seria muito mais para o governador pernambucano Eduardo Campos do que para o prefeito da capital mineira.

Quando Dilma montou a reação do PT ao rompimento da coligação proporcional em Belo Horizonte, articulando a candidatura de Patrus, e quando Lula coordenou a montagem da chapa petista em Recife, a primeira providência foi unificar o partido nos dois estados. O que muitos consideravam difícil ou impossível aconteceu. O ministro Fernando Pimentel passou a trabalhar, de fato, pela candidatura de Patrus, e o ex-prefeito João Paulo passou a trabalhar pela candidatura do senador Humberto Costa em Recife. Como isso foi conseguido? Com um acordo interno ainda não revelado, mas em marcha: nos dois estados, os que estão disputando a prefeitura agora, elegendo-se ou não, comprometeram-se a não concorrer ao governo do estado em 2014, apoiando o candidato do outro grupo. Ou seja, Pimentel será candidato em Minas, com apoio de Patrus, e João Paulo em Pernambuco, com o apoio de Humberto. Com os candidatos próprios já previamente definidos, a aliança com o PSB está praticamente rifada.

Antepassados

Citei no domingo o falecido ministro do STF Orozimbo, cultor da liturgia e da elegância verbal que talvez se horrorizasse com algumas ocorrências no STF. Mas Nelson Hungria é, disparado, o jurista mais citado pelos atuais ministros ao proferir seus votos. Hungria (1891-1969) foi ministro da Corte, aonde já chegou consagrado como grande penalista.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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