O Globo
O presidente do STF, Luiz Fux, disse que o
“chefe da Nação” tenta tirar a credibilidade do STF e de seus membros e usou a
expressão “crime de responsabilidade” para definir a ameaça do presidente de
não cumprir uma ordem judicial. Isso é muito em um país em que as autoridades
preferem eufemismos ou orações sem sujeito. É como se todos os poderes
estivessem em guerra, igualmente culpados. Não é isso. Há um sujeito, o
presidente da República, atacando diariamente as bases da democracia
brasileira. Ele sim, Jair Bolsonaro, usou o 7 de setembro para escalar as
ameaças, o tom do golpismo. Meias palavras, subentendidos, orações com sujeito
indeterminado não servem para defender as instituições.
A economia traz aflições diárias aos
brasileiros, como lembrou Fux em seu discurso. “A inflação que corrói a renda
dos pobres”, apontou. Hoje será divulgada a inflação de agosto. O número deve
ficar em 0,73% na previsão do professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio. O
economista Roberto Padovani, do Banco BV, calcula 0,71%. Os produtos que
subiram mais foram carnes, aves, leite, pão e café. Em setembro, a alta será
maior por causa da conta de luz. O índice de setembro pode ficar em 0,9%. A
inflação pode chegar, com o dado de hoje, a 9,5% e com o índice de setembro
pode tocar os 10%. Um patamar inacreditável.
É desse problema real e concreto que Bolsonaro foge com a sua retórica radical e seu plano golpista. Ele não tem resposta para a inflação que corrói também sua popularidade, não se importa com o alto nível do desemprego. Da mesma forma que jamais se importou com os nossos mortos, mais de 580 mil.
O caso de Bolsonaro não é apenas de mau
governo. É um perigo para o país deixá-lo no cargo. Lá ele está usando recursos
públicos, o aparato presidencial, a máquina do Estado contra a democracia. Para
uma pessoa que sempre sonhou com a ditadura, ele está no lugar certo. Por isso,
a única defesa possível é o impeachment, que já defendi neste espaço várias
vezes.
Impeachment porque ele é um inimigo da
democracia, impeachment porque ele cometeu inúmeros crimes de responsabilidade,
impeachment porque, como disse o ex-ministro Celso de Mello, Bolsonaro é um político
que não está à altura do cargo que exerce, não tem estatura presidencial e
senso de estadista.
Fux, ao falar de crime de responsabilidade,
acrescentou “a ser analisado pelo Congresso Nacional”. O presidente da Câmara,
Arthur Lira, contudo, não deixou esperança em seu discurso de que analisará
qualquer dos muitos pedidos de impeachment que jazem em sua gaveta.
A alguns interlocutores ele disse que
ficara chocado com dois pontos, a ameaça de Bolsonaro de não cumprir ordem
judicial e a insistência sobre o voto impresso. Esse último ponto esteve em seu
discurso. “Não posso admitir questionamentos sobre decisões tomadas e
superadas, como a do voto impresso”. E acrescentou: “vire-se a página”.
No mercado financeiro, a reação a esse
aumento da incerteza política brasileira arrastou-se durante todo o dia. O
Ibovespa amanheceu caindo e assim ficou, aprofundando a queda quando as
notícias eram as de que caminhoneiros estavam bloqueando as estradas em
movimento a favor do governo. Caminhoneiros contra o governo de Allende, no
Chile, tiveram sucesso, mas um “protesto a favor” já é bem mais duvidoso. O
desabastecimento, se ocorrer, sempre será responsabilidade do governo.
No começo do pregão perguntei a um
economista de banco como seria o dia. “Tenso”, ele disse. Essa tensão recairia,
previu, sobre os preços, dólar, bolsa, juros longos. Outro explicou que o
problema agora é o Orçamento. Todas as soluções para o problema passariam ou
por um entendimento com o Judiciário ou por coesão no Congresso. E não se tem
isso após os ataques do presidente ao STF. “Logo temos um impasse. E impasses
não agradam ao mercado”.
Bolsonaro atirou em seu próprio pé. As
perdas em valor de mercado na bolsa chegaram a R$ 195 bilhões em um único dia,
segundo a Economática. Somente a Petrobras perdeu quase R$ 20 bi. A
instabilidade sempre bate nos preços e todos os economistas com os quais falei
disseram que já há contaminação de 2022, com redução do crescimento e alta da
previsão de inflação. Os problemas econômicos pioram por causa do presidente
Bolsonaro, mas ele continua com o seu projeto: um golpe contra a democracia.
Ele é o sujeito dessa ação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário