Folha de S. Paulo
Na segunda-feira (23), parecia que ruína
final das contas do governo estava próxima
Na segunda-feira (23), o pessoal do Ministério da
Fazenda deu umas explicações a respeito das medidas bimestrais
mais recentes que vai adotar a fim de cumprir suas metas de despesa. Na praça
do mercado, ficou a impressão de que o governo iria relaxar, não importa, aqui
e agora, se impressão razoável ou não.
Houve faniquito. As taxas de juros e o preço do dólar, já em níveis pavorosos, deram um salto no céu já contaminado de fumaça mortífera. Por falar nisso, essa situação lembra um pouco a agitação crítica que seguiu ao incêndio do país: tratamos de miudezas e assuntos de curtíssimo prazo e não tentamos entender o motivo de estarmos queimando nas caldeiras do inferno, nas contas públicas ou no ambiente.
O tumulto foi por causa "do
fiscal", diziam porta-vozes e operadores de "o mercado". "O
fiscal", esse jargão horrível, quer dizer: políticas e ações do governo
quanto a despesas, déficits e dívida.
Hum. Nesta terça-feira (24), o faniquito
passou, juros e dólar
caíram. "O fiscal" continua mais ou menos na mesma desde
pelo menos abril, quando o governo mudou a meta de déficit para 2025. Desde
abril, é verdade, houve mais suspeitas razoáveis de que o governo quer fazer
mais gambiarras contábeis (desconsiderar tal ou qual despesa de modo a
facilitar o cumprimento de metas fiscais).
O governo se irritou com o faniquito e com as
críticas de que fará mais gambiarra e contabilidade criativa. Roberto
Campos Neto, presidente do Banco Central detestado
por governo e esquerda, chegou a dizer que havia exagero no salto recentíssimo
dos juros. O povo do mercado foi comprar o que estava barato (títulos
públicos).
É uma novela chata. O faniquito passou, mas
as taxas de juros no atacadão do mercado de dinheiro estão nos níveis mais
altos desde abril de 2023, nos prazos intermediários, entre 2 e 6 anos. São as
taxas que definem o custo dos empréstimos para o governo deficitário e o piso
das taxas para todo o resto da economia.
Além de alguns problemas na
economia mundial, as taxas estão nesse nível de esfolamento por
causa de "o fiscal". Sim, o governo deve cumprir sua meta de déficit
para este 2024, ao contrário do que imaginava quase todo o mundo de "o
mercado" —sim, há gambiarras, mas elas estavam previstas. O governo vai
tentar fazer o possível para cumprir a tal meta de déficit quase zero pois, de
outro modo, será "punido", por lei, e terá de conter mais despesas a
partir de 2025, em particular em 2026 —ou terá de jogar no lixo o arcabouço
fiscal, o que vai dar besteira grossa.
Mas há suspeita, mais do que razoável, de que
o arcabouço
fiscal não fica de pé se não for reformado. Fica inviável,
econômica ou politicamente, a partir de 2026, por aí. O pessoal do dinheiro
sabe disso e, por conta, quer juros e dólar mais altos, na prática.
O governo pode se irritar com faniquitos.
Tanto faz. O problema de fundo é o que importa. Se não houver plano crível de
que as despesas não vão explodir em 2027 ou por aí, a fervura dos juros
continua.
Cumprir a
meta em 2024 ajuda um tanto, mesmo com gambiarra. Do mesmo
modo, é preciso chamar os bombeiros e a polícia a fim de conter queimadas.
Mas, como diz a metáfora para situações menos literais, "estamos apenas
apagando incêndio", sem tratar dos motivos fundamentais da destruição
ambiental e do descontrole fiscal. O resto é fofoca.
2 comentários:
Verdade.
O mercado tem faniquitos diários pra pressionar o governo Lula.
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